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Linguagista

Léxico: «caixa chinesa»

Um problema e uma solução

 

      A criancinha está aqui ao meu lado a fazer um trabalho para Educação Musical que consiste tão-só em descrever uma caixa chinesa. Ah, não é um instrumento musical tão pobre que não tenha sido usado, por exemplo, por Prokofiev em duas sinfonias. Isso mesmo: não está no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora. Sim, pode ser por causa da grafia, mas temos de ver que aquele dicionário acolhe, por exemplo, caixa-clara, «espécie de tambor no qual uma das membranas fica em contacto com duas cordas esticadas (bordões), especialmente usado em marchas militares e geralmente colocado a tiracolo». Sendo assim, porque não a regista com a grafia «caixa-chinesa», que, de resto, é como o vejo nas Normas de Inventário de Instrumentos Musicais, do Instituto dos Museus e da Conservação, e na Eurídice, o órgão de informação e divulgação da Banda do Exército?

 

[Texto 9026]

Léxico: «trufa-branca/trufa-preta»

E vão para o campo

 

      «As trufas brancas são as mais raras, só existem em algumas regiões do norte de Itália e Croácia e têm de ser colhidas com ajuda de cães treinados ou porcos» («Trufa. Um fungo muito caro», Paulo Ribeiro Pinto, Rádio Renascença, 9.04.2018, 11h18).

      Para o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, e para outros, naturalmente, é como se não houvesse trufas-brancas (Tuber magnatum Pico) e trufas-pretas (Tuber melanosporum Vittad.). As túberas ou túbaras são a versão alentejana das trufas, até pertencem à mesma família. Aliás, pelo que leio na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, «entendem os puristas que a forma trufa é galicismo condenável, preferindo-lhe túbera, que é forma acentuadamente portuguesa». Vá, agora vão para o campo e levem este Guia do Colector de Cogumelos.

 

[Texto 9025]

Léxico: «barreiro»

É lapso, sim

 

      «Fruto da existência de barreiros, as tradições da olaria têm-se perdido no tempo na região» («Decano dos oleiros ainda usa a roda e ensina designers estrangeiros», Júlio Almeida, Rádio Renascença, 9.04.2018, 11h18).

      Pelo menos na versão com Acordo Ortográfico de 1990 do Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, barreiro, nesta acepção, não está registado.

 

[Texto 9024]

Léxico: «corvo-da-nova-caledónia»

O mais e o menos

 

      Com que então, a ave mais inteligente do mundo, o corvo-da-nova-caledónia (Corvus moneduloides), que até fabrica e modifica ferramentas para capturar larvas no interior das árvores, não está no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora... Só mantêm em cativeiro o corvo-marinho, menos inteligente.

 

[Texto 9023]

Como se escreve nos jornais

Agora a electrónica

 

      «As baterias de iões de lítio que ainda hoje são usadas, e que John Goodenough ajudou a inventar já nos anos 80 do século passado, usam electrólitos líquidos para transportar os íons de lítio entre o ânodo (o lado negativo da bateria) e o cátodo (o lado positivo da bateria). Se uma célula de bateria é carregada muito rapidamente, pode causar dendritos, causando um curto-circuito que pode levar a explosões e incêndios — porque o líquido do electrólito é inflamável» («Novas baterias de lítio chegam em cinco anos com marca portuguesa», Luísa Pinto, Público, 9.04.2018, p. 14).

      Uma grande trapalhice mal escrita: na mesmíssima frase, «iões» e «íons». O «causar causando» também mostra bem a falta de releitura e revisão. Dendrito, nesta acepção, há um ano ainda não estava no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, fomos nós que, a 11 de Maio de 2017, aqui sugerimos a sua inclusão nos dicionários. Um leitor anónimo e precipitado (uma desgraça nunca vem só), e os leitores deviam ter o triplo do cuidado, ainda respingou: «Depende do dicionário. Dendrito vem no Houaiss, Aurélio, Aulete, Priberam...» E os eléctrodos não estão trocados? Eu pensava que o ânodo ou anódio era o positivo + e o cátodo ou catódio era o negativo -, mas posso estar enganado.

 

[Texto 9022]

Léxico: «capotamento»

Esmiucemos a questão

 

      «O autocarro em que seguiam, além do motorista, 48 passageiros, a maioria dos quais jovens entre os 18 e os 23 anos da Covilhã e de Belmonte que regressavam de uma viagem de finalistas a Espanha, despistou-se hoje, às 17:56, no nó de Arez e da Barragem do Fratel do IP2, fazendo um capotamento lateral» («Marcelo “desolado” com acidente em Nisa», Rádio Renascença, 8.04.2018, 22h20).

      Sim, é verdade que capotamento não está no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, mas não estou aqui apenas por isso. Fará sentido dizer «capotamento lateral»? Aquele dicionário, e talvez todos, diz que capotar é «(avião, automóvel) voltar-se com o lado de baixo para cima». Sendo assim, podia entender-se como uma forma de designar uma realidade semelhante: o veículo não ficava com o lado de baixo para cima, mas assente num dos lados, tombado. Como o conceito é semelhante, optava-se por acrescentar somente o termo «lateral». Contudo, se consultarmos o Dicionário Técnico Português-Inglês de Mauri Adriano Panitz (Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003, p. 60), lemos: «Capotamentocapsizing, rollover, overturnning [sic]; capotagem; ocorre quando o veículo em movimento gira em qualquer sentido, ficando com as rodas para cima, mesmo que momentaneamente, ocupando depois a posição lateral ou de tombamento.» Sendo assim, querem dizer que as rodas nunca ficaram para cima, mesmo que momentaneamente? Tudo visto, impõe-se uma pergunta: porque não usar os termos capotar/capotamento e tombar/tombamento consoante fosse uma ou outra situação? Ah, sim, dizem bem: o dicionário da Porto Editora também não regista tombamento.

 

[Texto 9021]