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Linguagista

«Desgranar»?

Mas é bonito

 

 

      «Muitos [peregrinos a caminho de Fátima] vão a pé, desgranando as contas do rosário, apoiados num bordão, de mochila às costas e bolhas nos pés» («Oásis», Gonçalo Portocarrero de Almada, i, 11.05.2013, p. 13).

      À puridade lhe digo, Sr. Padre: acho que só para lá de Badajoz é que se diz dessa forma. Aliás, é pronominal, desgranarse, pois é o que se diz das contas de um colar, de um rosário, etc., quando se soltam. Claro que, em sentido figurado, até das horas se pode dizer o mesmo. Mas para lá de Badajoz.

 

[Texto 2828]

Tradução: «view»

Ah, isso

 

 

      «Tamerlan Tsarnaev, um dos suspeitos dos atentados bombistas de Boston de 15 de Abril, morto durante uma perseguição policial no rescaldo do ataque na maratona da cidade do Massachusetts, “já tinha visões extremistas” quando, em 2012, esteve na Rússia» («Boston. Tamerlan “já tinha visões extremistas”», i, 11.05.2013, p. 11).

      Com nome tão profético, tinham mesmo de fazer qualquer coisa de extraordinário — bom ou mau. E as visões, suspeito, não se assemelharão às de Santa Teresa de Ávila. Fui espreitar as fontes, sobretudo para confirmar se eram os famosos insights, mas não: «Boston bombing suspect Tamerlan Tsarnaev already held extreme views when he visited Russia, Islamists in Dagestan have told US media.» Views...

 

[Texto 2827]

 

«Torino»?

Safa

 

 

      «Um dos soldados desta história, que trabalha em part-time como gigolo, foi inspirado numa vida real, por exemplo. “Mas a maior parte dos personagens foram construídos a partir dos meus 20 anos, com quem convivi até há pouco tempo e com quem partilhei esta casa perto de Torino, ‘La Cascina’, a que o livro é dedicado”» (Maria Espírito Santo, entrevista a Paolo Giordano, «Liv»/i, 11.05.2013, p. 9).

      Há aí pano para mangas, mas fica a nota: em português não dizemos Torino, mas Turim. Então não é, Maria?

 

[Texto 2826]

Plural de «Inês»

Ler e tresler

 

 

      «Como é que dá nome às suas personagens?», perguntou Maria Ramos Silva, do i, ao escritor Carlos Vale Ferraz, que respondeu: «Tenho uma tabela mental de associações, mas é inexplicável. Certas mulheres são Leonores, outras Inês, outras Ninas, ou Vandas. Certos homens são Antónios, outros Joaquins...» («Liv»/i, 11.05.2013, p. 13).

      Ora bolas, então «Inês» não tem plural? Isso é o que Carlos Vale Ferraz pensa — mas erradamente. «Há muitas Marias na terra, e muitas mais Ineses de Castro na imaginação dos nossos escritores» (Ler & Tresler, Agostinho de Campos. Lisboa: Livrarias Aillaud & Bertrand, 1924, p. 78).

 

[Texto 2825] 

Como se escreve nos jornais

Dos títulos mentirosos

 

 

      «Isaltino Morais pediu a suspensão do mandato como presidente da Câmara de Oeiras» («Oeiras. Isaltino Morais renunciou ao mandato de presidente da câmara», Sílvia Caneco, i, 11.05.2013, p. 56).

      Se um autarca pode renunciar ao mandato (art. 76.º da Lei 169/99, de 18 de Setembro) ou suspender o mandato (art. 77.º da mesma lei), o título é logo desmentido na primeira frase do artigo. Que vai claudicando por ali fora, até terminar assim: «Mesmo que não renunciasse ao cargo, Isaltino não poderia exercer porque o artigo 67 do Código Penal dita que “o arguido definitivamente condenado a pena de prisão” fica suspenso de funções.» Em que ficamos, afinal?

 

[Texto 2824]