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Linguagista

Léxico: «estapagado»

Pobre fauna

 

 

      «Está sol e vento, e há esconsos e grutas, pedregulhos onde saltitam cabras selvagens, enseadas e penínsulas sobrevoadas por gaivotas, cagarros e estapagados, de asas negras e peito branco» («Chegar ao Corvo e ficar para sempre», Paulo Moura, «Fugas»/Público, 21.04.2012, pp. 10-11).

      O Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, por exemplo, o mais consultado e vendido em Portugal, não regista o termo. Mas também não regista «cagarro». E não será ainda pior que o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa o acolha, mas a definição esteja errada? «Ave aquática dos mares de Angola.» Puffinus puffinus.

 

 

[Texto 1408]

«Aparte/à parte»

Ainda falhamos nisso?

 

 

      «Aparte o pequeno nicho de casario escondido, tudo o resto é selvagem. Exceptuando apenas uma antiga fábrica de manteiga (agora habitada uma vez por ano por um coreógrafo suíço e louco, com a sua companhia de dança — durante um mês, criam e ensaiam uma peça que depois exibem por toda a Europa) e o bar, quase sempre fechado, isolado na vertente e chamado Formidável» («Chegar ao Corvo e ficar para sempre», Paulo Moura, «Fugas»/Público, 21.04.2012, p. 10).

      Pois, é daqueles erros comezinhos e mais comuns. Só é, ou devia ser, incomum ser um jornalista a dá-lo. À parte é uma locução adverbial e significa excepto, sem falar emAparte é um substantivo e significa o que um actor diz simulando falar consigo; frase isolada para interromper alguém; observação marginal em discurso.

 

[Texto 1407] 

«Mezzanine/mezanino»

Entre dois andares altos

 

 

      «A emblemática mezzanine do terceiro andar ainda lá está — e a grande escadaria da entrada, mais o palco, o bengaleiro e o chão de madeira. Tudo empoeirado por causa das obras — mas intacto debaixo do pó. Fechado há 12 anos, o mítico Ritz Club tem reabertura marcada para meados do mês que vem no mesmo sítio que o viu nascer, as imediações do elevador da Glória, em Lisboa» («O renovado Ritz Club quer ser a casa dos concertos das bandas portuguesas», Ana Henriques, Público, 21.04.2012, p. 33).

      Uma vez que nem todas as sobrelojas o são, pelo menos aportuguesado: mezanino.

 

[Texto 1406]

Fizesse de novo

Observador de aves

 

 

      «O vale da Benémola conserva uma espécie de libelinha rara (Oxigastra curtisii), protegida pela directiva Habitats. A descoberta veio permitir que aos observadores de aves (birdwacthing) — uma actividade com cada vez mais adeptos a nível mundial — se juntasse o grupo dos que se interessam por estes insectos voadores» («No algarvio vale da Benémola vai nascer a Rota das Libélulas e Libelinhas», Idálio Revez, Público, 21.04.2012, p. 34).

      Não andou longe da verdade, caro Idálio Revez. Mas é birdwatching. O pior é o termo inglês não explicar o que está antes dos parênteses, não é? Deveria ter escrito birdwatchers. Vendo bem, o pior é a redacção de toda a frase ter sido descuidada. E não escreva «a nível mundial»: experimente «em todo o mundo».

 

[Texto 1405] 

Erros de sempre

Caso contrário, vejamos

 

 

      «Mas não é só inútil [o Acordo Ortográfico de 1990]. Veja-se esta antologia de escrita, colhida em trabalhos académicos: “se vi-semos”, “há-dem ver” (mas isto até ministros dizem), “se nos entretermos”, “o homem dasse a conhecer”, “deve-se dizer não há violência”, “há-ja compreensão”, “isso nada tem haver com o real”, “à muito que é assim”, “tratam-se de questões complexas”, “é assim; senão vejamos”; “haviam imensos erros”. Se é assim, sem o Acordo, o que vai ser com a confusão em curso do Acordo? Ele não é, portanto, apenas inútil: é prejudicial» («O Acordo Ortográfico: inútil e prejudicial», Anselmo Borges, Diário de Notícias, 14.04.2012, p. 46).

      Quase todos os erros apontados pelo padre Anselmo Borges passaram já ou pelo Assim Mesmo ou pelo Linguagista. Um, porém, parece um pouco esotérico: «é assim; senão vejamos». Vejamos se é parafraseável assim: «É como afirmo; caso contrário, vejamos os meus argumentos.» É? Então não é erro, senão pretenso erro.

 

[Texto 1404]

«Com certeza»

De certeza

 

 

      «O Governo arranjará concerteza muitas explicações para os maus números da execução orçamental, que são o reflexo das medidas de austeridade e da falta de capacidade do Governo para fazer a sua parte no corte da despesa do Estado» («Vítor Gaspar», Público, 21.04.2012, p. 56).

      Não estarei a gastar cera com ruins defuntos a ensinar mais uma vez que se trata de uma locução adverbial? Com certeza... Que sim ou que não. Não sei.

 

[Texto 1403]