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Linguagista

Sobre «enfermo»

Com rabo de fora

 

 

      «Os arguidos, todos idosos (têm agora entre 79 e 85 anos) e enfermos, faziam parte do núcleo duro do regime ultramaoísta liderado por Pol Pot, criador dos campos de morte no Camboja, morto em 1998, após ter sido feito prisioneiro pelos seus correligionários» («Julgamento histórico do Khmer Vermelho testa credibilidade do tribunal da ONU», Público, 28.06.2011, p. 13).

      É claro que o vocábulo «enfermo» é português, e nem terá vindo (não é assim, Fernando Venâncio?) do castelhano, mas cheira-me logo que a fonte foi espanhola: «Los acusados, todos ancianos y enfermos, etc.» Felizmente não embatucaram em Jemeres Rojos, cuja tentativa de tradução podia dar qualquer coisa como Gemeres Roxos. (Ah, sim: se «maoísta» é incorrecto, incorrecto será «ultramaoísta».)

 

[Texto 230]

«Censo/census»

Talvez latiniparla

 

 

      Parece que o consumo do álcool está a aumentar ligeiramente em alguns sectores laborais. O Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT) quer apurar a dimensão do fenómeno. Vai daí... «Este inquérito que o Instituto da Droga prevê iniciar em Setembro será feito nos moldes do census e presta uma particular atenção ao consumo de drogas e de álcool em meio laboral» («Consumo de álcool está a aumentar no meio laboral, drogas estabilizaram», Margarida Gomes, Público, 28.06.2011, p. 6).

      Latim e do melhor — via Ilhas Britânicas. Mas para quê census em vez de censo, valha-me Deus? Consegue explicar razoavelmente este surto de latinismo escusado, cara Margarida Gomes?

 

[Texto 229]

«Pôr (meter) mãos à obra»

Neste caso, é igual

 

 

      «Então decidimos pôr mãos à obra» («Cumprir as promessas», Luís Francisco, «P2»/Público, 24.06.2011, p. 3).

      Num tempo, este, de tanta confusão no uso dos verbos pôr, colocar e meter, convém lembrar que há construções, como aquela assinalada na citação, que admitem dois verbos, no caso pôr e meter. O que, tanto quanto me lembro, não é muito vulgar. «Atirou-se à mesa, ao papel, meteu mãos à obra, para compor alguma cousa, um sonêto, um sonêto que fôsse» (Obra Completa, Vol. 2, Machado de Assis. Rio de Janeiro: Companhia José Aguilar Editora, 1962, p. 1092). 

 

 

[Texto 228]

Linguagem

Um polícia como aferidor social

 

 

      Isto é muito interessante, pois mostra o poder da linguagem. Como se chegou à designação Marcha das Galdérias (SlutWalk, em inglês)? Um «polícia, Michael Sanguinetti, numa palestra sobre segurança no campus universitário, a 24 de Janeiro, na Faculdade de Direito de Toronto [disse]: “Aconselharam-me a não dizer isto, mas vou dizê-lo na mesma, pois a verdade é que, se quiserem evitar ser vítimas de agressão sexual, não devem vestir-se como galdérias [sluts]”. […] As críticas a Sanguinetti — e ao pensamento social expresso pelo polícia — estão sempre lá, também na escolha do nome dada [sic] às manifestações. “Usamos a palavra ‘galdéria’ [slut], porque foi essa a palavra que o polícia usou. Se ele tivesse dito ‘vadia’ [tart], seria então essa a palavra que usaríamos e estas seriam TartWalks”, ironiza Caitlyn Haywordat, outra das organizadoras da marcha de Londres» («Marchas das Galdérias. Há uma nova voz do feminismo», Dulce Furtado, «P2»/Público, 28.06.2011, p. 9).

 

 

[Texto 227] 

Sobre «género»

Muito bem

 

 

      «“A interpretação do tribunal é inaceitável, como o é a tipificação do crime de violação no nosso Código Penal, permitindo desenlaces como o deste caso. E nós queremos dizer que já não dá mais para aceitar estas coisas”, sublinha [Joana Vicente] Baginha, de 32 anos, formada em Sociologia e que este ano segue para o Reino Unido para defender um mestrado em Estudos do Género (sexo masculino e feminino) na School of Oriental and African Studies» («Marchas das Galdérias. Há uma nova voz do feminismo», Dulce Furtado, «P2»/Público, 28.06.2011, p. 9).

      Cá está: a jornalista viu-se obrigada, ainda que o contexto fosse explícito, a explicar o que é isso de «género». Fez muito bem, pois é, para nós, neologismo — se bem que já se ouça um ou outro polícia (!) a falar de «violência de género».

 

[Texto 226]

«Profe/profes»

Têm a solução

 

 

      «Nova avaliação de ‘profs’ deve estar pronta em Setembro» (Ana Bela Ferreira, Diário de Notícias, 25.06.2011, p. 17).

      Nesta redução é que o Diário de Notícias anda muito mal. Podiam aprender com o colunista Jorge Fiel, que foi revisor no Jornal de Notícias. «Ela [Bárbara Coutinho] até gosta de dar aulas, mas como não queria passar o resto da vida como profe no secundário candidatou-se e foi aceite no concurso que pedia uma pessoa que concebesse e coordenasse o serviço educativo do CCB» («“É preciso tirar as aspas ao ‘design’”», Jorge Fiel, Diário de Notícias, 20.2.2010, p. 65).

 

[Texto 225]