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Linguagista

De vela e à vela

Porque este é diferente

 

 

      Lá fora, 40 º Celsius, e aqui em casa acabei de ler a «Ode Marítima», de Fernando Pessoa, disfarçado de Álvaro de Campos. Ando farto de engenheiros, mas como este é só a fingir, cá vai: «Ah, os paquetes, os navios-carvoeiros, os navios de vela!/Vão rareando — ai de mim! — os navios de vela nos mares!» Um dia destes, ainda vão transformar aqueles navios de vela em navios à vela. Para não confundir as cabecinhas.

 

[Texto 3059]

Quando calha, latim

Metades

 

 

      «Se esta tragédia fosse ficção — e parece que é — eu escrevia-lhe um final trágico como é norma das tragédias. Um suicídio, político ou literal (tanto faz), mas heróico e cheio de dignidade. Como o de Brutus, quando se retirou para a montanha depois de ser derrotado pelas legiões de Octávio e Marco António. Ou como o de Cato, que preferiu morrer a ser perdoado por César» («Um fim trágico como nas tragédias», Pedro Bidarra, «Dinheiro Vivo»/Diário de Notícias, 6.07.2013, p. 17).

      Dois nomes em latim, dois em português. Nada mal, equidade absoluta. Só um génio como Camilo é que podia escrever inteiramente em português: «Os vocábulos liberdade, virtude, ciência e progresso das luzes, felicidade do género humano, saem-lhe continuamente da boca, mas um tal Bruto é um abjecto adulador; paixões, vergonhas devoram um tal Catão; tal apóstolo da tolerância é o mais intolerante dos mortais, e tal adorador da humanidade é um sanguinário perseguidor» (Os Mártires, Chateaubriand. Tradução de Camilo Castelo Branco. Lisboa: Parceria A. M. Pereira, 1979, p. 113).

 

[Texto 3058]

Como escrevem os catedráticos

Alguns, pelo menos

 

 

      Escreve Maria José Azevedo Santos, catedrática da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e especialista em Paleografia Medieval e Moderna, bem como História da Escrita, no suplemento «Q», do Diário de Notícias: «Não tenho qualquer pudor em dizer que sou leitora diária e consultora de dicionários. Para além da língua sou uma apaixonada pelo interior da palavra e sou mesmo dependente para a minha escrita de trabalho de investigação. O dicionário, ou melhor, os dicionários são um conjunto de ferramentas para dar uso ao rigor da palavra. Uma pessoa como eu, no magistério há mais de três décadas, tem por obrigação dar boa palavra oral e escrita. Falar melhor e escrever melhor só ‘lendo’ os dicionários tal como este [Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora]. Poderá parecer estranho para algumas pessoas mas eu leio dicionários. Não os consulto, apenas. Aprecio, de sobremaneira, a forma como a palavra se cruza com os seus significados. As milhares de entradas lexicais que os dicionários vão recebendo são um desafio para quem tem a escrita como ferramenta» (Maria José Azevedo Santos, «Q»/Diário de Notícias, 6.07.2013, p. 5).

      Ah, sim há ali muito para despiorar, mas o que mais me surpreendeu, vindo de quem vem, é aquela afirmação inicial: pudor em dizer que se consultam dicionários!

 

[Texto 3057]

Português de cão

Duraram pouco, felizmente

 

 

      «A história do secretário de Estado que decide marcar encontros diários (briefings diz ele em português de cão...) com os jornalistas é significativa. E quando o dito secretário começa a ditar as suas regras (de instrumentalização, entre ons e offs, sempre em português de cão), alguém mandatado pela “classe” deveria levantar-se e dizer-lhe: “Não estamos aqui para lhe servir a sopa, mas sim para informar os cidadãos. E somos nós que decidimos o que é importante ser dito ou não.”» («A postura indispensável», J.-M. Nobre-Correia, Diário de Notícias, 6.07.2013, p. 43).

 

[Texto 3056]