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Linguagista

O tempo e o modo

E ainda querem decidir por ele

 

    «Recordemos o caso de Eça de Queiroz, que mandava para a tipografia um manuscrito final tão pouco claro que era o tipógrafo quem decidia o tempo e o modo dos verbos, o número e o género dos adjectivos. É certo que, sobre as primeiras provas, Eça procedia a revisões laboriosíssimas, quase parecendo que então é que escrevia o texto» (Editar Pessoa, vol. 1, Ivo Castro. Lisboa: INCM, 2.ª ed., 2013, p. 72).

 

[Texto 6062]

A gramática do insulto

De fidalgo a fideputa

 

      «“Tira a minha mulher da equação ou vou-te aos cornos”, dizia um dos sms enviados pelo marido de Maria Luís Albuquerque ao antigo colega. “Tu não sabes quem eu sou. Metes a minha mulher ao barulho e podes ter a certeza que vais parar ao hospital”, podia ler-se noutro. Mas não ficou por aqui. “Vai para o caralho cabrão” e “Vai para o caralho seu merdas” são outras das injúrias que deram origem ao processo aberto pelo Departamento de Investigação e Acção Penal, depois de o jornalista Filipe Alves ter apresentado queixa. “Reafirmo, tu e o teu director são uns cabrões fdp”, escreveu também António Albuquerque, que neste momento não presta declarações sobre o assunto. O mesmo sucede com a sua advogada, Carla Alves Ferreira» («Marido da ministra das Finanças arguido por ameaçar jornalista», Ana Henriques, Público, 17.07.2015, p. 8).

      Não é um homem inteligente, essa a primeira conclusão. Segunda: não podia ser condenado apenas por aquele «fdp»*. Terceira: não domina a pontuação e, logo, a gramática. Falta a vírgula antes dos vocativos: «Vai para o caralho, cabrão.» «Vai para o caralho, seu merdas.» E, Ana Henriques, pode dizer-nos porque escreve sms e não SMS?

 

[Texto 6061]

 

* Diz-se filho (ou filha) de (ou da e duma) puta. Como já outros viram, há muito (e outros agora não querem ver), a ausência ou o aparecimento dos artigos a, uma denotam graduação da intensidade ofensiva. Em Gil Vicente, «fideputa», que se formou como «fidalgo».

 

«Adictivo», de novo

Um nome avariado

 

      «“Isto aqui é tudo gente calma”, garante um guarda ao lado de António, enquanto Legend assistia a uma pequena palestra com João Goulão, o director-geral do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Adictivos e nas Dependências. “Todos os reclusos com quem falei voluntariaram-se para um programa de reabilitação das drogas. Foi bom ouvir a perspectiva deles, as razões por que quiseram mudar as vidas deles e como este programa os está a ajudar”, contou o músico» («John Legend esteve na prisão e diz que os EUA têm “muito que aprender”», Pedro Sales Dias, Público, 14.07.2015, p. 51).

      Adicção, adictivo, adictício — muito bem. Foi por sugestão minha, lembrar-se-ão, que o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora passasse a registar «adicção». Esqueceram-se foi de «adictivo». Um dia darão conta do caso. Claro que, na realidade, por ser de vistas curtas quem está à frente destes organismos, o nome é Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências.

 

[Texto 6060]