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Linguagista

Léxico: «estado-novista»

A todos os interessados

 

 

      Ia jurar que já uma vez tinha lido num dicionário «guterrismo», mas consultei agora vários, e dos mais atreitos a tais proezas, e não o encontrei. Como também não encontrei «cavaquismo», valha a verdade. Só encontrei «gonçalvismo» (e o homem merece?). Tudo isto a propósito de um adjectivo que acabei de encontrar: «estado-novista». Também deste não há rasto. Há dois anos, uma assistente editorial perguntou ao Ciberdúvidas como era correcto, se com hífen ou sem hífen. (Pergunta infeliz, mas que querem?) A consultora começou por responder: «Não encontrámos registo, nos dicionários que consultámos, de nenhum adjectivo formado a partir de Estado Novo.» Ora que grande novidade. E depois: «De qualquer modo, na medida em que o sistema morfológico português permite formas (que nem sempre os falantes aceitam, e vice-versa), o adjectivo estado-novista poderá ser encarado como um neologismo, razão pela qual é aconselhável que essa particularidade seja referida, sempre que a consulente o utilizar, uma vez que não está atestado pelos dicionários nem pelos vocabulários ortográficos de língua portuguesa (por exemplo, os realizados a partir dos acordos de 1945 e o de 1990.» Estão a ver: usa-se e, antes ou depois: atenção, esta palavra não está registada em nenhum dicionário. Depois não digam que não avisei. Ridículo.

 

 [Texto 1861]

Léxico: «cobogó»

Só novidades

 

 

      Outra palavra nova para mim: «cobogó». (Vejam aqui uma imagem.) E numa obra séria, sobre arquitectura. No sítio certo, pois é, lê-se no Aulete, a «peça de construção vazada, feita de cerâmica, cimento, gesso etc., utilizada em paredes e fachadas com o fim de obstruir a incidência direta dos raios solares mas permitir a ventilação e a entrada de luz natural». Das iniciais dos sobrenomes Coimbra, Boeckmann e is, os engenheiros que redescobriram este elemento de construção. Tijolos perfurados, pois (perforated bricks, ficou a língua inglesa desarmada).

 

 [Texto 1860]

Léxico: «portuguesofonia»

Venha o Diabo e

 

 

      Li hoje pela primeira vez a palavra «portuguesofonia» — o mesmo (mas ainda pior...) que «lusofonia». Esta, ao que se diz, foi inventada por Fernando dos Santos Neves, o ex-reitor da Universidade Lusófona, agora na berlinda. Aquela, sem paternidade conhecida, os dicionários mais vanguardistas ainda não a apanharam. Deo gratias.

 

 [Texto 1859]

Tradução: «trip wire»

Basta pensar

 

 

      Na notícia, da autoria do jornalista João Botas, do Telejornal de ontem sobre a chacina no Cinema Century 16 de Aurora, Denver, ouvimos e vimos o chefe da polícia local, Daniel Oates, que, segundo as legendas, afirmou: «A nossa investigação apurou que o seu apartamento está armadilhado com vários dispositivos incendiários e químicos, bem como fios de tração aparentes.»

      Fios de tracção é o que se usa em cirurgia, ao que sei. Para que usaria o assassino estes fios no seu apartamento? Para decapitar quem entrasse a 100 à hora? Trip wires, que é o que ouvimos («It’s booby trapped with various incendiary and chemical devices and trip wires.»), traduzir-se-á antes por fios detonadores (ou detonantes).

 

 [Texto 1858]

«Pitão» é do género masculino

Na Gorongosa

 

 

      «A equipa da SIC não correu riscos, mas chegou a assustar-se, como relata Cândida Pinto. “Apanhamos um pequeno susto com uma pitão que surgiu no caminho, mas nada demais. Noutra altura, eu e o repórter de imagem Jorge Pelicano estávamos a chegar ao Chitengo [zona central do PNG], já noite, numa picada, caminho de terra batida, e fomos surpreendidos por uma manada de gnus. Ainda avançaram para nós, mas pouco depois espalharam-se mato adentro”» («Cândida Pinto apanhou susto com pitão na Gorongosa», Filomena Araújo, Diário de Notícias, 22.07.2012, p. 39).

      A serpente também se terá assustado, até porque lhe mudaram o género — é o pitão.

 

 

 [Texto 1857]