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Linguagista

«Barcos-casa» ou «barcos-casas»?

Cada cabeça

 

 

      «Os turistas espanhóis que preferirem dormir sobre a água têm também a possibilidade de alugar um dos barcos-casa do Alqueva, com capacidade para dez pessoas, cujas diárias ascendem aos 460 euros» («Campanha de promoção turística do Alentejo em Espanha gera protestos», Público, 28.06.2011, p. 26). «Com capacidade para alojarem entre duas e 12 pessoas, os barcos-casas estão dotados de condicionantes técnicas que possibilitam uma navegação segura» («Dispara procura dos barcos-casas», Luís Maneta, Diário de Notícias, 14.06.2011, p. 21).

      Também me parece, bem ponderado, mais acertado manter invariável o segundo elemento, «casa», que tem valor de determinante específico do primeiro elemento, «barco». Mas, como se vê, cada cabeça, sua sentença.

 

 

[Texto 237]

Como se escreve nos jornais

Consegue melhor

 

 

      «O juiz do Supremo Tribunal de Nova Iorque ordenou ontem a procuradora Maxine Rosenthal, que está a conduzir a acusação contra Renato Seabra, a entregar 25 fotografias da cena do homicídio ao advogado de defesa do jovem modelo» («Juiz ordena entrega de fotos do crime à defesa de Renato Seabra», Kathleen Gomes, Público, 28.06.2011, p. 10).

      Primeiro pensei, complacente, que o problema era somente a falta de acento grave na contracção. Avancei na leitura e concluí que não. Nem pouco mais ou menos. Que construção é aquela?

 

[Texto 236]

Ortografia: «cranioencefálico»

Assim falava o médico

 

 

      «Na sequência do acidente, o ex-vocalista da banda D’Zrt, de 28 anos, fez um traumatismo crânio-encefálico e outras lesões consideradas “irreversíveis” pelos médicos» («O milagre que os fãs pediam não aconteceu e a morte de Angélico foi confirmada à noite», Margarida Gomes, Público, 29.06.2011, p. 10).

      Reparem: «fez um traumatismo». Quase todos os médicos falam assim, e os jornalistas, psitacídeos, imitam-nos na perfeição. E é cranioencefálico que se escreve, sem hífen.

 

[Texto 235]

Uso do itálico

Etc.

 

 

      Apesar dessa operação preliminar de revisão, deveriam os autores imprimir maior cuidado à elaboração de seus originais, facilitando, assim, sobremaneira, o mister dos revisores de texto, etc.

      É Faria Guilherme, nos idos de 60, que o escreveu. Reparem: o etc. não está grafado em itálico. E porquê? Porque é uma intromissão de alguém, minha, neste caso, no texto de outrem. Se é — tem de se dar a entender claramente ao leitor.

 

[Texto 234]

«Hmm/hum/mnham»

Mas parece

 

 

      Posso estar enganado, mas creio que pouca gente sabe que a interjeição hum — geralmente com o alongamento da vogal nasal, como se lê no Dicionário Houaisstambém expressa aprovação. Hum, gente reticente, difidente, mal-agradecida. Lembrei-me quando li esta frase: «Hmm, it’s sweet, so sweet. My. My!» O tradutor verteu assim: «Mnham, que delicioso, que doce. Cruzes canhoto!»

 

[Texto 233]

Símbolo

Pois sabem, mas escreveram-no

 

 

      «Autarcas e movimentos de utentes mostram-se indignados com o plano do anterior Governo para cortar 794 kms à rede ferroviária nacional. Novo executivo ainda não tomou posição» («Visão financeira ditou proposta de fecho de linhas férreas que já está a provocar críticas», Carlos Cipriano, Público, 28.06.2011, p. 24).

      Eu tomo uma posição: está errado. Claro que eles sabem, nós sabemos, todos sabem — mas muitos esquecem. O símbolo de quilómetro é km, e os símbolos não levam marcam do plural. Símbolo, repito, e não abreviatura, como Fernando Venâncio Peixoto da Fonseca escreveu aqui. Como é que podia ser abreviatura, se quilómetro não se escreve com k? Ai estes especialistas.

      E a propósito de anterior Governo. Há dias, aqui perto de casa, vi um estêncil numa parede apenas com palavras: «Votar nos chuchalistas? Jamé!» Não é engraçado?

 

 

[Texto 232]

Literatura

Uma ideia perigosa

 

 

      João Pedro Pereira cita hoje no Público Franco Moretti, professor na Universidade de Stanford, nos EUA, a propósito da impossibilidade de ter uma visão global da literatura — e da possível e paradoxal solução: deixar de ler. «Consiste essencialmente em introduzir em programas informáticos os dados dos livros e deixar a máquina fazer as análises. Num artigo publicado recentemente, Moretti dá um exemplo: num diagrama que mostre as várias personagens e as relações entre elas, o protagonista será a personagem que tem menos graus de separação de todas as outras» («Deixar de ler para perceber os livros», «P2»/Público, 28.06.2011, p. 3).

      Pelo sim, pelo não, prefiro esperar pelo chip subcutâneo com milhares de obras, com ligação directa ao cérebro. O que, aliás, só servirá para a nossa própria satisfação, pois qualquer pessoa pode ter uma biblioteca maior ou melhor do que a nossa.

 

[Texto 231]