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Linguagista

Os nomes da libélula

Para mim, era só tira-olhos

 

 

      «Mandíbulas dilacerantes e asas enormes fizeram com que estes animais de voos graciosos fossem temidos pelo homem. Reflexo disso é o conjunto de outros nomes comuns atribuídos às libélulas: tira-olhos, cavalinho-das-bruxas, dragões-voadores ou balanças-do-diabo» («Voando com as libélulas de Portugal», Vera Novais, Público, 18.11.2013, p. 26).

 

  [Texto 3551]

Tradução: «empilhamento»

É só isso?

 

 

      «Cada uma destas imagens de pormenor é composta pelo empilhamento digital de várias fotografias (um dos casos chega às 150) tiradas com diferentes profundidades de campo, para permitir focar o maior número de detalhes possível em cada plano. “É a primeira vez que esta técnica de stacking é utilizada num guia de Entomologia [ciência que estuda os insectos]”, sublinha Ernestino Maravalhas, autor destas fotografias» («Voando com as libélulas de Portugal», Vera Novais, Público, 18.11.2013, p. 26).

      Sabem que se traduz por «empilhamento», mas resistirem a usar o termo inglês é que é muito mais difícil.

 

  [Texto 3550]

Léxico: «pentalogia»

E por aí fora

 

 

    «Da sua vastíssima bibliografia, que lhe valeu, em 2007, o Prémio Nobel da Literatura, podem destacar-se ainda O Verão Antes das Trevas (1973), a pentalogia de ficção científica Canopus em Argos (1979-1983) ou A Boa Terrorista (1985), relato perpassado de ironia da vida de uma militante de esquerda, no qual Lessing mostra como a fronteira entre as convicções ideológicas e a prática terrorista pode tornar-se perigosamente delgada» («Morreu Doris Lessing, uma ficcionista de intelecto feroz e coração afectuoso», Luís Miguel Queirós, Público, 18.11.2013, p. 28).

    É para trilogia e tetralogia não se sentiram sozinhas que se inventou esta pentalogia. O modelo é o mesmo.

 

  [Texto 3549]

Léxico: «verde-tropa»

Vamos tratar disso

 

 

     «O atirador não disse uma palavra: chegou à entrada da redacção do diário francês Libération, disparou contra um assistente de fotografia e saiu. A polícia procurava por meia Paris o homem, descrito como usando uma gabardina verde-tropa e de boné, e tendo um aspecto parecido com o de um caçador» («Caça ao homem em Paris para encontrar o “atirador louco”», Maria João Guimarães, Público, 19.11.2013, p. 24).

   Ainda não está nos dicionários, onde não faltam outros verdes compostos. Já o tinha visto, contudo, na literatura e todos o ouvimos. «O Pedro despenteado. E o Pedro com gel no cabelo. De jeans. De calças de combate. Com uma T-shirt azul. Com uma T-shirt verde-tropa. Um Pedro sério, com uma ruga vertical entre as sobrancelhas e um ar ameaçador e triste ao mesmo» (Os Factos da Vida, Ana Saldanha. Lisboa: Editorial Caminho, 2007, p. 173).

 

  [Texto 3548]

«Publicações»?

Pelo menos é português

 

 

      «Sobre estes temas [William S. Fyfe (1927-2013)] escreveu mais de 800 publicações na literatura internacional. Humanista insigne, cultivou ativamente a relevância social da ciência que praticou. Mas houve trabalhos noutras áreas, como as implicações do consumo humano de energia no ambiente» («O pai da geoquímica moderna era um “amigo de Portugal”», Diário de Notícias, 19.11.2013, p. 43).

      Serão estas «publicações» os tais papers de que já temos tratado? Não serão antes «comunicações»? Aqui, que talvez seja a fonte do jornalista, leio: «Bill’s research activities are well-documented in five books, more than 800 scientific papers, etc.»

