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Linguagista

Léxico: «criminógeno»

Modismos e tecnicismos

 

      «Com oito anos e dez meses de cadeia cumpridos, o antigo presidente do Benfica Vale e Azevedo vai continuar preso: a juíza encarregada de rever a sua situação recusou-se a colocá-lo em liberdade condicional, invocando a sua tendência para o crime» («Juíza recusa liberdade condicional a Vale e Azevedo», Ana Henriques, Público, 22.08.2015, p. 11). «Colocá-lo em liberdade»... em bom jornalistiquês. Continua: «O facto de o recluso ter referido que quer continuar a exercer a profissão de consultor quando ficar em liberdade não contribuiu para criar uma boa impressão à magistrada, segundo a qual Vale e Azevedo revela uma personalidade centrada em si própria, manipuladora e astuta. “Pretende desenvolver uma actividade que, directa ou indirectamente, implica movimentações financeiras de grande dimensão e, como tal, é chão fértil para a sua propensão criminógena”, pode ler-se na sentença datada do mês passado que lhe nega a liberdade condicional, e da qual Vale e Azevedo já recorreu.» Este vocábulo, criminógeno, também não está em quase nenhum dicionário.

 

[Texto 6195]

«Tão ladrão é o que rouba a horta...»

Está na moda, até nas sentenças

 

      «Luís Correia considerou a atitude dos sociais-democratas como uma “falta de respeito profundo pela instituição Câmara de Castelo Branco” e adiantou que “tanto é ladrão aquele que rouba como o que fica à porta”» («Edifício histórico demolido em Castelo Branco», Público, 22.08.2015, p. 13).

      Por um pouco acertava, o que é sempre comovente. O provérbio tem variantes, como tantos outros, e a minha preferida é esta: «Tão ladrão é o que rouba a horta como o que fica à porta.»

 

[Texto 6194]

Léxico: «portado»

Poucos a registam

 

      «O presidente da Câmara de Castelo Branco, Luís Correia, reconheceu ontem que foi “um erro” a demolição de um edifício com portados quinhentistas, mas criticou o facto de os vereadores do PSD terem preferido assistir à destruição do imóvel, em vez de avisar o município. […] A demolição de um edifício com portados quinhentistas (ombreiras das portas da rua em pedra trabalhada), por parte da Câmara de Castelo Branco, tema que já tinha sido abordado na reunião pública do executivo municipal de 17 de Julho, voltou a dominar a sessão de ontem» («Edifício histórico demolido em Castelo Branco», Público, 22.08.2015, p. 13).

     Para José Pedro Machado, é o mesmo que porta e portal, e uma das acepções deste é, como se sabe, ombreira de porta ou portão. Poucos dicionários a registam.

 

[Texto 6193]

«Tubo de ensaio»

Esqueceram-se de o estragar

 

      É curioso que se diga tubo de ensaio e não, copiando o inglês, *tubo de teste (test tube). Isto tanto mais que há vários testes em medicina. Aliás, provavelmente entrou no português por intermédio de obras de psicologia em língua inglesa. Décadas atrás, usava-se ainda o anglicismo test (exame, prova), depois nacionalizado em teste. To test é «examinar», «comprovar».

 

[Texto 6192]

Tradução: «barren cell»

Não aqui

 

      «Ali sentado na cela estéril, as paredes cobertas de graffiti e o chão a tresandar a urina, fui invadido por lembranças terríveis» (A Minha História com Bob, James Bowen. Tradução de Ana Lourenço. Porto: Porto Editora, 1.ª ed., reimpressão de 2015, p.102).

    Será a melhor tradução de barren cell? Não me parece. Inicialmente, barren aplicava-se apenas à mulher, uma mulher estéril. Mais tarde, passou a aplicar-se à terra, terra estéril, infértil. Por fim, como o que é estéril não tem nada, passou a aplicar-se, por exemplo, a um espaço, um espaço deserto. Logo, numa cela vazia, deserta.

     «I know something about solitary confinement, because I’ve been there. I spent a total of 12 years in various solitary confinement cells. And I can tell you that isolating a human being for years in a barren cell the size of a small bathroom is the cruelest thing you can do to a person» («When prisioners protest», Wilbert Rideau, New York Times, 16.07.2013).

 

[Texto 6191]