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Linguagista

Léxico: «pastoral»

Ou seja?

 

      «É no olhar de Nossa Senhora de Guadalupe, padroeira do México, que os bispos encontrarão as pistas para o seu trabalho pastoral, explicou este sábado o Papa Francisco, que está de visita ao país» («Papa apresenta a virgem de Guadalupe como programa pastoral», Aura Miguel e Filipe d’Avillez, Rádio Renascença, 13.02.2016, 18h37).

      Viram bem: é uma notícia do ano passado. Não é isso que interessa, mas antes a definição de pastoral que se encontra no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora: «trabalho coordenado do apostolado, em conjunto». Tenho sérias dúvidas de que o leitor médio compreenda a definição, sucintamente enganadora.

 

[Texto 8490]

«Taxa/imposto»

Só se for para confundir

 

      Fernando Medina afirma que vai acatar na íntegra o acórdão do Tribunal Constitucional. Obrigadinho. Só é pena confundirem intencionalmente taxa com imposto. No Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, taxa está correcto: «prestação que se exige dos particulares que utilizam um serviço público». É, nas palavras do acórdão, o tal «contributo bilateral»: «Assim, o TC defende que “não pode a TMPC [Taxa Municipal de Protecção Civil] afirmar-se como contributo bilateral, ou seja, não se trata de uma taxa, no sentido jurídico-constitucionalmente” [sic], além de não se poder ver, “nem sequer aproximadamente, como um ‘prémio de seguro’”» («Lisboa. Constitucional chumbou taxa por considerar que era um imposto», Rádio Renascença, 21h31). «“Não há, pois, como negar o carácter extremamente difuso [na verdade, impossível de traçar] da relação entre a titularidade dos prédios e as prestações no âmbito da Protecção Civil a que [alegadamente] dá causa, ou da relação entre tais prestações e respectivo ‘benefício’ para os titulares do património imobiliário. Não é a possibilidade de enumerar várias actividades de protecção civil — sem consideração do seu peso relativo e, em particular, da relação de cada uma com a titularidade dos prédios —, que permite dar por estabelecida a necessária correlação entre prestações”, sustenta o Constitucional» (idem, ibidem). Azarucho, Medina.

      Entretanto, passamos para a definição de imposto naquele dicionário da Porto Editora e salta logo à vista a escolha infeliz das palavras: «taxa exigida pelo Estado a pessoas singulares e colectivas para fazer face às despesas públicas; tributo». Quando a grande dificuldade, até nas faculdades de Direito, é precisamente estabelecer a distinção entre taxa e imposto — sim, porque há casos de fronteira —, vem alguém definir imposto como taxa exigida pelo Estado. Reformulem, por favor.

 

[Texto 8489]

Léxico: «custódio»

Também é

 

      «O Papa e Abdullah são duas personalidades influentes na Terra Santa. Enquanto Rei da Jordânia, Abdullah é custódio dos lugares santos em Jerusalém e a Igreja Católica detém muitos lugares santos cristãos, ou em exclusivo ou em conjunto com outras confissões cristãs, naquela região» («Papa e Rei da Jordânia discutem estatuto de Jerusalém em encontro no Vaticano», Rádio Renascença, 19.12.2017, 15h09).

      O Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora esquece-se de que custódio também é substantivo, «o que guarda ou defende». No entanto, no VOLP da Academia Brasileira de Letras podemos encontrá-lo.

 

[Texto 8488]

Léxico: «lira»

E não é o instrumento

 

      «Para que as receitas saiam bem, o investigador [José António Martins] sugere que as batatas sejam da uma qualidade específica, a Lira, e oriundas de Aljezur, que tem marca certificada pela União Europeia» («Receitas antigas de batata-doce para um Natal mais saboroso», Maria Augusta Casaca, TSF, 19.12.2017, 9h14).

      Lira é mais um vocábulo polissémico. Foi por sugestão minha, por exemplo, que o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora registou a acepção 6. E esta, relativa à batata-doce, também merece figurar ao lado das outras. A obra de José António Martins a que o artigo se refere tem o título As mais Antigas Receitas de Batata-Doce nos Livros de Culinária dos Séculos XVIII e XIX, e foi lançada recentemente.

 

[Texto 8487]

Corte ou ruptura térmica

Faz falta

 

      «A maioria habita edifícios construídos entre 1980 e Abril de 2004, a maior parte com vidros duplos nas janelas, mas não possuem caixilharias com ruptura térmica, “o que de nada adianta a eficiência do vidro”, segundo os ambientalistas» («Três em cada quatro portugueses sentem frio dentro de casa», Rádio Renascença, 18.12.2017, 18h29).

      É muito simples: para remediar uma característica do alumínio, que é a de deixar passar muito calor do ambiente mais quente para o mais frio, os fabricantes puseram uma película de poliamida entre a parte externa e a interna do caixilho para bloquear o calor. É a isto que se dá o nome de caixilharia de corte ou ruptura térmica.

 

[Texto 8486]

Léxico: «proteobactéria»

Não se compreende

 

    «John Valley, professor de geociência da Universidade de Winsconsin-Madison e um dos coordenadores do estudo, explicou em comunicado que o que foi encontrado foi “um grupo primitivo, mas diversificado de organismos” e adiantou que os micróbios identificados pertencem a três grupos, bactérias que dependem do sol para produzir energia, micro-organismos unicelulares que produziam metano e gammaproteobactérias que consumiam metano» («A vida na Terra é mais velha do que se pensava», TSF, 19.12.2017, 8h41).

      Reconheço que a grafia do nome dos subgrupos pode ser controversa — γ-proteobactéria não é susceptível de ser dicionarizado, pelo que se optará por gama-proteobactéria ou gamaproteobactéria, e o mesmo se diga para α-proteobactéria, β-proteobactéria, etc. —, mas a ausência de proteobactéria dos nossos dicionários é de pasmar. As falhas dos jornalistas também são as falhas dos dicionários.

 

[Texto 8485]