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Linguagista

Tradução: «senior diplomat»

Só para reflectirmos

 

 

      «Como seu emissário junto do aiatola, Vance nomeara Theodore H. Eliot, um diplomata sénior, que havia sido conselheiro económico em Teerão e falava persa fluentemente» (O Voo das Águias, Ken Follett. Tradução de Isabel Nunes e Helena Sobral. Queluz de Baixo: Editorial Presença, 2013, 3.ª ed., p. 166).

      Na última década e meia, começou, por influência anglo-saxónica, a usar-se muito entre nós, mas não deixa de ser algo pretensioso e estranho. Apesar do latim. Não sei se «diplomata de alto nível» ou «alto diplomata», como por vezes se ouve e lê, não será melhor. Ou, apesar da subjectividade inerente, «diplomata experiente» (que, sem mais, corresponderia ao inglês practiced diplomat).

      Quanto a «persa» («Farsi» no original), em parte a opção ficará a dever-se a não estar registado em todos os dicionários o termo «parse» (ou «pársi»), ou pelo menos a acepção em causa. Para o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, é somente o «indivíduo pertencente ao grupo humano dos Parses» e o «partidário da doutrina de Zoroastres seguida pelos Parses». Da língua, nada. O Houaiss, porém, regista-a.

 

[Texto 3954] 

Ortografia: «déjà-vu»

Vieram de França

 

 

   «Os discursos do Estado da União de Barack Obama parecem déjà vus nos quais o Presidente todos os anos reanuncia objectivos políticos que vinham de trás. Desta vez, o inquilino da Casa Branca desafiou o Congresso[,] que tem bloqueado as suas políticas de forma mais brutal do que no passado. Estamos em ano eleitoral e Obama sabe que o boicote republicano continuará. A única novidade é o contexto do discurso» («O déjà vu de Obama», editorial, Público, 30.01.2014, p. 27).

    Talvez se leia geralmente grafado sem hífen, mas tanto o Houaiss como o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora registam-no com hífen, até porque aparece como substantivo, ao contrário, por exemplo, de déjà vécu, locução. E depois há isto e o contrário: jamais vu, jamais vécu, jamais entendu...

 

  [Texto 3953]

«O expoente máximo»

O dux de Coimbra

 

 

     No noticiário das 9 da manhã na Antena 1, foi entrevistado o «dux de Coimbra», «o expoente máximo pela praxe académica». Assim mesmo: «o dux de Coimbra»! Assim mesmo: «o expoente máximo pela praxe académica». E o repórter Joaquim Reis «viajou até às origens da praxe na Universidade de Coimbra», mas eu, que tinha embarcado, apeei-me e fui tomar o pequeno-almoço.

 

 

[Texto 3951]

Estrangeiro é melhor

Niccolò! Niccolò!

 

 

      No Público de hoje: «“A ambição do homem é tão grande que, para satisfazer uma vontade presente, não pensa no mal que daí a algum tempo pode resultar dela” Niccolò Maquiavel (1469-1527), filósofo e político italiano». Até recentemente, ainda era Nicolau Maquiavel. Como eram os Médicis. Agora, os BL tomaram conta disto tudo.

 

 

[Texto 3950]

Tradução: «brunch»

Problema deles

 

 

      «A outra coisa que tinham em comum era que todos pertenciam à Catequese do Póquer da Igreja Católica Romana de Teerão, que funcionava durante o brunch de domingo» (O Voo das Águias, Ken Follett. Tradução de Isabel Nunes e Helena Sobral. Queluz de Baixo: Editorial Presença, 2013, 3.ª ed., p. 151).

     Intraduzível também, c’um caraças? Não são poucos os tradutores que vertem para «pequeno-almoço tardio». Eles e eu não desconhecemos que também há late breakfast. Quem souber fazer melhor, fale agora ou cale-se para sempre.

 

[Texto 3949]

Tradução: «standard procedure»

Os basbaques da língua

 

 

      «O procedimento standard era simular a paragem do motor» (O Voo das Águias, Ken Follett. Tradução de Isabel Nunes e Helena Sobral. Queluz de Baixo: Editorial Presença, 2013, 3.ª ed., 138).

      Como se fosse necessário o «standard». Enfim. Standard procedure. Um tradutor olha para isto e parece insuperável, intraduzível. Francamente. No caso, «procedimento recomendado» chega muito bem para o traduzir. Aliás, recorrem ao estrangeirismo não apenas tradutores, mas autores de língua portuguesa. São como dois partidos nada rivais: os basbaques da língua (BL) e os maluquinhos da língua (ML).

 

[Texto 3948]

«Meia-hora»/«meia hora»

Paletes de hífenes

 

 

      «Bastou de facto mergulhar os linfócitos durante cerca de meia-hora na solução para se constatar que, passados uns dias, uma substancial proporção das células iniciais tinha sobrevivido e regressado à estaca zero do desenvolvimento, formando pequenos aglomerados esféricos, lê-se na Nature» («Nova técnica cria células capazes de originar todos os tecidos do corpo», Ana Gerschenfeld, Público, 30.01.2014, p. 27).

     Com hífen, Ana Gerschenfeld? Também existe: são as doze horas e trinta minutos (no relógio). Não deve passar uma semana que não veja este erro.

 

  [Texto 3947] 

A importância da língua

É o mínimo, não é?

 

 

      «Para Germano de Almeida, conferencista transformado em contador de histórias para explicar que a língua portuguesa lhe é tão importante que chegou a acabar um namoro porque alguém lhe escreveu num papel “penço em ti” — “Como poderia eu continuara [sic] a namorar uma mulher que escrevia ‘penso’ com ç?” —, o português é uma “ponte entre culturas”. Admitindo que o usa para escrever porque lhe é natural fazê-lo e lhe permite chegar a uma audiência mais vasta, o autor continua a defender o crioulo como “língua de intimidade”, feita para “trazer no dia-a-dia”: “O cabo-verdiano namora em crioulo. Não [lhe] passa pela cabeça dizer ‘amo-te’ a uma mulher. ‘Amo-te’ é uma palavra violenta.”» («É na canção brasileira que melhor se vê a líbido da língua portuguesa», Lucinda Canelas, Público, 30.01.2014, p. 30).

 

 

  [Texto 3946]