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Linguagista

«Alguém» ou «ninguém»?

Será mesmo exigido pela língua?

 

 

      «Era o fidalgo a única pessoa que exercia influência em Bento de Araújo, e tamanha que pudera arrancar-lhe alguns mil cruzados a juros, sob juramento de não dizer a alguém que lhos devia» (Novelas do Minho, 1.º vol., Camilo Castelo Branco. Fixação do texto e nota preliminar pela Dr.ª Maria Helena Mira Mateus. Lisboa: Parceria A. M. Pereira, 1971, p. 213). Já tratei desta questão vai para sete anos. Outro Araújo, o excelso João de Araújo Correia, na obra Enfermaria do Idioma, afirma que uma das cismas de Camilo era, em certas frases, «substituir o alguém da sua cachimónia ao ninguém exigido pela sua e nossa língua» (p. 188). Se antes me pareceu que Araújo Correia tinha razão, hoje já tenho dúvidas.

 

[Texto 2514]

Plural de «Satanás»

Em português lídimo

 

 

      «— Basta, e ouve. Eu te direi em duas palavras e português lídimo ao que venho. De hoje por diante, mandarás cerrar e trancar muito bem tua porta. Andam os andaluzes na costa, e fortes como satanazes...» (A Última Dona de S. Nicolau, Arnaldo Gama. Porto: Casa Editora de A. Figueirinhas, Lda., 1937, p. 45).

      No Dom Quixote está «¡Válgate mil satanases», mas não me lembro como se tem traduzido para português. «Sesenta mil satanases te lleven», deseja o Cavaleiro da Triste Figura a Sancho Pança. É um plural duplo ou redundante, como «filhoses», por exemplo, ou «ilhoses», mas de natureza diferente do caso de «querubins», em que na língua do étimo o sufixo –im já indica plural. E claro que, na ortografia actual, o plural é satanases.

 

[Texto 2513]

Léxico: «londres»

É pena

 

 

      Esta manhã, no Sul de Londres, um helicóptero caiu depois de embater numa grua instalada num arranha-céus em construção. E londres, nome comum, conhecem? Nem os dicionários. E, no entanto, ei-la: «Rodeava-lhe o pescoço uma esclavagem de belas granadas, e vestia sainho de meini verde esmeralda, e uma fraldilha de londres azul, rofegada de festos e cingida por uma faixa ou cingidouro de escarlate» (A Última Dona de S. Nicolau, Arnaldo Gama. Porto: Casa Editora de A. Figueirinhas, Lda., 1937, p. 35). Era uma espécie de tecido antigo, fabricado em Londres. À mudança gramatical, já o vimos há sete anos no Assim Mesmo, em que um substantivo próprio passa a substantivo comum, ou vice-versa, dá-se o nome de derivação imprópria. Pois claro: esclavagem, meini e rofegar também se eclipsaram entretanto dos nossos dicionários.

 

[Texto 2512]