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Linguagista

Era de esperar

O bê-á-bá, no século XXI

 

      «Fazia-se cara feia, dizia-se “racista mau, racista feio”, e era esperar que eles caíssem neles» («Às ramas, às ramas», Fernanda Câncio, Diário de Notícias, 13.12.2013, p. 9).

      Fernando Campos, ou porque nasceu em Águas Santas ou porque foi professor, sabia: «Silêncio de almas assustadas, passos lentos, o inclinar de cabeças para o pó da terra, eis o acompanhamento e ritmo do derradeiro transe, a hora de os mortais caírem em si e sentirem, duro como rocha, o efémero percurso deste mundo» (O Lago Azul, Fernando Campos. Lisboa: Difel, 2007, p. 147).

 

  [Texto 3739]

«Reunir-se»

Toque a reunir

 

 

      «Para atingirem a meta de “derrubar” a prova, os professores ligados a este movimento reúnem hoje à tarde em Coimbra, nas cantinas azuis, perto da Praça da República» («Professores discutem hoje novo plano de ataque à prova», Pedro Sousa Tavares, Diário de Notícias, 27.12.2013, p. 15).

      Os professores reúnem o quê — já que o verbo é transitivo —, pedras para atacar a prova? Ou estará a frase incompleta?

 

  [Texto 3738]

«Local», outra vez

Um indígena inglês, digamos

 

 

      Ainda recentemente o vimos aqui. «Não param de entrar. Brancos, negros, velhos, novos, famílias com crianças de colo, bêbados (há um que insiste à porta em convencer alguém a pagar-lhe mais uma ginjinha) e sóbrios. E estrangeiros, claro. Um estrangeiro paga sempre uma ginjinha quando é cravado e o local paga-lhe com uma graçola num inglês arranhado» («Uma ginjinha, com ou sem?», Alexandra Prado Coelho, «2»/Público, 29.12.2013, p. 34).

 

  [Texto 3737]

Cadeias e redes

Chain?

 

 

      «Nessa era de expansão, na qual a rede de jornais de Hearst convertera-se em fator político indiscutível no cenário do país, era visível a suspeita pública crescente aos propósitos de Hearst» (Império de Palavras, Jacques A. Wainberg. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2003, 2.ª ed., p. 155).

      Talvez se use mais «cadeia de jornais», «cadeia de supermercados», mas será o mesmo? Uma das acepções de rede, no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, é «conjunto de pessoas, estabelecimentos ou organizações que trabalham comunicando entre si, sob uma direcção central». Parece ser o caso. A mesma acepção encontramos para cadeia no Aulete: «Conjunto de estabelecimentos, lojas etc. pertencentes a uma mesma empresa ou que atuam no mesmo ramo: cadeia de supermercados; cadeia de cinemas.» E talvez só no Aulete.

 

  [Texto 3736]

«Número dois»

Pode ir para os dicionários

 

 

  «E com o CDS, o partido mais à direita, também não houve naturalmente problemas – até porque o seu número dois era igualmente um católico praticante, membro do Opus Dei com voto de celibato: Adelino Amaro da Costa» (Política à Portuguesa, José António Saraiva. Cruz Quebrada: Oficina do Livro, 2007, p. 100).

 

  [Texto 3735]

«Écran/ecrã»

Por uma vez

 

 

      «Os portugueses já nem se devem lembrar dele: o homem nomeado como novo director de Informação da RTP é um jornalista quase desaparecido dos écrans de televisão» («Novo director de Informação da RTP suscita surpresa», Alexandra Campos, Público, 29.12.2013, p. 17).

    Julgava que só em França se continuava a escrever desta maneira. Curiosamente, é dos poucos casos em que o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora faz uma remissão para levar a sério: de écran para ecrã.

 

  [Texto 3734]

Ortografia: «brócolos»

Três oo, Ana Brito

 

 

      «Espinafres, alfaces, bróculos, nabiça. Um a um, Judite e Justina recheiam os sacos dos clientes que vão levantar as suas encomendas de hortícolas à loja de Comércio Justo das Picoas, em Lisboa. É assim todas as sextas-feiras a partir das 17h. Os vegetais foram colhidos no dia, no Brejo do Assa, Palmela, onde as produtoras do Prove – Promover e Vender, têm os seus terrenos» («Agricultura biológica vendida em cabazes, do produtor ao consumidor», Ana Brito, Público, 29.12.2013, p. 24).

