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Linguagista

«O Spínola, o Camões...»

Vamos a eles!

 

      «Foi assim, aos gritos, que o Spínola entrou pelo gabinete, anunciando a mensagem que acabara de chegar» (Até ao Fim — a Última Operação, António Vasconcelos Raposo. Lisboa: Sextante Editora, 2011, p. 11).

      O Spínola, o Camões, o Helder Guégués... Se nem sequer nas editoras têm já sensibilidade para estas questões, valerá a pena perder tempo?

 

[Texto 6025]

Léxico: «monopartidarismo»

Faz-me espécie

 

      «Em 40 anos, Cabo Verde contou com quatro presidentes — Aristides Pereira (1975-91), António Mascarenhas Monteiro (1991-2001), Pedro Pires (2001-11) e Jorge Carlos Fonseca (desde 2011) —, facto quase único em África, sobretudo porque, apesar dos 16 anos de monopartidarismo inicial, prevaleceu a democracia e a estabilidade, permitindo que todos cumprissem os mandatos de cinco anos» («Cabo Verde é modelo de democracia e boa governação em África», José Sousa Dias, Diário de Notícias, 4.07.2015, p. 27).

  Ora cá temos mais uma incoerência inominável no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora: regista «multipartidarismo» e até «monopartidário», mas não «monopartidarismo». Até parece feito ao sabor do acaso.

 

[Texto 6024]

Opiniões sobre o AO90

Alguns equívocos, ou como engenheiros

 

      «Respeita o Acordo Ortográfico ou é um resistente?», perguntam, na entrevista ao Expresso, ao revisor Manuel Monteiro. «Por razões muito longas de explicar, sou um resistente. Não aceito que “falámos”, “pára”, “pêlo” possam perder o acento; que “cor-de-laranja” perca os hífenes, mas “cor-de-rosa” não; que beber um copinho de leite seja o mesmo que uma pessoa que é um copinho-de-leite (com o Acordo de 1990, perde os hífenes)» (in Expresso).

      Três ou quatro notas. (Nota 0: não sei como pode um revisor, na sua vida profissional, resistir ao Acordo Ortográfico de 1990. Eu faço o máximo, desaconselho a adopção da nova ortografia, e mesmo isso é uma gota de água, ou nada.) Primeira: se o uso do acento agudo na primeira pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo dos verbos da primeira conjugação é facultativo (e pese embora as facultatividades serem uma péssima ideia), não estou a ver qual é o problema. Segunda: embora haja incoerência na grafia das cores, «cor-de-laranja» nunca foi hifenizado*. Terceira: há muito que defendo essa diferenciação entre sentido denotativo e sentido conotativo, mas é óbvio que a formulação é infeliz. Não é «beber um copinho de leite» que se confunde agora, com o Acordo Ortográfico de 1990, com «copinho-de-leite», mas o próprio «copinho de leite» com «copinho-de-leite», porque ambas as acepções passaram a escrever-se sem hífenes. Os revisores — toda a gente, mas especialmente os revisores — têm de ser rigorosos como engenheiros, ou a obra cai.

 

[Texto 6023]

 

     * É impressão minha ou a lista com exemplos de compostos consagrados pelo uso, com hífen, no sítio da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, vai crescendo?

Regência verbal: «aportar»

Bravo estrago

 

      «Mais de cinco séculos depois de os navegadores portugueses Diogo Cão (1485) e Bartolomeu Dias (1487) terem aportado em Walvis Bay, naquela que é hoje a principal cidade portuária do país, Namíbia e Portugal querem voltar a descobrir-se» («Empresas do Norte são exemplo que Namíbia quer aproveitar», Sérgio Pires, Diário de Notícias, 4.07.2015, p. 19).

   Sérgio Pires: «terem aportado a Walvis Bay». A regência deste verbo é dupla: aportar e aportar a. «Àquela ilha aportámos que tomou/O nome do guerreiro Santiago,/Santo que os Espanhóis tanto ajudou/fazerem nos Mouros bravo estrago» (Os Lusíadas, Canto V, 9). «Passaram-se quase dois anos desde que empreendi esta tarefa, trazer até mim o que me fora dado viver em terras de França, mais propriamente em Paris, há quase vinte anos, já que aí aportei em sessenta e nove e estamos agora em noventa» (Palingenesia ou o Estado e o Processo do Romance, Silva Carvalho. Lisboa: Fenda, 1999, p. 234).

 

[Texto 6022]

Apassivante, sim, mas...

Apanhados

 

      «Para facilitar este processo, retira-se, ao acaso, alguns exemplos de produções escritas, lêem-se e definem-se os pontos da escala.» Incoerências destas encontram-se todos os dias, a toda a hora. Como é: lêem-se e definem-se — mas retira-se? Pelo visto/pelos vistos, não. Pensem nisto.

 

[Texto 6021]