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Linguagista

Léxico: «vila-viçosense»

Erudição de Sacatrapo

 

 

      «Sabedoria de Sacatrapo em relação à D. Emília Fagueiro que, quando lhe morrera o marido que era sargento da guarda fiscal em Vila Viçosa, resolveu emigrar para Inglaterra, para poder viver à vontade com outro vila-viçosense uns bons vinte anos mais novo do que ela, o Sr. Gurmesindo, ou apenas Gurmesindo» (Tubarões e Peixe Miúdo, Alexandre Pinheiro Torres. Lisboa: Editorial Caminho, 1986, p. 95).

      Fora do túmulo dos prontuários e dicionários (poucos), nunca tinha lido. Nem ouvido. Calipolense é mais curto e mais fácil de articular.

 

[Texto 1382]

Sobre «cônjuge»

Olha este

 

 

      Caro Montexto, já não precisamos do Doutor Fausto: «Eis o prémio para as cônjuges de soalhos sem mácula e de sovacos e partes secretas escaroladas alastrando o aroma a sabonetes escolhidos» (Tubarões e Peixe Miúdo, Alexandre Pinheiro Torres. Lisboa: Editorial Caminho, 1986, p. 94).

 

[Texto 1381]

«Pilonada»

No toutiço

 

 

      Esquecemo-nos de «pilonada». «A praga de Haddock foi medonha e o seu gesto ameaçador. Antes porém que Sacatrapo tivesse tempo de reflectir, o Zoólogo arranca-lhe o trambolho das unhas e desaba tal pilonada no toutiço do esqualo que um espicho de sangue lhe irrompe do tutano e empasta o “conterrâneo” dos pés à cabeça» (Tubarões e Peixe Miúdo, Alexandre Pinheiro Torres. Lisboa: Editorial Caminho, 1986, pp. 31-32).

      Apropriação de Alexandre Pinheiro Torres, pletórico de criatividade? Dar una pilonada é, no calão espanhol, fazer uma mamada, que, credo!, está registada no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora.

 

[Texto 1380]

 

«Cronyism»

Uma estranha escolha

 

 

      «Com o devido respeito pelos visados, os ingleses têm uma palavra para isto: cronyism. Ou parafraseando Eduardo Catroga: estão a “abandalhar” o Tribunal Constitucional» («Duas bizarras escolhas», Pedro Lomba, Público, 17.04.2012, p. 48).

      Ingleses... são mais os Americanos. O cerne da questão: é preciso usar uma palavra estrangeira, estranha aos leitores, quando existem várias portuguesas para dizer o mesmo?

 

[Texto 1379]

«Pesquisa cursiva»

Igualmente intenso

 

 

      «Uma pesquisa cursiva pela actual e anteriores composições mostra-nos que até agora fizeram parte do Tribunal Constitucional 21 juízes de carreira: 13 pertenciam aos tribunais supremos, cinco eram juízes-desembargadores e os restantes três eram juízes de Direito com mais de 20 anos de carreira. Mais do que compreensível, é necessário. Neste caso, indicando Conde Rodrigues, o PS propõe quem tem só ano e meio de funções no tribunal administrativo de primeira instância» («Duas bizarras escolhas», Pedro Lomba, Público, 17.04.2012, p. 48).

      Vê-se que Pedro Lomba gosta da língua — mas amor é cuidado, e no uso que dela faz nota-se, mais uma infausta vez, grave descuido. O que é uma «pesquisa cursiva»? Qualquer coisa mais obscura do que a «restituição intensa» do primeiro-ministro.

 

[Texto 1378]

Sobre «pinhole»

Pegue na lata

 

 

      «Latas que foram transformadas em máquinas fotográficas estão a ser espalhadas por Lisboa à espera de que alguém nelas pegue e lhes dê uso, um projecto para divulgar a fotografia pinhole. A fotografia pinhole (do inglês pin-hole) é uma técnica sem recurso a lentes. Para captar imagens é necessário um compartimento estanque à luz, um pequeno orifício (pinhole ou estenopo) e um material fotossensível» («Ruas recebem latas que são máquinas fotográficas», Nuno Ribeiro, Público, 17.04.2012, p. 23).

     Pinhole do inglês pin-hole... Pois é, até parece que pinhole é português. Vá lá «pinhola», um molusco da costa algarvia. Até mesmo «estenopo», que conheço há muito, é desconhecido dos dicionários.

 

[Texto 1377]

Sobre «cidadania»

É o costume

 

 

      «Ainda antes da actual crise, a discrição que era apanágio da monarquia conheceu sérios sobressaltos. Juan Carlos ultrapassou bem o que foi a sua maior gaffe diplomática, quando, em Novembro de 2007, na sessão final da XVII Cimeira Ibero-Americana, no Chile, repreendeu Hugo Chávez com a pergunta: “Por que não te calas?” O Presidente venezuelano interrompia José Luís Rodriguez Zapatero, que saíra em defesa do seu antecessor, José Maria Aznar, acusado de ser “fascista” pelo mandatário de Caracas. A cidadania espanhola apoiou a atitude do monarca e foram impressos cachecóis com a frase de Juan Carlos. A sua popularidade saiu reforçada» («Juan Carlos. Polémicas de uma caçada», Nuno Ribeiro, Público, 17.04.2012, p. 23).

      É raríssimo que se fale, na impresa, de algo relacionado com Espanha e não se infiltre um castelhanismo. É o caso. «Cidadania», na acepção de conjunto dos cidadãos de um povo ou nação, é puramente castelhano.

 

[Texto 1376]

Tradução: «servidumbre»

Em tempo de crise

 

 

      Desta vez, o Borbão mostrou-se pouco inteligente. No Jornal da Tarde, passaram as críticas de Tomás Gómez, secretário-geral do PSOE, que afirmou que era pouco edificante para quem tem de «elegir entre las obligaciones y las servidumbres de las responsabilidades públicas y una abdicación que le permita disfrutar de una vida diferente». «As obrigações e os serviços», leu-se nas legendas. O Dicionário Espanhol-Português da Porto Editora dá como tradução de servidumbre, nesta acepção... nada. Ou, vá, com boa vontade, servidão. Não me cheira. E sujeição?

      «Não é de agora o gosto de Juan Carlos pelas caçadas: tinha 24 anos quando começou a fazer caça grossa em África.» Neste caso, está correctíssimo. Incorrecto seria se tivessem dito «caça maior», galicismo muito usado (chasse majeure).

 

[Texto 1375]