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Linguagista

«Andar em Direito»

Idiotismo não é para idiotas

 

      «Essa opinião nem parece sua, uma pessoa que andou em Direito», disse-lhe, embora parecesse mesmo dela. «Eu não andei em Direito; eu tirei Direito.» Já que diz que o marido, que nunca ninguém viu mais gordo, é italiano, expliquemo-lo nessa língua: rigare diritto (andar direito), sempre diritto (a direito), studiare legge (estudar Direito, andar em Direito). E agora temos de a fazer andar direita, far rigare diritto: «E tirou-o a quem?»

    «Agora ouve, lembra-te de que eu ando em Direito. Ainda não percebeste que, como os nossos pais casaram com comunhão de bens, metade do pouco que ficou já é da mãe e só a outra metade pode ser dividida? Quanto é que recebias no fim, depois de pagar ao advogado?» (Navegador Solitário, João Aguiar. Porto: Edições Asa, 1996, p. 333).

 

[Texto 6017]

Regência do verbo «preferir»

Preferia cortar um braço

 

      «O facto de Tsipras já ter dado a entender que se demitiria se vencesse o “sim”, e 
de o ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, ter assegurado que faria o mesmo de um modo directo (“Preferia cortar um braço do que aceitar um mau acordo”, disse), fazem com que esta pergunta tenha outra consequência: quem vota “sim” sabe que deverá estar
 a reeleger Samaras para primeiro-ministro em eleições que seriam marcadas dentro de 30 dias» («Na batalha do “oxi” e do “nai” joga-se o futuro da Grécia», Maria João Guimarães, Público, 3.07.2015, p. 2).

   Esta também é uma batalha perdida, pois se até jornalistas, que deviam ter mais consciência linguística, escrevem desta maneira, no dia-a-dia é o descalabro. O verbo preferir exige dois complementos, um sem preposição e o outro com a preposição a: «Preferia cortar um braço a aceitar um mau acordo.»

 

[Texto 6016]

Ai os pronomes...

Opiniões fortes, mas erradas

 

       Voltemos aos alunos de Nabokov. «Tinham de conhecer o mapa de Dublim do Ulisses. Acredito no realçar do pormenor específico; as ideias gerais podem tomar conta delas próprias» (Opiniões Fortes,Vladimir Nabokov. Tradução de Carlos Leite. Lisboa: Relógio D’Água, 2015, p. 67).

   Pormenor específico que escapou ao tradutor e ao revisor, que incorreram assim em gravíssimo solecismo, dos mais descaracterizadores da língua: a troca de pronomes. «Ideias gerais» é sujeito — logo, dir-se-á correctamente «podem tomar conta de si próprias». Vamos lá ver se em próxima edição a obra é limpa destas nódoas.

 

[Texto 6015]