Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Linguagista

Léxico: «organeiro»

Voto pelos italianos

 

     «O mestre organeiro Dinarte Machado, responsável pelos trabalhos, descreveu à agência Lusa dois órgãos diferentes, cada qual com o seu bilhete de identidade, sendo que o instrumento da esquerda se identifica mais com o século XVIII e o outro com a primeira metade do século XIX» («Órgãos históricos da Sé do Porto voltam a soar em Abril após restauro de dois anos», Rádio Renascença, 18.03.2017, 13h40).

      De organeiro, o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, e provavelmente todos os dicionários, diz o seguinte: «1. fabricante de órgãos; 2. encarregado da limpeza e conservação do órgão de uma igreja». Será que o mestre organeiro Dinarte Machado só faz isso, limpeza e conservação de órgãos? E porque se fala em igrejas? No Dicionário da Real Academia Espanhola, podemos ler que é o «fabricante y reparador de órganos», embora mais correcto fosse, porventura, «fabricante o reparador de órganos». No Treccani, estão mais perto da perfeição: «Chi fabbrica, monta o ripara organi (e strumenti congeneri).» No Diccionari.cat, lê-se que é a «persona que fabrica o adoba orgues». E sempre sem iglesias, chiese ou esglésias.

 

[Texto 7579]

Como se escreve na imprensa

Vamos lá aferir isto

 

      Esta tarde, houve uma enorme explosão no Bairro de Sainte-Gilles, no centro de Bruxelas. Ao que parece, registaram-se sete feridos. E agora, que se segue? «Por razões de segurança», lê-se no Observador, «15 moradores foram evacuados e uma empresa irá auferir quais os edifícios afetados na sequência da explosão» («Explosão “enorme” em Bruxelas faz vários feridos», Ana Cristina Marques, Observador, 18.03.2017).

      Usa o verbo auferir, mas manifestamente não sabe o que a palavra significa. Com sorte, é desta que aprende. Como a notícia está em actualização, está a tempo de a corrigir. Sobre uma empresa, lê-se isto na RTL: «Une société spécialisée doit arriver pour sécuriser les bâtiments touchés.»

 

[Texto 7578]

Léxico: «deserto»

E se for outra congregação?

 

      «Sem que nada lhes fosse pedido, as pessoas organizaram-se em grupos que, rodando ao longo dos meses do ano, levam ao mosteiro [no Couço, Coruche] os mantimentos de que a comunidade precisa, para que esta não tenha de abandonar o seu deserto» («Monjas de Belém: “A nossa vida é um grito silencioso”», Mariana Pereira, Diário de Notícias, 18.03.2017, p. 5).

      Já aqui tínhamos visto esta acepção de deserto, e o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora não diz nada de diferente: «lugar situado longe de qualquer povoação, onde os monges carmelitas viviam isolados, como os eremitas do cristianismo primitivo». Ora, no caso trata-se das Monjas de Belém — e vivem no seu deserto. Ou seja, será mais correcto não referir nenhuma congregação, ou, então, fazê-lo a título exemplificativo.

 

[Texto 7577]

Léxico: «justicialista»

Falta sempre alguma

 

    «Em processos como o da Casa Pia revelou-se uma perigosa tentação de fazer uma “pesca de arrasto” contra os políticos em geral e, num ou noutro caso, em processos de pedofilia, no processo dos skinheads, houve cedências a uma opinião pública e a uma imprensa justicialista que clamava por sangue antes de clamar por provas» («Impedir abusos, defender direitos, liberdades e garantias é connosco e não com José Sócrates», José Pacheco Pereira, Público, 18.03.2017, p. 52).

    Há sempre palavras que ainda não estão nos dicionários, e muitas vezes palavras do dia-a-dia. Não é o caso, mas surpreende que, registando justicialismo, o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora não acolha também justicialista. Tenho, no entanto, dúvidas sobre a propriedade do uso do vocábulo no artigo.

 

[Texto 7576]

Léxico: «cratão»

O léxico da ciência

 

      «Agora, investigadores do Canadá e EUA publicaram um artigo na edição desta semana da revista Science com os resultados de análises a algumas rochas encontradas numa região chamada “Escudo Canadiano” e que revelam que estas amostras preservam a assinatura do momento de formação da crosta da Terra. […] As amostras analisadas fazem parte do que os investigadores chamam “cratões” (unidades geológicas muito antigas), como o do Escudo Canadiano, que é considerado o núcleo do continente norte-americano» («Há rochas “filhas” da crosta original da Terra no Canadá», Andrea Cunha Freitas, Público, 18.03.2017, p. 33).

      Ah, a tolice das aspas! Agora, até nos topónimos. Quanto a cratão, o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora define-o como a «região da Terra, rígida e estável, no geral de grande extensão». Embora se possa melhorar esta definição, é muito melhor do que a explicação da jornalista, de que não se percebe nada.

 

[Texto 7575]