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Linguagista

Pronúncia: «perda»

Mais colapsos

 

    «Ulrich não concorda com a resolução do BES e espera que as autoridades tenham imposto um limite para eventuais perdas com a venda do Novo Banco» («Ulrich discorda com [sic] solução encontrada para o colapso do GES», Pedro Valador, Jornal da Tarde, 17.03.2015). Para o jornalista, são /pérdas/, porque não tem notícia de que a pronúncia habitual na norma culta* é /pêrda/; para o banqueiro, são «percas». «Perca» é a forma popular e, como já uma vez escrevi, para mim, percas só as do Nilo (Lates niloticus).

 

[Texto 5669]

 

      * Espantoso: fui verificar, e o politicamente correcto ainda deixa que nos exprimamos desta maneira.

«Invasões Francesas»

Mesmo nada

 

      «Primeiro é preciso imaginar o Portugal das invasões francesas, uma viagem pelas estradas que separavam Lisboa da Batalha no Verão de 1808, um militar culto que viria a dirigir o Louvre e um artista viajado que sentia saudades de Roma. Onde andará a Virgem com o Menino que o pintor Domingos Sequeira mostrou ao conde de Forbin, militar ao serviço de Junot, quando visitavam o Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha?» («Este desenho pode guardar uma pintura perdida de Van der Weyden», Lucinda Canelas, Público, 18.03.2015, p. 28).

      E não se escreve sempre, acaso, Invasões Francesas, com maiúsculas iniciais, por se tratar de um acontecimento histórico? Usa-se habitualmente a maiúscula inicial na designação de factos históricos ou acontecimentos importantes e actos ou empreendimentos públicos: Descobrimentos, Guerra Peninsular, Reforma, Renascimento, Restauração, Invasões Francesas, Segunda Guerra Mundial, Concordata, Guerra Fria, etc. Para quê subverter tudo?

 

[Texto 5668]

«Século de Ouro»

E, contudo, nada mudou

 

      «Este convento do Bairro das Letras — assim chamado porque por ali andaram Cervantes e outras grandes figuras da literatura do século de ouro espanhol, como os poetas e dramaturgos Lope de Vega e Calderón de la Barca — poderá vir a transformar-se num dos principais pontos turísticos de Madrid, acredita a presidente da câmara» («Localização do túmulo de Cervantes é já “mais do que uma hipótese”», Lucinda Canelas, Público, 18.03.2015, p. 30).

      E não se escreve sempre, acaso, Século de Ouro, com maiúsculas iniciais, por se tratar de um período histórico? É impressionante. São capazes de escrever «ex-Presidente do Haiti», mas quando é necessário usar a maiúscula, não o fazem.

 

[Texto 5667]

«Dois Rembrandts»

Não somos diferentes

 

      «A polémica estalou em França. A família Rothschild vai vender duas importantes obras de Rembrandt e o Estado francês não vai evitar a sua saída do país. Alguns especialistas esperavam que as obras fossem classificadas como tesouro nacional para dar tempo para serem compradas. Família quer vender as obras por 150 milhões de euros» («França deixa sair dois Rembrandt», Cláudia Carvalho, Público, 18.03.2015, p. 29).

     Ora querem ver que só em português é que não há concordância? «L’ouvrage d’un artiste peut porter son nom : un Rembrandt. Si je suis assez riche pour en avoir deux, je pourrai m’enorgueillir de “ mes deux Rembrandts ”» (30 fiches pour réussir les épreuves de français, Jean-François Guédon e Jean-Pierre Colin. Paris: Eyrolles, 2009, p. 39). Isto apesar de, em francês, tender para a invariabilidade. «A pesar de que los lienzos pertenecen a una colección privada, la publicación (fundada en 2003 y accesible solo en su versión digital www.latribunedelart.com) lamenta que el Louvre no haya peleado por los rembrandts» («Polémica en Francia por el futuro de dos retratos de Rembrandt», Isabel Ferrer, El País, 17.03.2015, edição em linha). Este não se presta a isso, mas também em italiano se usa o plural «per indicare due o più opere d’arte riconducibili a un unico artista: due meravigliosi Tintoretti». Em inglês é como sabemos.

 

[Texto 5666]

Tradução: «reducción»

Só se for para despachar

 

    Foram encontrados em Madrid, na igreja do Convento das Trinitárias Descalças, restos mortais que podem ser de Cervantes. No Telejornal, mostraram um excerto de uma conferência de imprensa em que falava a arqueóloga responsável, Almudena García Rubio: «Face a toda a informação obtida, de caráter histórico, arqueológico e antropológico, pode considerar-se que entre os fragmentos deste achado, há alguns que pertencem a Miguel de Cervantes» (Mário Rui Cardoso, Telejornal, 17.03.2015). Isto é o que estava nas legendas, porque — como sempre — o que ouvi é um pouco diferente: «À la vista de toda la información generada de carácter histórico, arqueológico y antropológico, es posible considerar que entre los fragmentos de esa reducción se encuentren algunos pertenecientes a Miguel de Cervantes.»

    Traduzir reducción por «achado» é uma forma, supostamente expedita, mas claramente grosseira e imprecisa, de resolver a questão. Os regulamentos dos nossos cemitérios municipais nada dizem sobre isto, mas queiram ler este documento (pp. 139-42), sobre o processo de redução de restos mortais.

 

[Texto 5665]