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Linguagista

«Gozam direito»

Interessa saber

 

 

      «O professor da Faculdade de Direito de Lisboa Ivo Miguel Barroso defende que a AR deve aprovar uma norma que desvincule o Estado português do Acordo Ortográfico em vigor. Numa queixa que entrega esta semana na Provedoria de Justiça, Barroso argumenta que os cidadãos “gozam direito de resistência” ao Acordo» («“Resistência ao Acordo Ortográfico», Diário de Notícias, 17.07.2012, p. 22).

      «Gozam direito». Esta regência está correcta?

     Escreveu outro homem do Direito: «Portanto na nossa organisação social as propostas emanadas de qualquer dos ramos do poder legislativo devem ser necessariamente admittidas a discussão naquelle dos outros ramos aonde forem dirigidas: ou, o que val o mesmo, cada um delles goza do direito da iniciativa» (Projectos de Ordenações para o Reino de Portugal, Silvestre Pinheiro-Ferreira. Paris: na Oficina Typographica de Casimir, 1831, p. 485).

 

 [Texto 1846] 

Tradução: «inchworm»

E depois?

 

 

      Ainda hoje estou para saber porque é que o tradutor quis que a palavra ficasse por traduzir. Inchworm. Nem sequer havia (e se houvesse?) nenhum jogo linguístico a salvaguardar, mas ele achava que tinha de ficar no original. Inchworm. Está bem, dizia que não era um inchworm, mas que era do tamanho de um inchworm. Isso não chega a ser um jogo. E o leitor português sabe lá o que é um inch. Vermes.

 

 [Texto 1845]

«Ser alvo»

Querem mudar tudo

 

 

     «Outros membros do Governo também já foram alvos de manifestações de protesto. Casos de, por exemplo, Miguel Relvas (vaiado na abertura dos jogos da CPLP em Mafra, no passado dia 7), de Álvaro Santos Pereira, ministro da Economia, numa visita ao Parque da Ciência e Tecnologia da Covilhã, e do ministro da Saúde, Paulo Macedo, quando inaugurou uma unidade de saúde em Vila Viçosa» («CGTP organizou protestos contra Passos em Borba», Diário de Notícias, 17.07.2012, p. 11).

      Na expressão ser alvo de o termo «alvo» não fica sempre no singular? Não é uma expressão fixa?

 

 [Texto 1844]

«Tratar-se de», de novo

Tinha de ser

 

 

      Há-de ter-lhe chegado aos ouvidos ou aos olhos o que aqui se disse, e por isso Manuel Morujão, porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa, desta vez afirmou: «Trata-se de afirmações pessoais, cuja autoridade e responsabilidade é da pessoa própria, o que acho que é bom sempre proclamar a verdade, no equilíbrio, na justiça, procurando o bem comum.»

      Mas alguém tinha de errar, era inevitável, e por isso o repórter José Ramos e Ramos disse: «O porta-voz da Conferência Episcopal sublinhou tratarem-se de declarações pessoais, mas frisou as obrigações da Igreja.»

 

 [Texto 1843]

«Imã/íman»

E pedra-de-cevar

 

 

      Um leitor anda a ler E Se Eu Gostasse Muito de Morrer (Rui Cardoso Martins. Lisboa: Dom Quixote, 2009, 4.ª ed.). «Um bom romance, bem contado e de grande riqueza de vocabulário, sem exageros», afirma. Mas eis que na página 103 lhe aparece esta frase: «Nessa noite, a copa do plátano protegeu as ruas, foi imã dos relâmpagos.»

      O autor seguiu a lição de Rebelo Gonçalves, que no seu Vocabulário da Língua Portuguesa, na página 547, regista: «imã, s. m. pedra-de-cevar. Forma preferível a íman, que o uso, todavia, consagrou.» Saberá o autor disto? Seja como for, na linha imediatamente a seguir, lê-se: «É tão largo que parece um daqueles bichos do Dali, que só se aguentam no ar com bengalinhas nas banhas.» Não é dali nem daqui, é Dalí.

 

 [Texto 1842]