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Linguagista

«Regresso a mercado»

Outro o disse

 

 

      Eu já me tinha arrepiado mais de uma vez com esta forma de se exprimir do nosso primeiro-ministro, e andava para escrever, mais dia, menos dia, algum texto a denunciá-lo. Alguém o fez antes de mim — embora, parece, segundo as normas do novo acordo ortográfico — no Aspirina B: «Já não é a primeira vez, nem a segunda, nem a terceira que ouço Passos dizer que Portugal pensa “regressar a mercado” na data tal. Esta maneira de falar suscita-me algumas considerações. Que Passos fala mal a sua língua materna (e não é que fale melhor outra), já tivemos disso várias provas. Mas esta maneira gramaticalmente errada de se expressar parece-me mais do que um mero uso incorreto e ignorante da língua. Não acredito que não saiba que tem ao seu dispor, em português, a expressão “regresso ao mercado” (ou “ao mercado da dívida” ou “aos mercados”, etc.). A prova de que sabe que tem é que, quando esquecido da pose, é capaz de utilizar, e já o vi utilizar nas mesmas declarações, alguma das alternativas» («A parolice do nosso regresso “a mercado”. Apreciação linguístico-moral», Penélope, Aspirina B, 5.12.2013).

 

  [Texto 3629]

Léxico: «mariscador»

Já é tempo

 

 

      «Cerca de quinhentos viveiristas e mariscadores de Olhão encheram ontem o auditório municipal da cidade para tomar medidas contra as novas regras, impostas pelo Estado português, que desclassificam a maioria dos viveiros de bivalves» («Mariscadores admitem ir para mercado paralelo», Miguel Ferreira, Diário de Notícias, 5.12.2013, p. 16).

    Já chegou aos diplomas legais, mas os dicionários gerais da língua, incompreensivelmente, ainda não a acolhem. 

 

  [Texto 3628]

Ortografia: «check-up»

Veja lá

 

 

      «Este é apenas um de muitos casos em que se promove ou induz o consumo muitas vezes desnecessário de cuidados de saúde, a que se juntam a oferta de consultas, check ups ou rastreios» («Rastreios e campanhas agressivas na saúde podem prejudicar SNS e doentes», Diana Mendes, Diário de Notícias, 5.12.2013, p. 4).

      Pois, não é português, mas está largamente difundido e registado nos dicionários gerais da língua, como no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, onde aparece com hífen. Checkup ou check-up é o substantivo, check up é o verbo.

 

  [Texto 3627] 

Dicinodontes e Cinodontes

Têm de lá estar

 

 

      «Surgiu na Terra ainda antes dos dinossauros e dos mamíferos. Era pequeno, não passava os 30 centímetros e 800 gramas. A cabeça tinha um certo ar de tartaruga, devido a um bico córneo que usava para cortar as plantas que comia. Nós e todos os mamíferos do planeta não descendemos directamente dele e do grupo a que pertencia (os dicinodontes), mas de um grupo irmão (os cinodontes) – por isso, este animal que viveu há 256 milhões de anos e cujo fóssil foi encontrado em Moçambique, perto das margens do lago Niassa, é um tio-avô dos mamíferos» («Fóssil do lago Niassa é um tio-avô de todos os mamíferos», Teresa Firmino, Público, 5.12.2013, p. 33).

      Não é, bem sei, o único, mas o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora desconhece os termos assinalados, quando regista, por exemplo, «difiodonte» e «anodonte».

 

  [Texto 3626] 

«A ideia não vincou»!

Não vá ser igual

 

 

      «Mudou de gerência, por consequência de nome e passou a chamar-se Cine Camões – Pedro Borges ainda se lembra de ver ali alguns filmes independentes mas a ideia não vincou. Abriu então na década de 1990 o Cine Paraíso. Começou com exibição regular dos filmes comerciais mas desviou-se para a pornografia. Um caminho que não agradou à Casa da Imprensa, proprietária do espaço, que desde então procurava outras soluções» («E tudo começou com uma barraca em 1904», Cláudia Carvalho, Público, 5.12.2013, p. 37).

    Pode não passar de uma gralha, e já todos sabem que não me ocupo dessas coisas aqui. Contudo, lembrei-me que o outro, que até subiu a secretário de Estado, também escreveu e defendeu a expressão (!) «bramir o estandarte». Que escrevesse, vá que não vá, seria um lapso, mas defender semelhante disparate não cabe na cabeça de ninguém. Por isso, aqui fica esta.

 

  [Texto 3625]

«Fazer uma vaquinha»

Bilingue

 

 

   «Apesar de Eunice Neves já ter, há oito anos, projectado a transformação daquela área num parque público, enquanto estudante de arquitectura paisagista, foi no Verão deste ano que a proposta ganhou expressão. Numa rede social, a arquitecta partilhou a ideia de que a cidade poderia adquirir o espaço. “Poderíamos entre todos fazer uma ‘vaquinha colectiva’, em inglês crowdfunding, para salvaguardar que não fosse urbanizado e que lá crescesse o parque da cidade que Leiria não tem”, relata a promotora da iniciativa» («“Vaquinha colectiva” em Leiria para comprar quinta», Orlando Cardoso, Público, 5.12.2013, p. 21).

    Não é preciso acrescentar «colectiva»: no conceito, já está essa ideia: juntar-se com outras pessoas para partilhar uma despesa. Por precaução, a arquitecta traduziu para inglês, crowdfunding, talvez porque em Leiria já pouca gente fale português.

 

  [Texto 3624]

«As milhões»!

Elementar

 

 

     «Os resultados da privatização dos CTT foram conhecidos ontem, com direito ao tradicional toque do sino no edifício da praça de Lisboa. Das 105 milhões acções dispersas no mercado de capitais, referentes a 70% do capital dos correios, 64,9 milhões ficam nas mãos de investidores estrangeiros, o que corresponde a uma participação de 43,3%. […] A participação de 56,7% que caberá aos portugueses também vem do lado dos investidores institucionais, que das 84 milhões de acções dirigidas a este grupo ficaram com 19,3 milhões representativas de 12,9% do capital (abaixo dos britânicos)» («Euforia com privatização do Royal Mail atrai britânicos para venda dos CTT», Raquel Almeida Correia, Público, 5.12.2013, p. 6).

    Já vimos aqui este erro, mas com o numeral («quantificador numeral cardinal», segundo o Dicionário Terminológico) «milhar». Vamos com calma, Raquel Almeida Correia: «milhão» é de que género? Masculino, muito bem. Então é «o milhão» ou «a milhão»?

 

  [Texto 3623]