Tentativa de explicação
As «Cartas à Directora» do Público trazem hoje uma carta de Maria do Carmo Vieira a felicitar o jornalista Nuno Pacheco pelo texto aqui parcialmente transcrito. Eis um excerto: «Numa onda simplificadora, “limparam-se” então consoantes, acentos e hífens e porque tudo é uma galhofa, até “cu-de-judas”, como exemplifica Nuno Pacheco, deixou de ser “lugar remoto” para se tornar no “cu do próprio Judas”. Assim são estes peritos!» («Parabéns», Público, 9.06.2011, p. 30). Sobre o erro de Nuno Pacheco em relação à grafia de «cor-de-rosa», nem uma palavra.
No texto do jornalista, lembram-se?, também se podia ler «hífens». A leitora Ifigénia deixou então um comentário: «Já agora façam-lhe mais outra caridade: ensinem-lhe como se escreve hífen no plural.» Vejamos: em Portugal, segundo os dicionários, prontuários e gramáticas, o plural de «hífen» é «hífenes». No Brasil, além deste, usa-se igualmente o plural «hifens». Sem acento, como «homens» ou «jovens» ou «barragens», pois nenhum paroxítono terminado em –ens tem acento. Mas Nuno Pacheco e Maria do Carmo Vieira não escreveram «hifens» mas «hífens». Segundo as regras da ortografia, está incorrecto. Contudo, ou ouço mal ou é dessa mesma forma que é pronunciado à minha volta. Habilidosamente, os falantes contornam muitas vezes a necessidade de usar o plural. Quando é de todo inevitável, porém, nunca dizem «hífenes». Alguns até saberão que é este o plural, mas, como não articulam o primeiro e, na escrita acabam por o eliminar, sem, contudo, prescindirem do acento agudo. (Ainda recentemente aqui citei o Livro de Estilo do Público, no qual, a propósito da expressão ex aequo, se pode ler na página 127: «Expressão latina, entre aspas e sem hífen (não há hífens em latim), que significa “com igual mérito”.») Há, assim, uma interacção escrita-oralidade. O uso continuado e alargado deste plural irregular legitimá-lo-á? É o que veremos nos próximos cinquenta anos.
[Texto 128]