Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Linguagista

Futebolês espanhol

Importam e imitam tudo

 

      «“Remontada” sem golos de Ronaldo deixa Real mais perto de Kiev» (Rádio Renascença, 25.04.2018, 21h38). Futebolês, sim, mas futebolês espanhol: «Superación de un resultado o de una posición adversos», lê-se no Dicionário da Real Academia Espanhola. Para o leitor é que pode não ser bom: ou não compreende, o que, no caso, é preferível, ou vai considerá-lo termo português. Se fosse cuidadoso, o jornalista ou não usava o termo, ou, se o julgasse imprescindível, explicava-o. Ora, apenas está no título!

 

[Texto 9110]

Léxico: «balancé»

Arre-burrinho

 

      «Lembro-me de estar sentada sozinha num dos lados de um balancé naquele parque infantil, virada ao contrário, arrasada pelo estímulo excessivo de novos cheiros, dos sons, dos animais a correrem e a esvoaçarem à volta das árvores, de todas aquelas árvores verdes de grande porte» (Aqui e Agora, Ann Brashares. Tradução de Ana Saldanha. Queluz de Baixo: Editorial Presença, 2014).

      Que nos diz o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora sobre balancé? Que é um baloiço. Ora, pelo menos eu, quando penso em baloiço, não é um balancé que me vem à mente — porque são diferentes. Balancé, diga-se já, está há muito na nossa língua. Vamos fazer este exercício simples: ver que palavra está no original daquele excerto. Ei-lo: «I remember sitting alone at one end of a seesaw at that playground, facing the wrong direction, obliterated by the overstimulation of new smells, the sounds, the creatures darting and fluttering around the trees, all those heavy green trees.» Agora, pesquisemos seesaw no Dicionário de Inglês-Português da Porto Editora: «balancé». E, para os mais cépticos, isto: «to play at seesaw, andar de balancé». Esclarecidos. Afinal, a descrição exacta de um balancé está no verbete gangorra: «Madeira, Brasil brinquedo infantil constituído por uma tábua firmada sobre um eixo, cujas extremidades se elevam ou abaixam alternadamente por impulso de quem lá está sentado; arre-burrinho». Madeira e Brasil... e no continente?

 

[Texto 9109]

Léxico: «escoteiro/escuteiro»

Inspirem-se

 

      Já aqui tratei um dia da diferença entre escuteiro e escoteiro e lamentei o pouco que os nossos dicionários nos ajudam a destrinçar os dois conceitos. Nada mudou. Nada mudou no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora. E seria tão fácil, como aqui: «Não é apenas uma letra de diferença. Escuteiros são ligados à Igreja Católica e afetos ao Corpo Nacional de Escutas, ao passo que os escoteiros (em Portugal desde 1913) são “abertos a todos — independente, interconfessional e multiétnico”» («Entre escuteiros e escoteiros», Diário de Notícias, 23.04.2018, p. 12). Só isto, três linhas, e o falante já ficaria com algumas certezas.

 

[Texto 9108]

Léxico: «arimaspo»

Não falemos de monstros

 

      «Naquela época havia no mundo uma extraordinária diversidade de monstros: sereias, grifos, gigantes, amazonas, antropófagos, ciclopes, arimaspos ou blénias — estes últimos, homens sem cabeça, com a boca e os olhos inseridos no peito» (O Paraíso e Outros Infernos, José Eduardo Agualusa. Revisão de Margarida Filipe. Lisboa: Quetzal Editores, 2018, p. 22).

      Os antropófagos são monstros? Não. Apenas arimaspo e blénia não encontro nos nossos dicionários. O primeiro vejo-o em alguns vocabulários. No entanto, o Dicionário da Real Academia Espanhola acolhe-o: «Cada uno de los pobladores fabulosos de una región asiática, que tenían solamente un ojo y luchaban con los grifos para arrebatarles las riquezas de que estos eran guardadores.» Primos dos ciclopes. Ah, sim, o Aulete também o regista, mas sem nenhuma semelhança: «antigo povo da Sarmácia europeia». Blénia só encontro em dicionários antigos, mas num sentido nada monstruoso: peixe saltador das proximidades do oceano Índico. Em suma, não falemos de monstros.

 

[Texto 9107]

Léxico: «bantuísmo»

Estranho

 

      «A matriz angolana do Brasil é evidente na toponímia e, mais do que isso, na quantidade de bantuismos, originários sobretudo do quimbundo, do quicongo e do umbundo, que persistem no vocabulário do português brasileiro» (O Paraíso e Outros Infernos, José Eduardo Agualusa. Revisão de Margarida Filipe. Lisboa: Quetzal Editores, 2018, p. 22).

      Não tem de ter acento agudo, como «altruísmo», por exemplo? Bantuísmo, pois. Estranhamente, não o vejo em nenhum dicionário nem vocabulário.

 

[Texto 9106]