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Linguagista

«Como assim?»

Atrevam-se

 

      Há muito que não falo aqui das minhas irritações, na quase certeza de que pouco ou nada interessam aos outros. Hoje, porém, vou ceder. Trata-se de uma tradução do inglês. Uma personagem faz uma afirmação, e a resposta do interlocutor é: «How?» Simplesmente. Não interessa o contexto. Na tradução: «Como assim?» Se querem ver-me indisposto, falem comigo desta maneira.

 

[Texto 6446]

«A minha pátria é...»

Do rigor paranóico

 

      Podia ser o nome de uma rubrica do Linguagista, pois já vimos aqui outros casos. Carlos Reis, coordenador do congresso internacional «Língua Portuguesa: uma Língua de Futuro», que decorre por estes dias em Coimbra, disse — inesperadamente — grandes verdades, tal como faltar vontade política para promover a língua portuguesa. Disse mais: «“Estamos cansados de ouvir e voltar a ouvir gente com responsabilidade citar: a minha pátria é a língua portuguesa’. Como se isso aliviasse as consciências”, criticou. Para além de muitas vezes mal atribuída a Fernando Pessoa, “não basta proclamar” tal expressão, frisou, terminando o seu discurso com uma interrogação sobre se ainda se vai falar em língua portuguesa nos 800 anos da Universidade de Coimbra» (Observador, 2.12.2015, aqui). Será mesmo mal atribuída? Até parecem entidades diversas. Vá lá explicar a uma criança de 8 anos, ou a um analfabeto de qualquer idade, que a frase é e não é de Fernando Pessoa. Inês Pedrosa, no sítio da Internet da Casa Fernando Pessoa: «“A minha pátria é a língua portuguesa”, escreveu, profeticamente, Fernando Pessoa.» 

 

[Texto 6445]

«Salafita» ou «salafista»?

Um pouco de futurismo

 

  «Caro Amigo, que lhe parece a passagem de “salafismo” para “salafita”? Não lhe parece mais correcto dizer “salafista”?! Serão estrangeirismos de origem diversa? Obrigado.»

 

  Parece-me uma passagem perfeita, como de islamismo para islamita ou de vaabismo para vaabita. Em relação a islamismo, houve, entretanto, quem visse a «necessidade» de distinguir o crente, que sempre fora conhecido por «islamita», do combatente, que quiseram baptizar «islamista». Poderia pensar-se que o s pretenderá aludir ao carregador a atravessar o peito do combatente, mas não: distraídos, começaram a escrever assim porque não viram que vem de «islame», e o segundo s de «islamismo» impôs-se-lhes aos olhos. Muito depois de Rebelo Gonçalves registar apenas «islamita» no seu Vocabulário da Língua Portuguesa, Celso Cunha escreveu esta notinha numa página da sua Gramática Moderna: «Nem todos os designativos de sectários ou partidários de doutrinas ou sistemas em -ismo se formam com sufixo -ista. Por exemplo: a protestantismo corresponde protestante; a maometismo, maometano; a islamismo, islamita» (Belo Horizonte: Editora B. Álvares, 1970, p. 49).

    O que me parece que já está a suceder é que os dois termos, «islamita» e «islamista», são usados indiferentemente, como meras variantes, para nomear os dois conceitos. No futuro, quando já cá não estivermos, prevejo que essa convergência se solidifique, concluindo-se então que, afinal, não era preciso distinguir nada.

  «Vejamos como Abd-el-Jalil — que é um dos paladinos do movimento salafita — entende a unidade religiosa dos islamitas» (O Mundo Árabo-Islâmico e o Ultramar Português, José Júlio Gonçalves. Lisboa: Ministério do Ultramar/Junta de Investigações do Ultramar/Centro de Estudos Políticos e Sociais, 1958, p. 14).

 

[Texto 6444]