Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Linguagista

Léxico: «harappiano/harappense»

Qual o receio?

 

 

      «Os desenhos de animais nas peças de artesanato produzidas pela antiga civilização de Harappa, cidade localizada na actual China e cujas ruínas mais antigas datam de 3300 a.c., são marcas, assim como os grupos que se organizavam por actividades comerciais no longínquo Período Shang, a dinastia chinesa que governou entre 1766 e 1122 a.c.. […] “As cidades Harappeanas acolhiam artesãos que trabalhavam pedra e bronze. As peças que concebiam eram ilustradas com figuras de animais, usadas como marca que representava a produção da zona”, concluem os investigadores da McGill University. “As marcas não são um elemento de hoje. Foram desenvolvidas e desenvolveram a sociedade”, acrescentam» («As marcas nasceram antes de Jesus Cristo», Raquel Almeida Correia, Público, 10.10.2008, p. 14).

      Tinha de pôr um sic depois dos erros, mas desta vez que os ponha o leitor, porque me quero concentrar no que está assinalado. Os dicionários estão calados que nem ratos sobre a questão. «Civilização de Harappa» não me parece mal, evidentemente, mas acontece que em 99 % dos casos o que se escreve é «Civilização Harappa», o que devia envergonhar qualquer pessoa com algumas luzes de entendimento. Senhores dicionaristas, precisamos do adjectivo! Harappiano ou harappense – e ambas as formas se vêem, e até apenas com um p – parecem-me bem.

 

[Texto 5047] 

Léxico: «capsaicina»

E ainda outra esquecida

 

 

   «Considerado afrodisíaco [piripíri], o seu consumo foi proibido aos jovens no século XVI, por se considerar que desencadeava a sensualidade. A culpada, de novo, é a capsaicina, que faz aumentar os níveis de endorfina e, logo, a sensação de bem-estar. O aumento da temperatura corporal e o ligeiro rubor das faces, [sic] eram sinais que indicavam a presença do diabo no corpo. Vai uma dentadinha?» («Pimentos & afins: uns picam muito, outros nada», Ana Pedrosa, «Fugas»/Público, 6.09.2008, p. 31).

 

[Texto 5046]

Léxico: «meticilina»

Outra esquecida

 

 

      «Uma das infecções mais perigosas que se podem apanhar nos hospitais, o estafilococo áureo multirresistente (MRSA, na sigla em inglês), é causada por uma bactéria que adquiriu mudanças [sic] que lhe conferem defesas contra a meticilina e a outros antibióticos. Uma das estirpes mais recentes de MRSA, que começa a ser vulgar em países como a Dinamarca, tem origem em gado bovino» («Estafilococo multirresistente saltou das vacas para o homem há 40 anos», Nicolau Ferreira, Público, 23.08.2013, p. 26).

 

 [Texto 5045]

Da erva-alheira

Quem mande

 

 

   Tomemos como exemplo a erva-alheira (garlic mustard, para a legião de anglófonos que nos segue), que até está no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora. É certo que regista que é a «planta de cheiro aliáceo, da família das Crucíferas, espontânea em Portugal, também conhecida por alheira», mas nem sempre é informação suficiente. Sobretudo em tradução, pode não ser suficiente; suficiente seria indicar-se em todos os casos em que fosse possível ­— e em poucos o não é — o nome científico, neste caso, Alliaria petiolata. Nunca foi tão fácil concretizar tudo isto, mas é preciso que alguém compreenda e decida fazê-lo. As versões em linha dos dicionários têm ainda muito por onde melhorar. Todos eles podiam e deviam ser, ao mesmo tempo, dicionários analógicos.

 

[Texto 5044]

Alaudada, violinada, pianada...

Só a pedido

 

 

      Estou aqui a ler num texto as palavras «violinada» e «alaudada». Como estas, podemos formar muitas outras. Mais: algumas usam-se mesmo no dia-a-dia, e, no entanto, estão incompreensivelmente fora dos dicionários. Dois exemplos: pianada e flautada. No Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, por exemplo, temos «guitarrada», e já é um pau.

 

[Texto 5043]

Léxico: «sulforafano»

Dos brócolos para os dicionários

 

 

  «Cientistas franceses e norte-americanos afirmam que o característico sabor dos brócolos esconde um segredo — uma substância, chamada sulforafano, que, pelo menos em amostras de laboratório, combate a bactéria “Helicobacter pylori”, responsável pela maioria das úlceras e que está na origem de alguns casos de cancro do estômago. O artigo que revela esta função desconhecida dos brócolos foi publicado esta semana na revista “Proceedings of the National Academy of Sciences”» («Brócolos combatem bactéria que causa cancro do estômago», Maria João Lopes, Público, 29.05.2002, p. 16).

      Está nos brócolos, nas couves-de-bruxelas, nas couves-flor, etc., só não está nos dicionários, onde também faz falta.

 

[Texto 5042]

Sobre «dalai-lama»

Falou-lhe de papa de aveia

 

 

   «Sentado de pernas cruzadas na sala principal do centro, [o] Lama Gyurme conta bem-disposto que, nesse café
 do Sr. Coelho, um habitante lhe perguntou: “Olhe lá, por que é
 que anda vestido de mulher?”. Explicou-lhe que era budista, falou-lhe de Dalai Lama. “Ah, esse é um gajo porreiro”, respondeu-lhe o morador» («Os budistas tibetanos chegaram à aldeia alentejana de Santa Susana», Maria João Lopes, Público, 14.09.2014, p. 16).

   Cara Maria João Lopes, é jornalista, mas nunca lhe deve ter chegado notícia disto: dalai-lama é um título, como papa. Imagina-se a escrever «falou-lhe de Papa»?

 

[Texto 5041]

Léxico: «norte-irlandês»

Discriminação ou esquecimento?

 

 

      «“Sr. Não”, “Senhor Nunca”, Ian Paisley até chegou a virar as costas à Rainha Isabel II quando lhe chamou “um papagaio dos trabalhistas” na altura em que Tony Blair negociava os acordos de Sexta-Feira Santa em 1998 que permitiram a partilha de poder entre católicos republicanos e protestantes unionistas depois de 30 anos de troubles. A piada, entre norte-irlandeses, era que “a última vez que Paisley disse ‘sim’ foi no dia do seu casamento”» («Morreu Ian Paisley, o “Sr. Não” da Irlanda do Norte», Joana Amado, Público, 13.09.2014, p. 29).

   Para o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, só há «norte-africano», «norte-americano», «norte-coreano» e «norte-rio-grandense».

 

[Texto 5040]