Acordo Ortográfico
Eh lá, isso é muita coisa
Na edição de hoje do Público, um mestre em Culturas e Literaturas Africanas e da Diáspora (diacho, isto há-de custar a enunciar quando se apresenta), António Jacinto Pascoal, que se apresenta como professor de Português e de Língua Portuguesa, falante e «usuário» da língua, escreve que tem acompanhado com muito interesse o debate sobre o Acordo Ortográfico. Termina assim o texto: «Tentando resumir o que penso: os defensores do AO não estão interessados em estabelecer qualquer tipo de acordo com a comunidade de falantes de que se reclamam e que inclui os falantes portugueses. Impõem-no e pronto. E a ele não subjaz qualquer motivação filantrópica ou supranacionalista. Não creio que seja por se unificar a língua que se vá acabar com os preconceitos em relação às pessoas dos outros países. O AO não nos tornará mais humanos, mais apaziguadores ou mais compreensivos, nem eliminará de nós a tentação de excluir. São necessários outros tipos de acordos, sobretudo os de mentalidades. Este resume-se a regras e a convenções gráficas (algumas risíveis) e, ainda por cima, desrespeita qualquer critério cientificamente razoável, como já ficou provado. Mas uma personagem de O Estrangeiro de Camus diz que “não há nada a que uma pessoa não se habitue”: até mesmo a um fundamentalismo grosseiro e autofágico» («O acordês e a glotofagia», Público, 14.07.2011, p. 36).
Quem é que apresentou o Acordo Ortográfico de 1990 capaz de concitar tantas e tais virtudes? Se já é suficientemente mau, não vale a pena deturpá-lo e, de forma ingénua, esperar dele o que ele nunca poderia, cientificamente perfeito que fosse, dar. Por esse caminho argumentativo, estão a meio passo de afirmar que o Acordo Ortográfico é tão mau que não resolve o problema do défice.
[Texto 303]