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Linguagista

Léxico: «espeleossocorro»

Outra oportunidade

 

      «Não podendo aplicar a primeira estratégia, os operacionais que estão no local terão de passar à atuação conhecida por “espeleo socorro”. Para o procedimento, utiliza-se o escafandro, uma maca em que as garrafas são colocadas lateralmente e capacetes que asseguram a respiração. Os mergulhadores seguiriam laterais à maca, ajudando ao transporte através do estreito canal» («Como vai ser o resgate dos jovens tailandeses presos numa gruta? “Traumatizante”», Rádio Renascença, 3.07.2018, 15h59).

      Para os jornalistas, isto não tem mistério nem dificuldade: escreve-se de qualquer maneira e já está. Os leitores, inteligentes, percebem. Já defendi há uns anos que se deve grafar espeleossocorro. Agora só falta os lexicógrafos dedicarem uns minutos à questão.

 

[Texto 9548]

Léxico: «arsenalista», «aviso»

Fica o aviso

 

      Quando se procedia ao lançamento à água do aviso de 2.ª classe João de Lisboa, o navio começa a «deslizar carreira abaixo sem que ninguém lhe tivesse tocado, a estupefacção é geral, estremece o bigode branco do presidente, agitam-se os chapéus altos perplexos, e o barco lá vai, entra nas águas gloriosas, a marinhagem dá os vivas do estilo, voam as gaivotas como doidas, aturdidas pelos gritos das sereias dos outros barcos, e também pela colossal gargalhada que ecoa por toda a Ribeira de Lisboa, isto não tem mais que ver, foi partida dos arsenalistas, gente sobre todas maliciosa» (O Ano da Morte de Ricardo Reis, José Saramago. Lisboa: Editorial Caminho, 1984, 10.ª ed., p. 335).

      É difícil de acreditar, eu sei, mas no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora nem este aviso nem arsenalista. É grave, mas nada que não se possa resolver.

 

[Texto 9547]

Léxico: «bitaiteiro»

Então, se lançam bitaites

 

      «E lembro aos amadores bitaiteiros que mais do que as deles, as opiniões mais contundentes e eficazes são duas: castigando os jornais, não pagando; ou incentivando-os, pagando. E essas, sim, são portadoras de uma esperança» («Aos bitaiteiros sobre os jornais», Ferreira Fernandes, Diário de Notícias, 3.07.2018, 00h00).

      Se não o dicionarizarmos, os pobres falantes vão pensar que o não podem usar — porque não «existe», argumentam.

 

[Texto 9546]

Léxico: «acidocetósico»

Ficamos doentes

 

      «A extensa desidratação provocada pelo coma acidocetósico era perceptível na cova escura dos olhos e na pele gretada de mãos e pés» (Cidade Proibida, Eduardo Pitta. Lisboa: Quidnovi, 2007, p. 119).

      Acidocetósico. Nos dicionários, nada. Nem sequer no Dicionário de Termos Médicos da Porto Editora, quanto mais nos dicionários gerais.

 

[Texto 9544]

Plural dos apelidos, de novo

Afinal, singular ou plural?

 

      O autor até pode ter dúvidas ou não ligar nada à questão, mas no revisor é imperdoável. Tudo exemplos da obra Cidade Proibida, de Eduardo Pitta (Lisboa: Quidnovi, 2007): «Gozava por antecipação com as previsíveis reacções dos convidados dos Ravaras, sabendo que a Matilde e o Ernâni se esforçariam por amortecer eventuais choques» (pp. 34-35). «Renata e Ilídio Mousaco desembarcaram na Portela no dia em que uma horda de trabalhadores da construção civil cercou a Assembleia Constituinte. [...] Gostou dos Mousacos assim que os viu, tratando pessoalmente de os instalar num andar confortável da Haddock Lobo onde ficaram enquanto não puderam escolher outra morada» (p. 48). «Foi no dia do funeral do Alfredo que os Ravara se aproximaram» (p. 50). «Os Ravaras todos deste mundo, mais os Lemos Fortunato e os Moncada, e outros como eles, nunca pisavam o risco» (p. 61). «Acharia que o deslumbrava com a exibição da riqueza dos Ravara?» (p. 62) «Farta da superioridade moral dos Lemos Fortunato, dos maricas pretensiosos que frequentavam a casa de Nora (e que se via obrigada a aturar em certas datas), da empáfia dos doutorecos que enchiam três andares da empresa, do director financeiro que não lavava os dentes, das mulherzinhas obcecadas com ginástica para caberem em fatos MaxMara, e quanto mais MaxMara mais vulgares, da cambada que vivia para o Range Rover e as propinas do Valsassina» (pp. 115-16). «Era vê-los nas festas dos Lemos Fortunatos a filar os empregados do catering» (p. 116). «Cismou que queria ir ao Rio, ocorrera-lhe no hospital que não voltara lá depois de 1967, ano em que os Barrozo do Amaral lhe abriram as portas do céu» (p. 119). «Os Ravara também foram avisados» (p. 129).

 

[Texto 9543]

Léxico: «frelimista»

Vá, sem preconceitos

 

      «— Não devia ter vindo. Estou rodeada de frelimistas... Até a tia! Não se calam com a morte do Luther King. Aqui em LM são todos comunas» (Cidade Proibida, Eduardo Pitta. Lisboa: Quidnovi, 2007, p. 49).

      E se se dicionariza frelimista, também se há-de dicionarizar renamista. Ambos se encontram em muitos livros e na imprensa. Ou vamos deixar os falantes à nora, senhores lexicógrafos?

 

[Texto 9542]

Léxico: «vermelho-cardeal»

Primeiro encontro

 

      «Do alto da lareira de mármore negro, os ombros nus, ebúrneos, embrulhada em chantoung vermelho-cardeal, a Rosarinho iluminava tudo» (Cidade Proibida, Eduardo Pitta. Lisboa: Quidnovi, 2007, p. 30).

      Temos um sinónimo muito mais comum — cardinal —, mas está bem, e até devia dicionarizar-se, pois claro.

 

[Texto 9541]