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Linguagista

Deixem-nos morrer

Que surpresa!

 

 

      Fernando Belo, catedrático jubilado de Filosofia, com doutoramento sobre a epistemologia da Linguística saussuriana, também escreve hoje no Público sobre o Acordo Ortográfico de 1990. O título diz quase tudo: «Nem pró nem contra». No fundo, só pede que o deixem morrer — e a todos nós, uns mais novos, outros mais velhos —, e depois que façam o que quiserem. Um filósofo a remeter para o futuro um problema dos nossos dias? Está bem. «Ora, é nas escolas que a questão é complicada, porque a quem está a aprender a escrever o problema das consoantes mudas não se põe (a mim, sim, porque não as digo mas leio-as!). E aí julgo que o Ministério da Educação tem pertinência em propor uma lei destas. Poupem-nos a nós, os mais velhos, deixem que o tempo nos leve e que daqui a umas boas dezenas de anos já seja como em relação aos dois ll ou ao ph, igual para todos.»

 

[Texto 1146]

VOP e LINCE, «malformações inviáveis»

Inaplicável

 

 

      Paulo Jorge Assunção, docente e investigador, escreve hoje no Público sobre o Acordo Ortográfico. Eis um excerto do que me parece mais relevante: «Para quem não esteja a perceber nada, por não ter lido o AO90, esclareço. O texto publicado no Diário da República de 23-8-1991 não contém, realmente, a nova grafia das palavras. O que se lê, num Anexo, é apenas um conjunto de regras gerais (muito mal feitas), para serem mais tarde concretizadas (artigo 2.º do AO90) através do estabelecimento de um vocabulário ortográfico comum a todos os países signatários (ou seja, por via de outro acordo, específico), que nunca foi feito.

      Isto significa que o AO90 ficou (nos seus próprios termos) inaplicável, suspenso de facto futuro. Não sou eu quem o diz. É o texto do AO90 que é explícito.

      E, no meio do absurdo, tem lógica que assim seja, pois ninguém sabe ao certo explicar o que significa “escreve-se quando se pronuncia”, porque isso retira o “h” ao verbo “haver”, por exemplo, e deixa a dúvida acerca do “p” em “excepto”, porque o João não diz o “p”, mas a Maria diz o “p”. Se o Estado se comprometera, com os demais signatários, a elaborar o vocabulário comum, não poderia entregar a mãos incertas aquilo que nem sequer é seu: a Língua Portuguesa.

      Postos à solta, os legisladores por contrato andaram a inventar. Já que estavam “com a mão na massa”, moldaram (com os pés?) o próprio acordo (que não lhes pareceu suficientemente mau...), cortando consoantes a granel, como se não houvesse amanhã!

      O acordo, na Base IV, prevê duplas grafias?! Nada disso! O acordo prevê, mas eles não deixam! Com a legitimidade democrática do recibo verde e a sensibilidade linguística da retroescavadora, esta troika oculta reinventou a Língua, segundo o insondável critério do “acho que fica melhor assim”. No entusiasmo, aproveitou o facto de o AO90 ser aberto e impreciso e, milhares de euros mais tarde, eis que pariu esta malformação inviável, a que chamam VOP e LINCE. E é como estamos. Porém, num Estado de Direito, de onde a certeza e a segurança não devem ausentar-se, as coisas não são assim.

      Por isso, sem norma técnica com valor jurídico que as defina, as regras gerais do AO90 não vigoram.

      Como se entende, pois, esta desenfreada imposição do disparate? É simples. A maioria das pessoas não leu o texto do acordo. Diz-se que aquilo é obrigatório. Os impostos pagam as acções de (de)formação nos serviços públicos e nas empresas. Começa a usar-se o barbarismo de modo generalizado. E pronto! A mentira torna-se verdade e não se fala mais nisso» («O AO90 está em vigor? Onde?», Público, 26.02.2012, p. 52).

 

[Texto 1145]

Impedimentos que impedem

Falha do redactor dos improvisos

 

 

      Sobre o cancelamento da visita à Escola António Arroio, disse Cavaco Silva: «O meu gabinete, no dia próprio, teve o cuidado de informar a direcção da escola de que um impedimento de última hora me impediu de concretizar a visita.» Parece mais discricionário do que é: não terá sido no dia próprio, mas no próprio dia. E lá está o impedimento a fazer, num país onde nem tudo funciona bem, o que lhe compete: a impedir.

 

[Texto 1144]