Uso e abuso do inglês
Anti-séptico vermelho
«Chegou a escrever», diz Pedro Lomba a Vasco Pulido Valente, «no tempo do cavaquismo, que o país estava a passar por um processo de transformação que relembrava o século XIX. Será que o país se transformou?» «Estava a passar. O país transformou-se. Foi o Cavaco que, como lhe disse, pôs o carro a descer a encosta. Ele criou aos portugueses o sentido de entitlement, quando o Estado lhes dava qualquer coisa isso passava a ser um direito. Transformou Portugal. Eu tenho um artigo qualquer que se chama “Homus Cavaquensis”. Isso não foi um erro, foi uma profecia que acabou por se verificar. Se foi esse o grande erro que eu fiz... Eu costumava fazer campanhas eleitorais com um amigo meu que era médico. Entrávamos no distrito de Leiria e ele dizia-me sempre, isto em 1980, “agora vai devagarinho que aqui o Hospital de Leiria só tem algodão e mercúrio cromo”. Anos depois, há hospitais moderníssimos. O Cavaco subiu as expectativas dos portugueses absurdamente» («“Não vejo porque é que um colunista deva ser capado politicamente”», entrevista de Pedro Lomba a Vasco Pulido Valente, «P2»/Público, 21.11.2011, p. 6).
Alguém virá jurar que entitlement é intraduzível. Há ali não sei que matiz, dirão, que não é dado por nenhum vocábulo português. Ah, e é mercurocromo que se escreve, caro Pedro Lomba. Por outro lado, vejam como Vasco Pulido Valente fala: «Se foi esse o grande erro que eu fiz...»
[Texto 707]