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Linguagista

Léxico: «ovos-moles pretos»

Em demanda de mais precisão

 

      Com certeza que o ressurgimento dos ovos-moles pretos não obriga a nova redacção do verbete nos dicionários, mas, ainda assim, vejamos. Para o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, é um «doce feito com ovos e açúcar em ponto, uma especialidade da região de Aveiro». A começar por «doce», fico com muitas dúvidas. E não seria melhor dizer que é com gemas? Afinal, também não se indica meramente que é com açúcar, mas açúcar em ponto. E o invólucro de massa, omite-se? Omite-se que é conventual? Na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, lê-se que é uma «espécie de iguaria doce». Numa edição deste mês do Jornal de Notícias, lia-se que é o «doce típico de Aveiro, feito com gema de ovo e açúcar e coberto por uma fina hóstia branca».

 

[Texto 6506]

«S-e-l-f-i-e»

Pois é

 

      «Curiosamente, e com o aproximar de 2016, voltou também à ribalta no Brasil o acordo ortográfico (AO), que tanta polémica gerou e ainda gera. O Jornal Nacional da Globo, que fez um trabalho dia 21 ouvindo opiniões contraditórias, terminou com
 uma pergunta ao professor Evanildo Bechara, um dos grandes promotores e entusiastas do AO. Vale a pena reproduzir, na íntegra, o diálogo entre o jornalista e o professor. “J.N: Professor Bechara, como é que se escreve selfie, em português?/ E.B: Por enquanto, é à moda inglesa. Agora, a dúvida é saber se é masculino ou feminino. Porque as duas formas se usam./ J.N.: O senhor poderia soletrar selfie?/ E.B: S-e-l-f-i-e./ J.N.: Exatamente como inglês. Isso é português?/ E.B: É português.” Podemos, portanto, com acordo ou sem ele, dizer na mais vernácula expressão da língua de Camões e Machado de Assis que 2016 vai ser, para o Brasil, a very good year. E que há-de ficar bem no auto-retrato, perdão, na selfie» («Brasil para rir, pensar e desinquietar», editorial, Público, 26.12.2015, p. 2). 

      Surpreendentemente — ou não? —, o único não taralhouco aqui é Evanildo Bechara. (E lá está o gerúndio avariado: «fez um trabalho […] ouvindo opiniões contraditórias».)

 

[Texto 6505]

«Em detrimento de»

Na dúvida, nunca

 

    «Ontem, dia de Natal, no Twitter, Thom Yorke [dos Radiohead] dissipou todas as dúvidas. O músico confirmou que de facto a banda tinha sido convidada, mas que o tema que tinham composto não tinha funcionado. “Mas tornou-se algo nosso, de que gostamos muito”, escreveu o músico numa declaração que pode ser lida também no Soundcloud. A banda aproveitou ainda para desejar um bom Natal. “Que a Força esteja convosco”, concluiu, numa referência à Guerra das Estrelas e em detrimento de 007» («007 recusou-a, Radiohead fizeram dela uma prenda de Natal», Cláudia Lima Carvalho, Público, 26.12.2015, p. 48). 

      Tenho sérias dúvidas que a locução prepositiva «em detrimento de» seja adequada neste contexto. E, na dúvida, nunca usaria.

 

[Texto 6504]