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Linguagista

Nada de Badajoz: Internet

¡Quítate de aquí!

 

 

      As autoridades do Equador descobriram um microfone escondido no gabinete da embaixadora em Londres, que funciona no edificio onde vive actualmente Julian Assange, o fundador da WikiLeaks. A repórter Marta Jorge disse no Jornal da Tarde de hoje: «Assange negou sempre as acusações, e alega que são uma desculpa para o extraditarem para outro país, para os Estados Unidos, onde é procurado por ter divulgado milhares de documentos confidenciais. Apesar da protecção de Assange ter ensombrado as relações do Equador com o Reino Unido, o Quito pede agora a cooperação britânica nas investigações.»

      Não se vê erro nenhum — nem, valha a verdade, acerto estrondoso que me forçasse a trazer a frase para aqui —­, não é assim? É porque não ouviram a repórter. Para Marta Jorge, o u articula-se, como se articula em «quacre», por exemplo. Podíamos fazer uma vaquinha para a repórter ir à capital do Equador e perceber como se pronuncia. Em tempos de crise, porém, uma bolsa de estudo de um dia em Badajoz já é suficiente. Lá, poderá comprar em qualquer loja uma embalagem de Detersolín, um bom quitamanchas.

 

[Texto 3050] 

Cunhas, calços e rípio

Não só verso

 

 

      Está bem, pronto, eu digo: zeppa é a cunha, a «palavra meramente acessória para completar a medida de um verso ou tornar mais eufónico o seu ritmo» (cito do Dicionário Houaiss). No Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, não encontramos esta acepção no verbete «cunha». Já vi a palavra traduzida por «calço», mas neste caso talvez nenhum dicionário registe este sentido. Já aqui usámos duas vezes rípio nesta acepção — palavra usada num verso só para lhe completar a medida —, que também existe em castelhano: «Palabra o frase inútil o superflua que se emplea viciosamente con el solo objeto de completar el verso, o de darle la consonancia o asonancia requerida.» No Hoepli, diz-se que, neste sentido figurado, zeppa é a «parola o frase messa come riempitivo in un verso, in un periodo, senza vera necessità logica o estetica». Em verso ou prosa. Eco dá como exemplo a analepse complementar, que, afirma, por vezes não é técnica calculada, mas cunha, como acontecia a muitos folhetinistas do século XIX, que, forçados a aumentar desmedidamente o seu romance em episódios, se viam constrangidos a remediar esquecimentos ou a justificar, com bruscas explicações retrodatadas, acontecimentos que eram obrigados a pôr em cena. Ainda não havia processadores de texto para prevenir estes casos.

 

 [Texto 3049]

Verbos de elocução

Falsas pistas

 

 

      Cito em italiano, porque os meus leitores vão perceber: «Indicherei come esempio di zeppe quello che alcuni teorici contemporanei hanno chiamato i turn ancillaries, e cioè quelle espressioni che nei romanzi seguono le battute di dialogo» (Sulla Letteratura, Umberto Eco. Milão: Tascabili Bompiani, 2008, 3.ª ed.).

      Parece uma mistificação de Eco, pois «alcuni teorici contemporanei» dizem que a terminologia é do autor do Nome da Rosa. «Entre esses problemas existia um que Eco chamou de “os turn ancillaries, quer dizer os artifícios de que se vale o narrador para ceder a palavra aos diversos personagens”» (O Narrador do Romance, Ronaldo Costa Fernandes. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1996, p. 118). Em português, têm o nome de verbos de elocução.

 

 [Texto 3048]

Tradução

À letra é melhor

 

 

      No «Escrito na pedra» de hoje, no jornal Público, uma citação de Cesare Pavese: «Esperar é ainda uma ocupação. Terrível é não ter nada que esperar.» Não é sempre assim, mas no original está melhor: «Aspettare è ancora un’occupazione. È non aspettar niente che è terribile.»

 

[Texto 3047]