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Linguagista

«Ter que ver», de novo

Sonoridade e ritmo nas frases...

 

      «Para ele a resistência da sociedade portuguesa tem que ver com a religião, que influencia a visão das pessoas sobre estas questões, sobre a ideia da morte, que dividem a sociedade e são quase como um pró e contra» («De uma moção em 2009 a quatro projetos no Parlamento», Ana Mafalda Inácio, Diário de Notícias, 29.05.2018, p. 6).

      Quer dizer, uma jornalista tem o cuidado — e o conhecimento — para escrever assim, ao passo que um tradutor me mandou um recado: «No que diz respeito ao “ter que”, também foi uma insistência do tradutor manter o “ter a” nas duas ocorrências. Isto foi discutido e ele argumentou que preferia o “ter a” por uma questão de sonoridade e ritmo nas frases.» Se fico em paz com esta decisão? Tirei-lhe erros bem, mas bem piores — é com isto que fico em paz.

 

[Texto 9300]

Léxico: «porta santa»

Outra porta

 

      De manhã, falei aqui de porta de água, que os dicionários não definem. Por vezes, porém, o problema é bem outro: a definição está errada ou incompleta. Porta santa, por exemplo, o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora define-a assim: «porta de cada uma das quatro basílicas maiores de Roma que se abre só durante os anos santos». Que eu saiba, cada bispo, em todo o mundo, tem permissão de designar uma porta da sua diocese como porta santa.

 

[Texto 9299]

Léxico: «agitador de bebidas»

É isto mesmo

 

      «Nos casos em que existem alternativas facilmente disponíveis e acessíveis em termos de [sic] preço, os produtos de plástico descartáveis serão banidos do mercado. É o caso de cotonetes, talheres, pratos, palhinhas, agitadores de bebidas e paus para balões em plástico, que passarão a ser fabricados «exclusivamente a partir de [sic] matérias-primas mais sustentáveis» («Vários produtos com dias contados», João Moniz, Destak, 29.05.2018, p. 6).

      Para bom entendedor, basta um sic (ou dois, vá); para mau entendedor, nem um manual. Agitador de bebidas (swizzle stick, para a legião de anglófonos que nos segue). Agitado, não mexido. 

 

[Texto 9298] 

Tradução: «spelling mistakes»

OMD

 

      «Yvonne Mason, uma professora americana reformada, escreveu uma carta ao Presidente Trump, a propósito do massacre que matou [sic] 17 estudantes e professores de uma escola da Florida. A Casa Branca respondeu com uma carta assinada pelo próprio Trump, mas Yvonne Mason não gostou do que leu. [...] A professora de inglês publicou a carta corrigida no Facebook. Ali são visíveis notas como “Será que vocês tentaram usar a verificação de gramática e soletraçaõ?” [sic]. “A palavra federal só é capitalizada quando faz parte de um nome próprio” ou “OMD [iniciais de Ó Meu Deus], isto está errado”» («Professora reformada recebe carta de Trump e devolve-a com correções», edição em linha do Correio da Manhã, 28.05.2018).

      Porque vedes um argueiro no olho do vosso irmão, vós que não vedes uma trave no vosso? Desde quando é que spelling, neste contexto, se traduz por «soletração»?

 

[Texto 9297]

Léxico: «tábua de mortalidade»

Antes que seja tarde

 

      «Segundo os dados das tábuas de mortalidade divulgadas, esta terça-feira, pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), os homens tiveram 77,74 anos de esperança de vida à nascença, mais 1,6 meses, e as mulheres 83,78 anos, mais um mês em relação ao biénio anterior» («Esperança de vida aumenta para 80,78 anos», TSF, 29.05.2018, 12h10).

      E não seria melhor levar tábua de mortalidade (lifetable, para a legião de anglófonos que nos segue) para os dicionários? Acho que sim — ou ainda começam a usar o termo inglês.

 

[Texto 9296]

Ortografia: «Meda»

Não lhes fará mal

 

      «Também em Mêda e Moimenta da Beira (Beira Alta) foram registados estragos pelo mau tempo repentino de primavera» («Enxurrada de lama lança caos em Trás-os-Montes», Patrícia Moura Pinto, Correio da Manhã, 29.05.2018, p. 29).

      Mas que me*da é esta?! Então já em 1966 Rebelo Gonçalves, no Vocabulário da Língua Portuguesa, registou a ortografia Meda, e agora, em 2018, com o Acordo Ortográfico de 1990 pelo meio, que veio desacentuar muitos vocábulos, é com acento que a grafam? Vá lá, estudem e pensem um bocadinho mais. Para terminar: diz-se «na Meda».

 

[Texto 9295]

Léxico: «porta de água»

Esclareçam-nos

 

      «O ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, assina hoje o contrato de 1,07 milhões de euros para a reparação do Mouchão da Póvoa, em Vila Franca de Xira. A obra tem um prazo de 180 dias e inclui a reconstrução do dique e de uma porta de água que foram destruídos» («Mouchão vai ser reparado», Correio da Manhã, 29.05.2018, p. 29).

      Porta de água. Creio saber, mas não tenho a certeza. Quem nos pode valer, arquitectos, engenheiros ou lexicógrafos?

 

[Texto 9294]

Léxico: «sifonáptero»

Sifo... quê?

 

      Íamos no Mini Cooper S a fintar o trânsito nas escassas centenas de metros de IC 16 que temos de percorrer. No Sabichão, a rubrica da Antena 1 destinada aos mais novos, perguntavam o que eram insectos sifonápteros. Resposta: os sifonápteros são uma ordem de insectos sem asas, popularmente conhecidos como... pulgas. «Será que está no...? Aposto que não.»

      No Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora: ✘. No VOLP da Academia Brasileira de Letras: ✔.

 

[Texto 9293]

Como se fala e se escreve por aí

Parem e pensem

 

      «A Nova Zelândia vai abater cerca de 150 mil vacas para erradicar uma bactéria infecciosa [Mycoplasma bovis] que ameaça as explorações locais, anunciaram na segunda-feira políticos e líderes da agropecuária» («Mais de 150 mil vacas vão ser abatidas devido a bactéria infecciosa», TSF, 29.05.2018, 8h16).

      «Líderes da agropecuária»! Vem assim da Lusa, e na TSF é só colar. Tristeza. Por volta das 8h00, na Cidade, um radialista referia-se a Maomé como «o líder da religião islâmica». «A Cidade não dorme», garantem eles. E nas traduções não é precisamente o mesmo?

 

[Texto 9292]