 

 

  [Texto 3547]

Outro «ad hoc»

Nada a fazer

 

 

      «Na informação: o programa não fôra integralmente avançado e, na sala, havia uma (uma!) folha A4 com o nome das obras escrito à mão! Além disso, houve alterações de última hora, “anunciadas” (com aspas, pois foi quase inaudível) por Paulo Branco. Na preparação: o ensemble reunido para o Szymanowski (a cantora prevista afinal não veio...) pareceu “tresmalhado”, claramente subensaiado e visivelmente ad-hoc»  («Informalidade não quer dizer ‘à toa’», B. M., Diário de Notícias, 19.11.2013, p. 47).

      É claramente melhor do que o inacreditável «ADOC» da colega, mas ainda tem ali uma excrescência: o hífen. O mais-que-perfeito «fora» não tem acento circunflexo. Não é que não precisasse, mas não leva.

 

  [Texto 3546]

Como se escreve nos jornais

Nada de novo

 

 

      «O que resta dos magníficos armários — muitos ter-se-ão estragado quando foram deslocados do local original — e dos animais (golfinho, leopardo, veado e canguru desapareceram; crocodilos ainda há dois, mais uma piton e o gigantesco crânio de um hipopótamo), assim como centenas de relíquias de laboratório e uma coleção de modelos de plantas em porcelana alemã de rara beleza (e decerto valor), está armazenado numa sala pequena, juntamente com o “quadro de honra”, uma caravela feita por alunos para oferecer ao reitor, uma “carteira” original, daquelas em que o assento está pegado à mesa, com buraco para tinteiro e tampo de levantar, na qual Artur Antunes consegue ainda acomodar-se, e muita nostalgia» («Camões e a lição do liceu», Fernanda Câncio, Diário de Notícias, 18.11.2013, p. 28).

     Já vimos, e até mais de uma vez, que píton (ou pitão) é do género masculino. «Quadro de honra» e «carteira» entre aspas é tolice de muitos jornalistas, a que Fernanda Câncio — oh surpresa! — não escapa. Ainda na semana passada vi duas salas de aulas no Colégio Militar com carteiras — mesas inclinadas para escrever ou estudar — destas. Não tinham aspas.

 

  [Texto 3545]

Um «idiomatismo» desajustado

Também é cómico

 

 

      «Insuficiências», segundo o crítico do Diário de Notícias, na ópera La Fille du Régiment, de Donizetti, actualmente no São Carlos. «Exemplos: Luciani foi um canastrão de início ao fim, nunca entrou na personagem; a Marquesa pecou pelo exagero e a Krakenthorp parecia a “Duquesa do Mercado da Ribeira”... Também a pronúncia/entoação do francês careceu de idiomatismo» («Um regimento atravancado e a filha com o nome trocado», Bernardo Mariano, Diário de Notícias, 18.11.2013, p. 48).

    Contudo, idiomatismo ou (com sua licença) idiotismo é a construção ou expressão peculiar a uma língua. É isto que pretendia dizer? A avaliar pelo contexto, é claro que não.

 

  [Texto 3544]

Um «fato» triste

Não surpreende assim

 

 

    «Também o psiquiatra e sexólogo Júlio Machado Vaz não acha relevante rever a atual legislação. “Os argumentos para baixar a idade de consentimento sexual andam muitas vezes à volta de fatores como a adolescência ser muito diferente do que era antigamente e de começar mais cedo. Respeito-os, mas tenho dúvidas que o fato de os jovens iniciarem a sua vida sexual mais cedo corresponda a uma maior capacidade de escolhas maduras e acertadas”, afirma» («Baixar idade da emancipação sexual não reúne consenso», Joana Capucho, Diário de Notícias, 18.11.2013, p. 16).

      Uma jornalista — e depois de tudo o que se tem dito e escrito — a escrever semelhante barbaridade. Não admira que o zé-povinho, e não apenas o zé-cuecas, depois, em fóruns e entrevistas à queima-roupa na rua, «ache» que é assim que se escreve.

 

  [Texto 3543]