Vamos ver se lêem e reflectem
O texto é mais longo, mas não queria deixar de partilhar estes parágrafos da crónica de ontem, no Diário de Notícias, de Vasco Graça Moura. «No que à língua diz respeito, os programas escolares não têm contemplado nas últimas décadas o contacto exigente e variado com os grandes testemunhos da nossa língua ao longo da história, que são os veiculados pela literatura.
As gerações mais novas são confinadas a um pragmatismo comunicacional empobrecedor e rudimentar cujas consequências nos vão sair muito caras.
O sistema tende a incorporar o erro gramatical, legitimando-o, e a aceitar o empobrecimento lexical e sintáctico.
A língua, numa visão cara a George Steiner, é um instrumento de conhecimento e apreensão do mundo. Esse instrumento está permanentemente irisado de uma multiplicidade de valores afectivos, estéticos, sociais, culturais, etc., sedimentados pela memória e pela história colectivas, pelo uso transgeracional, pelos autores, pelas características dos lugares onde é falada, por muitos outros factores.
Disso não se pode fazer tábua rasa. Há quem não encontre solução para as dificuldades de definição dessa norma-padrão, mesmo quando se diz reconhecer a conveniência dela, de modo a ser possível circunscrever o que é “correcto” e o que é “incorrecto”. Afinal, parece que não se quer legitimar essa distinção pelo próprio processo evolutivo da língua, num reducionismo pretensamente lógico que só pode ser empobrecedor e que não compreende que as línguas não se regem propriamente pelas regras da lógica formal.
Uma língua transporta grande parte de uma visão do mundo e de uma cultura. É pela boa aprendizagem de uma língua que se torna possível a formulação eficaz do pensamento abstracto nas suas implicações filosóficas, matemáticas, científicas. E é por aí que se chega ao conhecimento e ao progresso» («Língua e cidadania», Vasco Graça Moura, Diário de Notícias, 30.05.2012, p. 54).
[Texto 1622]