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Linguagista

Léxico: «didracma»

Fiscus Iudaicus

 

 

      Caro R. C.: não precisa de itálico, já por aí corre há séculos: «Logo que chegaram a Cafarnaum, aqueles que cobravam o imposto da didracma aproximaram-se de Pedro e perguntaram-lhe: o vosso mestre não paga a didracma? (São Mateus, 17, 23).» É verdade que habitualmente o que se lê em algumas Bíblias é «aproximaram-se de Pedro os cobradores do imposto do templo e disseram-lhe: “O vosso Mestre não paga o imposto?”». O Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora ignora a palavra. O dicionário da Real Academia Espanhola regista que didracma é a «moneda hebrea que valía medio siclo». Mas é também o nome que se dava ao imposto, nesse valor, pago por todos os judeus maiores de 20 anos a favor do templo de Júpiter Capitolino.

 

[Texto 3069]

Colocação dos pronomes átonos

Apanhe-o agora 

 

 

      «O queixo caiu-me ao chão.» É uma frase da edição portuguesa das Cinquenta Sombras de Grey (p. 252), de E. L. James. Sabia, João Miguel Tavares? Imagine que estava escrito assim: «O queixo me caiu ao chão.» Ainda estaria certo? Agora a sua frase de hoje no Público: «Eu devo confessar que o queixo caiu-me aos pés há oito dias e ainda não tive oportunidade de o apanhar» («Eleições? Foram no sábado», Público, p. 44).

      A conjunção subordinativa «que» atrai o pronome para uma posição pré-verbal. Logo, correcto é desta maneira: «Eu devo confessar que o queixo me caiu aos pés há oito dias e ainda não tive oportunidade de o apanhar.» A colocação dos pronomes átonos é «um dos pontos mais complicados da sintaxe portuguesa», lê-se na Gramática da Língua Portuguesa de Pilar Vásquez Cuesta e Maria Albertina Mendes da Luz (Lisboa: Edições 70, 1971, p. 493). Complicado para quem, para os estrangeiros? Para os jornalistas?

 

[Texto 3068]

O desgraçadíssimo verbo «haver»

Já não se endireita

 

 

      «Finalmente, claro que deveriam ter havido consequências políticas efetivas no caso dos swaps, mas isso é um problema do foro político (onde uma das envolvidas foi promovida a ministra..., e outros voltaram para diretores de empresas públicas, que são cargos de nomeação política ou parapolítica...), ou seja, nada tem a ver com os sistemas de carreiras na função pública como sugere MST» («Jornalismo ou proselitismo? Resposta a Miguel Sousa Tavares», André Freire, Público, 9.07.2013, p. 43).

      Ficamos perplexos: por um lado, o afã em seguir, como que a mostrar interesse na língua (mas demonstra o contrário), o Acordo Ortográfico de 1990, por outro lado, estes erros crassos. Se são amigos ou conhecidos, digam-lhe.

 

[Texto 3067]

Mãe, já sei falar italiano!

A olho

 

 

      O Papa Francisco visitou a ilha de Lampedusa para homenagear os imigrantes africanos. «Há que dar atenção às pessoas, na sua viagem, em direção a algo melhor», lia-se na transcrição da homilia que o Sumo Pontífice ia fazendo (Ana Felício, Jornal da Tarde, 8.07.2013, 13h31). Era um excerto, claro, mas desconfiei logo daquele espúrio «há que» e quis saber como tinha sido dito em italiano. «[Prima però vorrei dire una parola di sincera gratitudine e di incoraggiamento a voi, abitanti di Lampedusa e Linosa, alle associazioni, ai volontari e alle forze di sicurezza, che] avete mostrato e mostrate attenzione a persone nel loro viaggio verso qualcosa di migliore.» Só se ouviu esta parte fora dos parênteses, que se traduz assim: «[Antes, porém, quero dizer uma palavra de sincera gratidão e encorajamento a vós, habitantes de Lampedusa e Linosa, às associações, aos voluntários e às forças de segurança, que] tendes demonstrado – e continuais a demonstrar – atenção a pessoas em viagem rumo a qualquer coisa de melhor.»

      Muito diferente, valha a verdade, do que se lia nas legendas. A falta de cuidado com que se faz quase tudo nunca nos permitirá sair da cepa torta. É tudo aproximado, nada rigoroso.

 

[Texto 3066]