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Linguagista

Léxico: «papibaquígrafo»

Isto é abracadabrante

 

      «“Tá-té-ti-tó-tu.” “Agora, digam isto com carinhas feias. Mais feias.” A ideia é relaxar partes da cara normalmente tensas. Depois, é a vez de destravar a língua: dizer, sem gaguejar, papibaquígrafo. A dicção, em política, conta, defende [Nuno Miguel Henrique]. Essa é a preocupação de um dos formandos, um médico dentista de 60 anos. Robson Santos não quer tropeçar na sua própria fala quando expressa uma ideia, mesmo que seja no consultório. “Muitas vezes só falamos, não comunicamos”, diz, defendendo que a capacidade de “comunicar com naturalidade” devia ser mais trabalhada nas escolas» («“Protocolo é afirmação de poder” mas a sua falha pode ter graça», Maria João Lopes, Público, 5.03.2017, p. 6).

      Nunca é tarde para nos desenganarmos: até hoje, eu sempre disse «pipapapígrafo». Não tem muita importância, dir-se-á, porque é uma palavra inventada (mas uns lunáticos já lhe inventaram um significado), mero trava-língua, mas, por essa ordem de ideias, também seria indiferente dizer, excepto pelo peso histórico, «acabradabra» em vez de «abracadabra». E convenhamos que «papibaquígrafo» trava muito mais a língua.

 

[Texto 7530]

Léxico: «lefebvrista»

É esperar

 

      «Lefèbvristas perderam “possibilidade de afirmação” com este Papa» (Natália Faria, Público, 5.03.2017, p. 12). Claro que uma heresia, como a ebionita, por exemplo, pode ter, consoante o número de sequazes que arregimente, muito maior importância, mas é preciso maior distanciamento histórico para compreender o impacto das ideias de Marcel Lefebvre. Num aspecto, contudo, já sobressai: foi o fautor do primeiro cisma no seio do Catolicismo depois do Concílio Vaticano I, o que não é pouco, e as suas ideias sobreviveram-lhe. (Se o nome não tem acento, Natália Faria, o adjectivo tão-pouco o terá: lefebvrista.) Como nem o filósofo marxista Henri Lefebvre (por coincidência falecido no mesmo ano do arcebispo rebelde), que está nas enciclopédias, granjeou um adjectivo, não se pode esperar muito.

 

[Texto 7529]

Tradução: «on-call work»

Outras intermitências

 

      Em entrevista ao jornal Público, diz Mariya Aleksynska, economista da Organização Internacional do Trabalho (OIT): «Quando uma destas condições é violada, estamos perante emprego atípico: contratos a termo, diários, trabalho sazonal, a meio-tempo, à chamada (on call work), contratos zero horas, relações laborais triangulares e situações em que a relação de emprego não existe formalmente» («“Há indústrias onde o emprego atípico se está a tornar normal”», Raquel Martins, Público, 5.03.2017, p. 18).

      A pergunta é a de sempre: porquê em inglês? Será porque a jornalista tem dúvidas sobre a tradução e quer endossar a tarefa ao pobre leitor? Sim, já tenho lido a expressão trabalho à chamada. Tanto quanto sei, porém, a matéria é regulada pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, que usa a designação trabalho intermitente.

 

[Texto 7528]

Desferir sentenças?

Falemos de loucos

 

   «Ao longo dos últimos 35 anos, arrostou com o seu “gesto de Fátima” — como costuma chamar ao atentado — e diz que fez de quase tudo para sobreviver: contabilista, advogado, agricultor, mecânico de bicicletas» («Francisco é “inimigo da Europa”, diz padre que tentou matar Papa», Natália Faria, Público, 5.03.2017, p. 10).

   Gosto de ler os artigos desta jornalista, o que não significa que concorde sempre com a forma como escreve. Por exemplo, no artigo de hoje: aquele «arrostou com» deixa-me muitas dúvidas. E nesta frase: «Durante o julgamento, repetiu que a sua intenção fora “atravessar o coração” de João Paulo II. Mas, ainda antes de desferida a sentença, mostrava-se já menos combativo, apaziguado até.» As sentenças desferem-se, quais balas? Quanto a Juan Krohn, é o parvalhão de sempre (aproveito a fórmula que um homenzinho invejoso, e claramente com uma aduela a menos, me dirigiu. Cumps.).

 

[Texto 7527]