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Linguagista

Léxico: «bolha»

Só um

 

      Destaque da Proteste Investe deste mês: «Bolha imobiliária: saiba se deve comprar casa». (Isto tem alguma coisa que saber? Se se tem dinheiro, compra-se.) E os dicionários, quanto a bolha? Só o Aulete, ao que me parece, salva a honra do convento. Andamos aqui há anos a falar de bolha disto e bolha daquilo e ainda não pensaram que tem de ser dicionarizado.

 

[Texto 9241]

Léxico: «nadir»

O ponto oposto

 

      «“‘Nadir’, em hebreu, quer dizer ‘raro’ e eu acho que, realmente, aquele é um edifício raro [edifício da panificadora Panreal]. Como edifício, não é um edifício de que goste muito, mas isso tem pouca importância. Eu também não gosto de Versalhes, também não gosto de tantos outros monumentos, mas isso não quer dizer que não lute para que eles sejam preservados”, afirma a docente [e arqueóloga Mila Simões de Abreu] da UTAD» («“A vergonha de Vila Real” é um edifício de Nadir Afonso», Olímpia Mairos, Rádio Renascença, 17.05.2018, 8h00).

       Ora, nadir também é, não sei se sabem, nome comum, e designa o ponto contrário ao zénite, em que a vertical encontra a esfera celeste abaixo do observador. Debaixo dos nossos pés, digamos assim. Em árabe, língua a que pertence o étimo, significa precisamente ponto oposto. Poderá ter outro significado como nome próprio? Não me parece.

 

[Texto 9240]

Léxico: «descaroçador»

Polir, polir, polir

 

      Acabei de descaroçar umas quantas maçãs reinetas pardas. Usei, é claro, um descaroçador. E como define descaroçador o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora? Mal, penaliza-me dizê-lo: «aparelho que serve para tirar o caroço». É um utensílio simplicíssimo, não um aparelho. Aparelho, talvez em ambientes industriais.

 

[Texto 9239]

Léxico: «verdugo»

Não é carrasco, mas pode matar

 

      «O que aconteceu, porém, revela graves falhas na manutenção dos rodados dos veículos, que podem ser vistas a olho nu. As rodas de um veículo ferroviário têm um verdugo, uma saliência lateral que lhes permite serem guiadas pelo carril. Para evitar que esse verdugo se desgaste, as rodas devem ser torneadas periodicamente a fim de manter essa saliência entre a roda e o carril» («O elevador da Glória descarrilou e ninguém disse nada», Carlos Cipriano, Público, 17.05.2018, p. 25).

      Está no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora («rebordo existente no aro das rodas com a finalidade de as guiar sobre os carris»). Onde não está — mas é usado em alguns verbetes, erro já demasiado visto também no dicionário da Porto Editora — é no léxico das Infra-Estruturas de Portugal, que já aqui tenho citado. E sim, é o rebordo da roda que faz o guiamento do veículo ferroviário.

 

[Texto 9238]

Léxico: «lobismo»

Só ilogismo

 

      «As propostas não são todas negativas. Acho que há muitas que são úteis. Portugal tem que aprovar a legislação sobre o que é a atividade do lobismo, mas acho que um pacote de transparência que vem rodear os políticos de uma floresta de interdições, em que se recebermos um telefonema de alguém temos que o escrever num registo, alguém pede para falar com um deputado e temos que ir ao registo e pôr lá: “Empresa de fulano tal, associação tal, deseja ser recebida”... » (Sérgio Sousa Pinto, deputado do PS, entrevista Renascença/Público, 17.05.2018, 00h08).

      Bem me parecia que faltava nos dicionários. «Queria pesquisar abismo, alogismo, clubismo, cubismo, dorismo, fotismo, gotismo, holismo, ilogismo, iodismo, laxismo, lirismo, lismo, lobinho, lobista, lobito, loisão, ludismo, lusismo, modismo, monismo, snobismo, tomismo, tonismo, zolismo, zotismo?», pergunta-me, solícito, o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora.

 

[Texto 9237]

Léxico: «conector»

Não explica: confunde

 

      «“O que pretendemos privilegiar é a vontade de ler por parte dos alunos e não a orientação da leitura para certo tipo de textos”, frisa [Filomena Viegas, da Associação de Professores de Português]. No conjunto, adianta, as AE [aprendizagens essenciais] “não se ficam pelos pormenores, esquecendo uma abordagem mais global, como acontecia com as metas curricular [sic], e privilegiam o saber usar, mesmo que não se saiba ainda o conceito, como por exemplo pode acontecer com os conectores [expressões que ligam palavras]”» («Herança muçulmana e CEE quase desaparecem da História», Clara Viana, Público, 16.05.2018, p. 13).

   Então conectores são expressões que ligam palavras, Clara Viana? Confira no Dicionário Terminológico, e depois diga-nos alguma coisa.

 

[Texto 9236]

Léxico: «palomino»

É a cor

 

      «– Claro – disse eu, imaginando-me de súbito vestido com um daqueles conjuntos de calças e casaco de pele de veado que os cowboys usavam noutros tempos, esquadrinhando o horizonte em cima do meu cavalo palomino. – Claro que encontraremos o raio da gruta, nem que tenhamos de consagrar toda a nossa vida a tão ingrata missão...» (Palácio da Lua, Paul Auster. Tradução de José Vieira de Lima. Alfragide: Edições Asa II, 2012).

      Está nos livros, não está nos dicionários. E hoje foi usado por um aluno que fez um cavalo com rolhas de cortiça. Atenção, senhores lexicógrafos, que não se trata de uma raça, mas de uma cor de pelagem. Ah, pois não, graficamente. No Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora: ✘. No VOLP da Academia Brasileira de Letras: ✔.

 

[Texto 9235]

Léxico: «berlina»

Rejeita o melhor

 

      «Jane lobrigou uma berlina preta – a berlina preta? – mais duas vezes antes de saírem de Manhattan mas, quando chegou ao quarteirão de Dee, parecia-lhe que os riscos loucos que o taxista correra tinham compensado: há mais de quinze minutos que Jane não via pistas de ainda a estarem a seguir» (666 Park Avenue, Gabriella Pierce. Tradução de Susana Serrão. Alfragide: Edições Asa II, 2012, p. 226).

      O Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora não regista berlina, muito usado, e, contudo, acolhe a dupla sinónima sedan/sedã.

 

 

[Texto 9234]

Léxico: «estado-maior»

Para não induzir em erro

 

      «Uma candidatura “transversal”, sem apoio de nenhum estado-maior partidário, mas com a mobilização de muitos dos seus apoiantes de todas as horas» («Uma campanha feroz», Dia 15, 15.05.2018, p. 6).

      Não estará nada mal pensado que o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora acrescente mais duas ou três acepções ao vocábulo estado-maior. Como está, é manifestamente pobrezinho: «MILITAR corpo de oficiais auxiliares directos do comandante nos estudos da situação, planeamentos e tomadas de decisão».

 

[Texto 9233]