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Linguagista

«Tivemos/‘tivemos/estivemos»

Vão longe

 

      «O Papa e Davis tiveram juntos cerca de 15 minutos e conversaram sempre em inglês. “Ele agarrou a minha mão, eu abracei-o e ele também me abraçou. Eu tinha lágrimas a sair dos olhos”, disse a funcionária em entrevista à cadeia televisiva “ABC News”» (Jornal de Notícias, edição em linha, 1.10.2015).

      Há gramáticas de português para estrangeiros que chamam a atenção para o verbo «estar» sofrer contracções (e não é por estar no termo), apresentando-se na oralidade, sobretudo na linguagem popular, com tempos que se podem confundir com os do verbo «ter». Mas — só faltava que não — indicam essas formas contraídas com um apóstrofo: ‘tivemos por estivemos, diferente de tivemos, do verbo «estar». Um erro assim, ainda que na versão digital, num jornal é que ultrapassa tudo o que é tolerável. E, no entanto, ainda na semana passada o encontrei num texto que revi.

 

[Texto 6360]

«Fazer/desfazer a barba»

Não percam tempo

 

      Aqui perto de casa, vai abrir no dia 2 de Novembro uma nova barbearia, outro negócio da moda — a Barbearia Fonseca Vintage. Sem o acrescento da palavra inglesa, não teria êxito, como se sabe. Vejam agora o que se propõem fazer, ou desfazer: «Não perca a oportunidade de encontrar um espaço diferente, onde cortar o cabelo e desfazer a barba, num local vintage a recordar os velhos tempos.» Sim, ouço, de quando em quando, mas sempre com um traço de gozo na voz. É verdade que se diz fazer a barba, quando logicamente se deveria dizer desfazer a barba, mas a linguagem é o que é, demasiado livre para a domarmos com a lógica. Fazer a barba é idiomático, e querer corrigi-la é o mesmo que pretender endireitar a sombra de uma vara torta.

 

[Texto 6359]

Como se escreve nos jornais

Um tão imperfeito conhecimento

 

      «“É como se estivéssemos a deitar abaixo o resto do muro de Berlim”. […] A queda do Muro de Berlim foi um dos mais formidáveis acontecimentos da história do século XX, ao reunificar um país, devolvendo a liberdade a milhões de cidadãos separados por quilómetros de arame farpado. [...] Num virtuoso passe de mágica, Costa quis passar um certificado de bom comportamento a Jerónimo e a Catarina, como se ambos tivessem renunciado aos dogmas que trazem colados à pele, onde a democracia não passa de fachada útil para alcançar o poder, fieis à ditadura do proletariado. [...] O colapso do comunismo no leste europeu, embora tenha varrido de cena os principais partidos que dele se reclamavam — em Espanha, Itália ou França — não beliscou o PCP, nem os seus satélites. […] E o Bloco, descontados os sorrisos postiços, é tão trotskista e maoísta como no tempo de Louçã, que continua de batina a orientar a missa a partir da sacristia. [...] Carlos César — um carreirista açoriano sem emprego fora da politica que se lhe conheça — veio dizer na TVI que os termos do acordo com o PCP e o Bloco só serão mostrados após a indigitação de Costa» («Da batota à chantagem política», Dinis de Abreu, Sol, 23.10.2015, p. 33).

 

[Texto 6358]