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Linguagista

A todos os disléxicos

Por fás e nefas

 

      A todos, não tão poucos quanto se possa pensar, os disléxicos, pais de disléxicos, educadores, professores, etc.: há um projecto no Kickstarter, chamado Dyslexie, que consiste num novo tipo de letra que vem ajudar os disléxicos. Aliás, esse tipo de letra já existe (e pode ser descarregado daqui); o que o projecto pretende é criar um conversor para PDF, um complemento para os navegadores e, se o objectivo for atingido, ainda uma aplicação para iOS e Android. Não brinquem: sabiam que qualquer pessoa pode ficar disléxica? Não tenho tanto receio disso ou da síndrome do sotaque estrangeiro (FAS, foreign accent syndrome, para a legião de anglófonos que nos segue) como de uma pneumonia ou um cancro, mas, ainda assim, não cuspo para o ar.

 

[Texto 7170]

«80 mil tropas»?!

Aponte aí

 

      «Há vários meses que as forças iraquianas pró-governamentais, apoiadas por conselheiros militares norte-americanos, preparam a ofensiva. Tomam ainda parte na operação forças peshmerga [sic] curdas, bem como elementos de tribos sunitas e unidades anti-terroristas [sic] iraquianas — são ao todo 80 mil tropas de vários grupos com objectivos e motivações diversas e, por vezes, opostas, envolvidos numa operação complexa e que deverá durar semanas ou meses, segundo a generalidade dos analistas militares» («Brutal, violenta e longa. Assim será a reconquista de Mossul», João Ruela Ribeiro, Público, 18.10.2016, p. 24).

      Além de tudo o mais, aquelas «tropas»... Caro João Ruela Ribeiro, tropa é um substantivo colectivo. É tão correcto dizer «80 mil tropas» para se referir a 80 mil soldados/militares, como «80 mil récuas» para referir 80 mil cavalos. Deve estar aqui metido o troops do inglês. Nas últimas décadas, onde há erro costuma haver má tradução do inglês. Infelizmente, não é erro apenas dos jornalistas; nas traduções, chega a ser às catadupas.

 

[Texto 7169]

Já não sabem perguntar

Uma pergunta, uma resposta

 

      Um leitor habitual do Linguagista manda-me o título de um artigo da edição de hoje do Público e escreve: «Ultimamente tenho deparado com certa frequência com este tipo de construção. Pergunto-lhe: na sua opinião, isto é português?» Vejamos o título: «O que os políticos têm a aprender com os neurónios? A agir por consenso». Resposta: não é. Adenda: não raro, também a encontro — e persigno-me perante tão diabólica ignorância — quer em traduções, quer em jornais.

 

[Texto 7168]

«Loja pop-up», de novo

Desça à rua

 

      «Foi nessa altura que diz terem voltado a “arregaçar as mangas” para encontrar alternativas ou outros investidores. Ana Paula Santos diz ser necessário apostar na modernização do espaço e para isso contribuem as lojas pop-up espalhadas pelo primeiro piso, que entende serem uma mais-valia para o centro» («O Brasília deu cor a um país ainda cinzentão. Hoje, tenta reerguer-se», André Vieira, Público, 18.10.2016, p. 17).

      Não brinquem connosco! Desde quando é que «loja pop-up» é mais claro ou expressivo ou seja lá o que for do que «loja temporária»? Já aqui vimos esta designação num artigo do Diário de Notícias, com a vantagem de a jornalista explicar o conceito. André Vieira, desça aí à Praça Coronel Pacheco e pergunte à primeira pessoa que encontrar se sabe o que é uma loja pop-up e depois diga-nos alguma coisa.

 

[Texto 7167]

Léxico: «alambor»

Menos respeitinho

 

      «Já a Câmara de Lisboa transmitiu ao PÚBLICO que, no decurso da empreitada de “abertura de uma trincheira arqueológica”, “foi descoberto o Alambor [a parte reforçada e saliente na base de uma parede] da Muralha Fernandina”» («Parte da Cerca Fernandina revelada nas obras do funicular da Graça», Inês Boaventura, Público, 18.10.2016, p. 18).

      Não é preciso assim tanto respeito, senhores camarários, camaradas: alambor é substantivo comum. Diga-se, a propósito, que a definição constante do Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora é equívoca: «aumento de espessura na base das construções de alvenaria». Melhor está neste dicionário de engenharia civil: «Termo que pode designar sapata, ou parede em que a espessura vai diminuindo consoante a altura.» No Aulete também não está mal.

 

[Texto 7166]

«Jovem-prodígio»?

Para a trilogia

 

      «Com apenas 11 anos, Alma Deutscher prepara-se para estrear em Viena uma ópera. É o mais recente feito de uma jovem-prodígio que começou a compor com seis anos – sonatas para piano e concertos para violino – e editou o primeiro álbum aos oito. É a história de uma jovem compositora que oferece uma melodia ao seu príncipe, conta Ana Cristina Sousa» («O “prodígio” da música erudita», Público, 18.10.2016, p. 43).

      Só se for para perfazer a trilogia: criança-prodígio, menino-prodígio, jovem-prodígio. Outra coisa seria dizer-se «Alma Deutscher é uma jovem prodígio da música».

 

[Texto 7165]