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Linguagista

«Eldorado»

Olha quem fala!

 

 

      «Há quem acredite que, com jeito, o país pode tornar-se um centro mundial de tecnologia, há quem acredite que a agricultura tem condições para garantir a auto-suficiência em produtos básicos como os cereais, há quem acredite que no mar pode estar o eldorado que durante séculos os portugueses não foram capazes de descobrir em terra firme» («Um olhar inteligente sobre o mar», Público, 20.06.2011, p. 34).

      Se se argumenta que deve ser grafado em itálico porque vem do castelhano — então milhares de outros vocábulos teriam de passar a ser grafados da mesma forma. E logo no Público, que até o negregado media grafa sem aspas nem itálico, nem mais. «Eldorado» é português, não precisa por isso de ser grafado em itálico.

 

[Texto 189]

Endereço electrónico

@ de razão

 

 

      Na sua crónica de hoje, Nuno Pacheco ocupa-se de uma questão que já aqui foi tratada: a publicação, pelo Ministério da Educação e Cultura do Brasil, de uma obra, Por uma Vida Melhor, em que se defende o indefensável. Escreve, a determinado passo, Nuno Pacheco: «No endereço electrónico do ministério, a polémica favorece o livro. A professora que o escreveu é bem-intencionada, os que criticam o livro não o leram bem, etc.» («O caçador caçado», Nuno Pacheco, «P2»/Público, 20.06.2011, p. 3).

      É uma confusão já nossa conhecida: quer escrever-se «sítio» e sai «endereço electrónico». Ou terá sido porque, querendo evitar — o que é mais que louvável — o anglicismo site, pensou em «página electrónica»? Há-de ser lapso, mas, para o caso de subsistir alguma dúvida, deixo a definição da Infopédia: «Endereço utilizado para envio de mensagens pela Internet. É constituído pelo nome do utilizador, o símbolo @ (“arroba”), seguido do nome do fornecedor de serviços de acesso à Internet e o símbolo . (“ponto”) com a zona. Exemplo: utilizador@fornecedor.pt».

 

[Texto 188]

Tipos de frase

Interrogativa ou imperativa? Ou?...

 

 

      «Depois chega o momento alto da obra [Felizmente Há Luar!], quando Matilde, uma das personagens principais, veste a sua saia verde para assistir à execução do seu amado, o general Gomes Freire. “Digam lá o que simboliza a saia de Matilde?”» («Apostas em Sttau Monteiro, Pessoa e José Saramago», Romana Borja-Santos, Público, 20.06.2011, p. 9).

      A professora está a fazer uma pergunta ou um pedido? (Alguns dirão que é antes uma ordem.) É adequado, no contexto, o uso do ponto de interrogação? Fica resolvido se usarmos outra pontuação, dando-a como interrogativa parcial? Assim: «Digam lá: o que simboliza a saia de Matilde?» Digam o que acham, não se acanhem.

 

[Texto 187]

Superlativo hebraico

É só repetir

 

 

      «Há 21 anos nesta escola [Escola Básica e Secundária de Carcavelos], para Leonor Brazão o único segredo para os exames nacionais é trabalhar, trabalhar, trabalhar» («Apostas em Sttau Monteiro, Pessoa e José Saramago», Romana Borja-Santos, Público, 20.06.2011, p. 9).

      Em literatura, diz-se logo que se trata de repetição com valor expressivo. Quem já leu composições de alunos do 2.º ciclo, de crianças de 11 ou 12 anos, sabe que a repetição de uma palavra é, pela sua simplicidade, um dos recursos que mais usam. «E depois o príncipe foi andando, andando, andando...» Nunca mais parou. Isto fez-me lembrar outro recurso, também fundado na repetição. Ainda se ensina na escola o superlativo hebraico? Decerto que não. Nem a maioria dos professores mais novos saberá do que se trata. Rei dos reis, vaidade das vaidades, cânticos dos cânticos... Estão a ver agora? É uma construção enfática que consiste na intensificação do substantivo pela sua repetição no plural como adjunto adnominal. Veio do hebraico, pela Bíblia, directamente para o português, para o castelhano, para o francês, para o italiano, para o inglês. Em alemão, muito antes de qualquer vaga de anti-semitismo, o Cântico dos Cânticos passou, no século XVI, de Lied der Lieder para Hoheslied ou das Hohelied. «A vista repousava, bêbeda de luz, na confiança das confianças», escreveu Aquilino Ribeiro.

 

 

[Texto 186]

Ortografia: «hidático»

Um caso clínico

 

 

      Então aqui o nosso autor escreveu que não sei quem tem «um quisto hidáctico». O Acordo Ortográfico de 1990 vai fazendo estragos insuspeitáveis há meia dúzia de anos. «Hidático», caro senhor, «hidático», nunca teve c — nem mudo nem falante. Ter-nos-á vindo do francês hydatique. Está, assinala o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, por «hidatídico». Este quisto é causado por uma ténia, a hidátide. Se quiserem ficar maldispostos, pesquisem «hydatic» nas imagens do Google. Não, não precisam de acrescentar «cyst». Uma doença terrível, parece.

 

[Texto 185]