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Linguagista

Tradução: «lemon curd»

Até mais comestível

 

 

      «A verdade é que os resultados variam. O lemon curd é um grande sucesso; o shortbread fica tão intragável que o enterramos em segredo; um soufflé de baunilha, para grande admiração, sai bem; ao passo que a galinha Maryland (devido, como depois concluí, à extrema frescura e à incrível idade das galinhas) fica tão rija que não lhe conseguimos meter o dente!» (Na Síria. Conta-me cá como Vives, Agatha Christie Mallowan. Tradução de Margarida Periquito. Lisboa: Tinta-da-China, 2010, p. 198).

      Vamos concentrar-nos somente no que está assinalado. Se traduzirmos, como já tenho visto, por «coalhada de limão», sabe igualmente bem. «Pão de tâmaras e banana, pão Sally Lunn carregado de fruta, tartes de frangipane, biscoitos de parkin e amêndoa com especiarias, bolo de coalhada de limão e natas frescas, jumbles de laranja e gengibre. E, antes do sorvete, torradas com anchovas e queijo de Leicester...» (Morte na Aldeia, Caroline Graham. Tradução de Mário Dias Correia. Alfragide: Asa II, 2013, p. 11). Enfim, em relação a esta tradução também podemos dizer que frangipane está aportuguesado em frangipana, o «pastel de nata de amêndoas pisadas, perfumado com almíscar e outros aromas», como se lê no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora. Aos jumbles, simples bolachinhas ou biscoitinhos doces em forma de anel ou de S, podia dar-se-lhes o nome de esses (acepção que falta naquele dicionário). Parkin é o bolo de farinha de aveia e melaço.

 

  [Texto 3815] 

Tradução: «arrondissement»

Pois sabem, mas

 

 

      «Ela pode aqui dispor dos fastos do Império Centro-Africano e do orçamento ilimitado para compras que lhe foi atribuído. Várias vezes por semana, a direção é Paris e o seu VIII Bairro, com um só desejo a satisfazer, o do luxo francês» (Mulheres de Ditadores, Diane Ducret. Tradução de Oscar Mascarenhas. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2011, p. 194).

     Claro que é facílimo traduzir «arrondissement», ora essa. O problema é que, quando se refere aos bairros numerados de Paris, normalmente os tradutores preferem manter no original, vá-se lá saber porquê: 16e arrondissement, 14e arrondissement... Oscar Mascarenhas, honra lhe seja, não caiu nessa patetice.

 

  [Texto 3814]

Léxico: «vermelho-tijolo»

Ora, não custa nada

 

 

      «O rosto vermelho-tijolo, o grande bigode castanho, os olhos azuis, o aspecto feroz e marcial!» (Na Síria. Conta-me cá como Vives, Agatha Christie Mallowan. Tradução de Margarida Periquito. Lisboa: Tinta-da-China, 2010, p. 120).

    Não estava, até ontem, no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora; agora, depois da minha sugestão para o incluírem, já lá o podemos ver.

 

  [Texto 3813]

Léxico: «verde-limão»

Todas as cores

 

 

   «O dia amanhecera com uma bruma que o chefe dos jardineiros anunciara, qual profeta, que era presságio de temperaturas quentes, e as árvores, que tinham perdido os primeiros rebentos macios de folhas verde-lima da primavera, exibiam agora uma folhagem luxuriante, enquanto os canteiros de flores estivais e o rio cintilante se aliavam numa celebração viva da beleza e da plenitude» (Morte em Pemberley, P. D. James. Tradução de Tânia Ganho. Porto: Porto Editora, 2013, pp. 291-92).

  Apesar de já se verem limas em todos os hipermercados e até em supermercados, sugeri o vocábulo «verde-limão» ao Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, onde já o podemos ver.

 

  [Texto 3812]

Vários «golpes»

Autênticas facadas

 

 

      «Golpe de mar aconteceu pouco depois das 16h [sic] de ontem na zona da Foz. Mar também causou problemas na Caparica e Praia Grande» («Duas ondas varrem carros e ferem quatro pessoas», Público, 7.01.2014, p. 23).

      Foi uma edição em que se viram mais golpes, todos galicismos: «golpe de génio» (p. 6), «golpe de asa» (p. 9), «golpes militares» (p. 31), «golpe de Estado» (p. 33).

 

  [Texto 3811]

«Borda d’Água»

Falsificam tudo

 

 

      «O Borda d’Água continua a ter algumas marcas da sua identidade. É impresso numa tipografia tradicional que conserva as mesmas máquinas e o mesmo espaço (na Rua da Alegria) desde o início da década de 1930 — o primeiro espaço da editora no Bairro Alto mantém-se mas a funcionar como livraria. Há também 85 anos que na primeira página aparece o “senhor da meteorologia”, um boneco vestido de fraque, com uma cartola na cabeça, um jornal e um guarda-chuva debaixo do braço. Aparece também a ferradura vermelha, com o “M” de Minerva, por cima da cartola e que serve para dar sorte para o ano. As páginas ainda vêm coladas em cima e de lado: a impressão é feita em folhas grandes, que são depois dobradas nas máquinas antigas. Essa foi, aliás, uma das formas de distinguir os almanaques originais dos falsificados que, por serem fotocopiados, vinham já com as folhas abertas. “Durante um tempo, os falsos eram vendidos com a ferradura preta e por aí dava para perceber. Depois passaram a fazê-los também com a ferradura vermelha”, explica a responsável da editora» («O almanaque que prevê o tempo há 85 anos», Raquel Albuquerque, «2»/Público, p. 2).

      Não sabia que se falsificava o Borda d’Água. Setenta mil por ano, ao que parece. Impressionante. As páginas, contudo, não vêm coladas, cara Raquel Albuquerque, vêm por abrir.

 

  [Texto 3809]

Hammam/hamã/amã

Um estranho caso

 

 

      Querem ver que só Malba Tahan, autor brasileiro, ao que me parece, desconhecido em Portugal, é que usou a palavra aportuguesada? «Depois de ter visitado, demoradamente, o templo, resolvi ir ao hamã que se ergue na praça da Sultana Fátima» (A Sombra do Arco-Íris, vol. 3, Malba Tahan. Rio de Janeiro: Edições Conquista, 1961, p. 503). Mas não se lê em alguns dicionários que o aportuguesamento é «amã»? Na página 62 do Vocabulário da Língua Portuguesa, de Rebelo Gonçalves, é isso mesmo que se lê: amã. Um pouco estranha, esta perda do h. Igualmente do árabe, temos, por exemplo, «hena», cujo étimo é hinna. Contudo, vejo que também está — em todas as acepções, como «perdão», «banho público ou privado», etc. — no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras.

 

  [Texto 3808]

Tradução: «well-digger»

Relembre-se

 

 

      «Tivemos um cavador de poços local a trabalhar ali, mas a água nas proximidades do montículo revelou-se demasiado salobra para beber» (Na Síria. Conta-me cá como Vives, Agatha Christie Mallowan. Tradução de Margarida Periquito. Lisboa: Tinta-da-China, 2010, p. 189).

      Não está mal, mas, como já afirmei aqui, em qualquer circunstância, é melhor uma palavra do que uma locução, e well-digger pode ser traduzido por «poceiro».

 

  [Texto 3807]