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Linguagista

Tradução: «lopsided smile»

Um mundo à parte

 

 

      «Jim Schwebach com o seu sorriso assimétrico, como se soubesse algo que ninguém sabia» (O Voo das Águias, Ken Follett. Tradução de Isabel Nunes e Helena Sobral. Queluz de Baixo: Editorial Presença, 2013, 3.ª ed., p. 137).

      Creio que é das tais coisas que só existem nas traduções. Na literatura portuguesa, há sorrisos tortos, sorrisos de esguelha, sorrisos oblíquos...

 

  [Texto 3945]

Tradução: «mostly»

Basicamente, é assim

 

 

      Vem uma personagem e pergunta a outra o que está a fazer. «A reservar bilhetes de avião, basicamente» (O Voo das Águias, Ken Follett. Tradução de Isabel Nunes e Helena Sobral. Queluz de Baixo: Editorial Presença, 2013, 3.ª ed., p. 127). No original: «Making plane reservations, mostly.» «Basicamente». Parece um futebolista sul-americano a responder. Nada de tiradas xenófobas: parece um futebolista português.

 

  [Texto 3944]

Tradução: «cotton broker»

Bacharéis e corretores

 

 

      «O pai, Gabriel Ross Perot, fora corretor de algodão» (O Voo das Águias, Ken Follett. Tradução de Isabel Nunes e Helena Sobral. Queluz de Baixo: Editorial Presença, 2013, 3.ª ed., p. 112).

    Parece que há muitos no Brasil; nós é que não temos disso. É uma acepção menos conhecida do vocábulo «corretor»: mediador entre um comprador e um vendedor que recebe uma comissão (designada corretagem) pelos serviços prestados. Uma que não tem nada que ver com esta, e mais rara que «occisar» e mesmo «escol», é corretã, que é outro nome para roldana. «O bacharel podia ter uma agonia mais suave, se não discutisse. Pedro Serrão fora mais discreto na sua estóica impassibilidade. Morrer por morrer, antes estrangulado pela corretã do carrasco do que pela fumarada dos toros embreados» (Páginas quase Esquecidas, vol. 2, Camilo Castelo Branco. Porto: Editorial Inova, s/d, p. 189).

 

  [Texto 3943]

Regência de «repúdio»

E se lesse um pouco?

 

 

      «Repúdio pelo diferente», escreve aqui o autor, que rejeitou a minha emenda. Está errado. «Desta incompatibilidade nasce o desentendimento com o advogado, o crescente isolamento final e, concomitantemente, com o total repúdio do mundo dos outros e dos valores que eles encarnam, uma progressiva e profunda identificação consigo mesmo» (A Felicidade em Albert Camus, Marcello Duarte Mathias. Alfragide: Publicações Dom Quixote, 2013, 3.ª ed., p. 193).

 

  [Texto 3942]

Sobre: «elite»

Gente de eleição

 

 

      «Élite. Francesismo dos mais vulgarizados, até com pronúncia esdrúxula e aberta! E nós em português possuímos vários termos que lhe correspondem perfeitamente: escol, boa sociedade, alta roda, a gente fina, a aristocracia; nata, flor, fina flor; beijinho. E note-se que escolhida “élite” é disparate equivalente a escolhida escolhida.// Classes d’élite serão em português — classes superiores.// Les gents d’élite, na nossa língua — gente de eleição» (Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português, vol. 1, Vasco Botelho de Amaral. Lisboa: Centro Internacional de Línguas, 1958, p. 1268.).

 

  [Texto 3941]

Léxico: «entorrinal»/«rinal»

Sulco rinal

 

 

      «Quanto ao facto de o hipocampo não ter sido totalmente removido, esse resultado é “potencialmente muito significativo”, afirmam. “Durante décadas, pensou-se que a principal área lesionada responsável pela amnésia de H.M. era o hipocampo”, explica [Jacopo] Annese. “Porém, os novos resultados mostram que uma porção substancial do hipocampo de H.M. poderá ter sido poupada pela operação. E que, pelo contrário, o córtex entorinal, placa giratória de toda a informação que entra no hipocampo, foi quase totalmente destruído. Isso sugere que o córtex entorinal poderá ser mais importante para os défices de memória de H.M. do que se pensava. Aliás, é essa mesma região que parece ser a mais fortemente afectada durante as fases mais precoces da Alzheimer.”» («Cérebro de doente famoso dá novas pistas sobre a memória humana», Ana Gerschenfeld, Público, 29.01.2014, p. 27).

      Entorrinal. Percebe-se logo, pois claro. Contudo, não apenas este não está nos dicionários mais consultados (ah, sim, já confirmei no Aulete e no Houaiss), como também o adjectivo rinal não está dicionarizado. Esperem: «rinal» está no Grande Dicionário da Língua Portuguesa (Lisboa: Amigos do Livro, Editores, 1981, tomo X, p. 376), coordenado por José Pedro Machado.

 

  [Texto 3940]

Tradução: «lapwing»

São penas, senhores

 

 

      «E esta... conhecê-la-ia entre mil... é de abibe. [...] O Heathcliff pusera lá uma armadilha e os pais não se atreveram a voltar. Depois disso, intimei-o a não matar mais nenhum pavoncino, e ele não obedeceu» (O Monte dos Vendavais, Emily Brontë. Tradução de Maria Franco e Cabral do Nascimento. Lisboa: Portugália Editora, 1965, p. 122).

      No original, o correspondente a «abibe» é lapwing; o correspondente a «pavoncino» é... lapwing. De facto, lapwing é o nosso abibe, pavoncinho, pavoncino, verdizela, abitoninha, aventoinha, galispo, entre outros nomes que tem entre nós. Mas reparem: é na fala da mesma personagem que surgem os dois nomes da mesma ave, variação que não tem correspondência no original. A meu ver, nada justifica esta opção dos tradutores. (Ah, sim: «pavoncino» veio do castelhano.) 

 

  [Texto 3939]