 

  [Texto 3733]

Uma forma natural de escrever

Ficamos à espera

 

 

      «Os textos são naturalmente desiguais, e decerto que a autora não os teria publicado exactamente assim, mas em quase todos eles aparece uma dessas tiradas aforísticas que só Agustina poderia ter escrito. Podemos, por exemplo, torcer o nariz à aparente banalidade da sua crítica a Os Lusíadas, nos quais vê uma narrativa “pomposa e, no geral, fria” – Camões, sugere, ter-se-ia preocupado mais em agradar ao rei do que em ser fiel à verdade histórica –, mas depois atordoa-nos com a inesperada tirada final: “Não se deve exagerar em ser verdadeiro, excepto se nisso houver algo de inimitável.”» («Os pensamentos que Agustina esquecia pelas gavetas da casa», Luís Miguel Queirós, Público, 29.12.2013, p. 34).

      Montexto tem razão, isto é uma tolice. Não me fica mal dizer que Montexto tem quase sempre razão, pelo menos enquanto não se conseguir provar que eu sou Montexto, tarefa que Fernando Venâncio me garantiu conseguir levar a bom termo. Assim ele queira. Entretanto, deixo dois exemplos, um do lado de cá, outro do lado de lá do Atlântico.

      «Poupei muitas horas de sofrimento inútil e dediquei-as aos Lusíadas. De volta a casa, ao fim da tarde, mergulhava gostosamente nas páginas daquele livro grosso, de capa encarnada, e deliciava-me a ler, a interpretar, a dividir as orações, esse sim, um desafio e tanto, que afligia imensa gente e que eu adorava» (Tudo Tem o Seu Tempo, Ana Maria Magalhães. Lisboa: Editorial Caminho, 2012, p. 258). «Mas, deixemos a lírica camoniana e regressemos aos Lusíadas» (Utopia, Utopias, Beatriz Berrini. São Paulo: Educ, 1997, p. 99).

 

  [Texto 3732]

Língua portuguesa e ciência

Leiam na íntegra no Público

 

 

   «Publicar em inglês é, sem dúvida, uma das condições da internacionalização da investigação. Contudo, seria um erro reduzir a produção e a circulação de conhecimento científico a uma única língua veicular. Também o latim o foi durante séculos, acabando destronado pelo uso do vernáculo. Não há razão para crer que
os processos históricos de hegemonia e contra-hegemonia de tal ou tal língua na comunicação científica estejam encerrados. Pelo contrário, é plausível que a atual “correlação de forças” se altere num futuro mais ou menos próximo. [...] Designadamente em Portugal, uma política científica com visão estratégica não pode deixar de considerar
prioritária a valorização do português como língua científica internacional. Surpreendentemente, porém, a FCT descarta-o, e só considera de impacte “internacional” o que não é publicado em português. Como se se quisesse aplicar a Portugal o regime da Eslovénia ou da Finlândia onde todos têm de usar o inglês para serem lidos e citados além-fronteiras...» («Língua portuguesa e ciência», Mário Vieira de Carvalho, Público, 29.12.2013, p. 52).

 

  [Texto 3731]

São gralhas, senhores

A solução do provedor

 

 

      «Há um ponto que já notei sobre o qual alguns leitores são implacáveis: as gralhas. Num sentido amplo, a correcção da escrita, pois não se referem apenas a evidentes gralhas gráficas. Neste ponto, eu próprio já fui alvo de amáveis reparos. Um antigo profissional de revisão, hoje reformado, escreveu-me a lamentar que, não obstante o desenvolvimento técnico extraordinário na produção de um jornal, este campo da revisão esteja menos considerado. Efectivamente, o Livro de Estilo do PÚBLICO assume: “O processo de produção do PÚBLICO não consagra o revisor, nem permite fazer ‘passar’ todos os textos pelos copydesks.” Normalmente, os computadores dispõem de corrector ortográfico. Resta a quem escreve no PÚBLICO o alerta de que a este propósito “todo o cuidado é pouco”» («Reflexão e balanço», José Manuel Paquete de  Oliveira, Público, 29.12.2013, p. 55).

       Sim, é melhor, «num sentido amplo, a correcção da escrita», mas a simples desvalorização como gralhas dá bem a medida da preocupação. Mas não é grave, pois «normalmente, os computadores dispõem de corrector ortográfico».

 

  [Texto 3730]