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Linguagista

Léxico: «bandana»

O pipi de Eliza Doolittle

 

 

     «O Henry [Holland]», diz Eliza Doolittle, «é mais que um estilista, é um criador. Ele foi pioneiro nas coleções com bandanas. E foi incrível» («“Não mostro mamilos nem o pipi”», Metro, 26.11.2013, p. 8).

    Outra novidade: bandana. É, pode ler-se no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, o «lenço colocado à volta da cabeça, passando pela testa, que é utilizado como adorno». A minha filha usou algumas durante o Verão, mas a mãe dizia que eram fitas e, para mim, eram lenços. Vem do francês. Quanto a Eliza Doolittle, será que ela disse mesmo o equivalente a «pipi»? Li que disse: «My rule is no nipples, no nunny.» Eu até pensava que se escrevia «nanny», como já tenho lido.

 

  [Texto 3596]

«Torá» ou «Tora»?

Vendo bem

 

 

      «Mais tarde, os rabinos e outros eruditos judaicos criticaram os cristãos por usarem livros em códice (ou seja, com cadernos de folhas coladas e uma lombada, como os nossos livros modernos) em vez de usarem livros em rolo. A razão da crítica era que os padres da nova igreja podiam comparar facilmente o que se passava no primeiro e no último livro da Torá, pois bastava saltar de uma página para a outra, coisa que era muito difícil num rolo, por ser necessário enrolar e desenrolar de novo. Os sábios da religião antiga eram por isso submetidos a exercícios de memorização que os adeptos da nova religião poderiam evitar, e por isso os primeiros criticavam os segundos em termos semelhantes ao que usam as pessoas que fazem cálculos de cabeça (ou no papel) em relação às que recorrem à calculadora no telemóvel» («Tela ou janela?», Rui Tavares, Público, 27.11.2013, p. 54).

      Parece coisa simples, mas se soubessem o que é preciso para convencer os autores portugueses a não usarem Torah... Torá é também como eu escrevo, mas o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, e não é o único, regista Tora. No que procederá bem, pois também Rebelo Gonçalves é assim que grafa. Na verdade, assim: Tora. Com uma variante, Toura, que se lê, por exemplo, nas Lendas e Narrativas, de Herculano.

 

  [Texto 3595] 

Em todas as línguas

O que é que o nariz

 

 

      Por onde quer que passemos, vemos a língua desvirtuada. Mesmo quando não é a nossa, incomoda. Agora mesmo, vi, ao fundo da minha rua, na parede exterior de um cabelereiro destes finos que pululam agora (é da crise), um autocolante que anunciava «bruschings» a 54 euros. Ontem, a minha mulher comprou um par de meias-calças (colãs, se insistirem) para a minha filha. Não numa dessas retrosarias que havia e agora não há em todas as ruas aqui em Benfica, mas numa loja de chineses. Na etiqueta (ah, sim, têm etiqueta), lia-se «fashion pantynose».

 

  [Texto 3594]

Da importância das marginálias

E vamos tentando

 

 

      «Apesar de não ser muito usado, este volume [dos Lusíadas, depositado no Harry Ransom Center (HRC)] pode ser de extrema valia para várias áreas de investigação. Afinal, como diz o historiador inglês Peter Burke, professor emérito em Cambridge, as marginálias funcionam como uma “evidência da recepção daquilo que o autor emite ao leitor.” Marginálias dos séculos XV e XVI são entendidas, por alguns investigadores, como a primeira forma de hipertexto, de narrativa não linear. Peter Burke defende que as marginálias expressam o que o leitor considera importante, aprova ou desaprova numa leitura» («Camões no Texas», Cláudia Silva, Público, 27.11.2013, p. 33).

      É melhor continuarmos a fazer anotações nas margens dos livros que lemos, e quem sabe se a História não nos lembra daqui a uns séculos, como aconteceu com frei Joseph Índio, carmelita descalço que pode ter assistido Camões no leito de morte e que terá ficado com o exemplar dos Lusíadas que pertencia ao poeta. Claro que também se pode, não da mesma forma decerto, anotar um livro electrónico, mas não é o mesmo. Eu, por exemplo, que leio centenas de textos em PDF, não sou capaz de ler um livro electrónico. Começo, mas desisto. Quero interessar-me, mas desinteresso-me. A última vez foi com o Colecionador de Erva, de Francisco José Viegas. Tive de comprar um exemplar físico, de papel. Talvez me esteja a fazer falta um Kindle.

 

  [Texto 3593] 

Sobre «ob-reptício»

Li e não gostei

 

 

      «Sintomático é que a presidente da Associação de Professores de Português tenha, a priori, o capcioso argumento, típico dos ob-reptícios: dizer que com estas metas regredimos vinte anos... Não, minha senhora. Veja bem: o professor não fica dentro dum espartilho com este programa — liberta-se é dum programa que, admitido em 2001, terá, em 2015 (quando este Novo Programa vigorar), mais de uma década de leccionação. O resultado qual foi? Média nacional de 8,9 no secundário e uma iliteracia nefanda. Eis o resultado. Para quem, como Edviges Ferreira, tem sempre a posição do “não li e não gostei”, estas metas colocam um problema óbvio: o professor terá de ler e terá de saber como ensinar a ler e a escrever. Terá de ler literatura e ensaio sobre obras da nossa cultura (e não só...) e terá de saber articular o discurso literário com História e a Filosofia, com Música e as Artes... É chato. Dá trabalho. Mas os alunos agradecem. Merecem. E o país também» («Verdades sobre o ensino do Português: metas curriculares e não só», António Carlos Cortez, Público, 27.11.2013, p. 50).

      Digamos que o uso de «ob-reptício» — obtido por ob-repção; doloso, fraudulento — é um tanto inusitado.


  [Texto 3592]