Ou os nossos limites?
«Voltámos aonde nunca saímos.»
A frase está a ser comentada em vários sítios. Desde manhã, já cinco leitores me pediram que dissesse alguma coisa (nenhum era jornalista, ou ter-me-iam pedido para «reagir»). É de um artigo de Ricardo Costa no Expresso. Ali no eixo, a frase desarticula-se. «Voltámos aonde» — está certo; «aonde nunca saímos» — está errado. Nada: não podemos usar ali os advérbios «onde», «donde» ou «aonde».
Será mesmo um anacoluto, como Fernando Venâncio aventa aqui? Há ali, disso ninguém tem dúvidas, quebra da estrutura sintáctica, mas não apresenta, como ocorre nos exemplos mais conhecidos, descoincidência de sujeitos: «Santo António [...] abriu-lhe Deus um dia os olhos para que visse neste mundo o que nós não vemos» (P.e António Vieira). Num estádio inicial do português, os anacolutos abundavam na escrita, e, portanto, vistos como algo normal. Só mais tarde os puristas começaram a apontar o dedo a estas construções e a condená-las defeituosas. Sim, podem ser os limites da gramática, ou, pelo menos, os limites a uma economia que nos convinha. Teremos de nos contentar com «voltámos ao lugar de onde nunca saímos». Local, sítio, ponto... No caso, ao buraco.
[Texto 6258]