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Linguagista

«Entre 30 % e 40 %»

Levaria o mesmo tempo

 

      «Entre 30% a 40% do consumo das famílias europeias é influenciado pelas crianças». É a legenda a uma imagem na página 6 da edição de ontem do Público. Vê-se, já trouxe para aqui alguns casos, até em livros revistos. Trata-se de uma bagatela gramatical, certamente, mas veja-se como tanta gente erra. Porque será? A preposição entre exige aqui a conjunção e: «Entre 30 % e 40 % do consumo das famílias europeias é influenciado pelas crianças.»

 

[Texto 6133]

Ortografia: «Estado-membro»

Desnorte completo

 

      «E têm sido guerras e o colapso de Estados e suas economias a levar o desespero a Lampedusa e Calais. Preferimos muros e arame farpado a rotas legais e orientadas por todos para impedir que as máfias lucrem com a desgraça alheia. Preferimos gastar milhões a patrulhar roteiros de quem foge à morte, a partilhar entre Estados membros uma integração excecional, chamando-lhes “praga”, atiçando os cães e engrossando o arame» («Batemos no fundo», Bernardo Pires de Lima, Diário de Notícias, 4.08.2015, p. 36).

    Não é, eu sei, jornalista, mas os jornalistas do Diário de Notícias escrevem da mesma maneira. Depois do Acordo Ortográfico de 1990, passaram a escrever «Estado membro» assim, sem hífen. Por que bulas o fazem, diacho? E lá está a mentira da «praga».

 

[Texto 6132]

E chamam-lhe «Eurotúnel»?

Muito estranho

 

    «Nas últimas semanas, têm sido várias as tentativas de milhares de migrantes para atravessarem o túnel sob o canal da Mancha, desde Calais (Norte de França) para o Reino Unido. Nove já perderam a vida a tentar fazer a viagem. Só na noite de domingo para segunda-feira, as autoridades francesas conseguiram impedir 1700 pessoas de tentar cruzar o Eurotúnel» («Ilegais vão de Kent para Londres em táxis pagos pelos contribuintes», Susana Salvador, Diário de Notícias, 4.08.2015, p. 36).

    É apenas uma dúvida: faz sentido escrever-se «Eurotúnel», assim, com maiúscula inicial? Não me parece. A empresa concessionária, isso já sabemos, chama-se Eurotunnel. Mas a infra-estrutura é um «eurotúnel»? No Público, salvo erro, nunca usaram tal designação.

 

[Texto 6131]

Expressão: «à custa de»

Quando aprendemos?

 

   «Já no domingo o The Mail on Sunday revelava que, por os seis centros de acolhimento que existem estarem cheios, os requerentes de asilo estão a ser alojados às custas dos contribuintes em hotéis onde os quartos custam 70 libras (100 euros) a noite, com direito a três refeições diárias e 35 libras (50 euros) de semanada. Um artigo que só aumenta a retórica anti-imigração que se ouve no Reino Unido, onde o próprio primeiro-ministro, David Cameron, se referiu aos migrantes como uma “praga”» («Ilegais vão de Kent para Londres em táxis pagos pelos contribuintes», Susana Salvador, Diário de Notícias, 4.08.2015, p. 36).

   Não terá sido a Susana Salvador que eu já disse que a locução prepositiva se escreve à custa de, e não como o fez? No plural, custas, é termo usado apenas no âmbito jurídico.

 

[Texto 6130]

Léxico: «drilodefensina»

Alguém tem de ser o primeiro

 

      «Até agora, os cientistas não sabiam como se fazia essa digestão. As árvores têm polifenóis, moléculas complexas que tornam as folhas difíceis de digerir para os herbívoros que andam à procura das proteínas nas folhas. Mas as minhocas encontraram uma forma de bloquear estes polifenóis. Uma equipa de cientistas descobriu que produzem no tracto digestivo substâncias chamadas “drilodefensinas”, que anulam a acção dos polifenóis, permitindo a digestão das proteínas das folhas» («As minhocas têm moléculas que nos impedem de ficar atulhados em folhas», Nicolau Ferreira, Público, 5.08.2015, p. 32).

    De facto, neste estudo, publicado na revista Nature Communications, usa-se o termo inglês drilodefensin, e claro que o jornalista fez bem em adaptá-lo ao português. (Mas não volte a escrever «equipa liderada» por não sei quem, Nicolau Ferreira. Há formas legitimamente portuguesas, e variadas, de o dizer: coordenada, encabeçada, dirigida... Há dias, no blogue Horas Extraordinárias, Maria do Rosário Pedreira aludia a um «estudo capitaneado por um professor da Universidade de Chicago». Não seria a minha primeira escolha, mas pensei logo como devia servir de exemplo a outros fazedores de livros.) E lá está tracto digestivo, de que já aqui tratámos.

 

[Texto 6129]

Ortografia: «Acacia longifolia»

Não é português

 

    «Mas neste caso, o insecto escolhido — da espécie Trichilogaster acaciaelongifoliae — tem uma relação específica com a acácia-de-espigas (Acacia longifólia), da qual depende para o seu ciclo reprodutivo. As fêmeas põem os ovos nas gemas das plantas — de onde brotam os ramos ou flores» («Um minúsculo insecto australiano vai combater as acácias em Portugal», Ricardo Garcia, Público, 5.08.2015, p. 15).

      Ricardo Garcia queria escrever Acacia longifolia, que é a forma como se grafam, na terminologia científica, estes nomes.

 

[Texto 6128]

Ortografia: «consomé/consomê»

Más opções

 

     «O primeiro prato servido foi um consumè de lagosta, seguido do prato de peixe, uma vichyssoise de frutos do mar com espuma de ostras e ovas de salmão» («De Espanha ao Vietname. Jorge Mendes foi notícia mundial», Márcia Gurgel, Diário de Notícias, 4.08.2015, p. 50).

  Por mais que queira, não percebo isto: temos, aportuguesadas, duas formas, consomé e consomê, ambas do francês consommé. Para quê este alienígena «consumè»?

 

[Texto 6127]

Ortografia: «macartismo/macarthismo»

Duplo, não triplo

 

      «[Ário Lobo de Azevedo] Trabalha em Angola, viaja para os Estados Unidos para estudar em pleno mccartismo, para ser ameaçado de expulsão por ter comentado uma afirmação de um senador americano» («Morreu com 93 anos o primeiro reitor da Universidade de Évora», Carlos Dias, Público, 5.08.2015, p. 15).

   Já aqui o tínhamos visto. O Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora regista macartismo e macarthismo, não «mccartismo».

 

[Texto 6126]

Léxico: «pedologia»

Em qualquer caso, os pés

 

     «[Ário Lobo de Azevedo] Foi professor catedrático e Investigador [sic] pedologista da Missão de Hidráulica Agrícola
 ao Sul de Angola, da Missão de Pedologia de Angola (de que também foi responsável, de 1960 a 1962) e da Missão de Pedologia de Angola e Moçambique» («Morreu com 93 anos o primeiro reitor da Universidade de Évora», Carlos Dias, Público, 5.08.2015, p. 15).

     Pedologia. Designa duas coisas diferentes; no caso, é o ramo da ciência que se ocupa do estudo dos solos. O mesmo que edafologia. Faz lembrar podologia, a ciência que se dedica ao estudo, prevenção e tratamento das deformidades e alterações dos pés. Terão alguma relação? Têm: «pedologia» provém de pedon + logia (πέδον + λογία), e pedon tem raiz no indo-europeu ped, «pé».

 

[Texto 6125]