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Linguagista

«Quasinho»

Para os grandes e para os outros

 

      «Leio, numa velhinha Ilustração Portugueza: a 17 de julho de 1916, uma data quasinho centenária, caiu um “grande nevão” em Portugal. E outra velhinha Ilustração Portugueza, ligeiramente mais nova, lembra-me que há mais exatos cem anos, a 6 de maio de 1918, caiu outra vez “um grande nevão na Covilhã”. E ontem os jornais assinalavam: “Serra da Estrela pintada de branco em pleno julho”...» («Trump, Putin, o czar e o frio na Covilhã», Ferreira Fernandes, Diário de Notícias, 17.07.2018, 7h00).

      Aqui, convenhamos, não fica nada bem, talvez porque a seguir vem um adjectivo na forma feminina, e a estranheza ainda é maior. Mas sim, pode escrever-se, ou, pelo menos, grandes escritores, como Guimarães Rosa, fizeram-no: quase, quasinho, quasezinho.

 

[Texto 9643]

Léxico: «escorpião-amarelo»

Uma questão de saúde pública

 

      «Há quatro espécies perigosas de escorpiões no Brasil, mas a principal preocupação é com o Tityus serrulatus, ou escorpião amarelo, que vive tradicionalmente em habitats de savana, mas conseguiu adaptar-se a viver em esgotos e entre lixo nas áreas urbanas» («Escorpiões adaptaram-se à vida urbana no Brasil e já matam mais do que as cobras», Visão, 16.07.2018, 12h53).

      Os nossos dicionários não registam escorpião-amarelo. Felizmente não os há em Portugal, porque para o soro antiescorpiónico precisávamos do adjectivo, que os nossos dicionários também desconhecem.

 

[Texto 9642]

«Sob/sobre», mais uma vez

Indocíveis, para sempre

 

      «A mulher [Maria Butina] trabalhava sobre as ordens de um alto responsável russo que já trabalhou para o banco central de Moscovo e foi, recentemente, alvo de sanções por parte do Tesouro norte-americano, mas cujo nome não foi revelado» («Russa fanática por armas acusada de espionagem nos EUA», Rádio Renascença, 17.07.2018, 00h58).

      Com que então Maria Butina trabalhava «sobre» as ordens de um alto responsável russo... Algum porco como Harvey Weinstein. Entretanto, em Portugal: um jornalista da RR mete os pés pelas mãos e os colegas, que por acaso leram e por acaso sabem a diferença entre as preposições, deixam-no escrever disparates deste quilate. Não é bonito.

 

[Texto 9641]

Léxico: «soberanismo/soberanista»

Q’rida, encolhi os dicionários

 

      «O ex-presidente independentista catalão Carles Puigdemont lançou, esta segunda-feira, o “movimento político” Crida (Chamamento) Nacional para a República, através da apresentação de um manifesto em que apela à unidade do soberanismo. [...] O texto também defende a criação de um “movimento soberanista de amplo espetro transversal” que “se cristaliza num instrumento político organizado” com todos aqueles que “partilham o objetivo de proclamar a República catalã exclusivamente por meios pacíficos e democráticos”» («Puigdemont apela à unidade dos soberanistas para fundar movimento político», TSF, 16.07.2018, 20h32).

      Soberanismo e soberanista. É vê-los em livros de História em língua portuguesa, e nos dicionários, nada. Crida, hum? Aqui, é mais q’rida, encolhi os dicionários.

 

[Texto 9640]

Léxico: «trocadilho»

Grandes trocadilhistas

 

      «A apresentação de Cristiano Ronaldo na Juventus domina as primeiras páginas dos desportivos diários, com dois deles a optarem pela língua italiana. O jornal A Bola escreve “Il Divo”, enquanto O Jogo compõe o italiano com um trocadilho: “La (3ª.) vita é bella”. Trocadilho também no Record, mas na língua de Camões. “ReJUVEnescido”» («Trocadilhos com Ronaldo», Rádio Renascença, 17.07.2018, 7h17, itálicos meus).

      Não estão mal de todo — mas não vejo nem sequer um verdadeiro trocadilho. Assim, não precisamos de um bom destrocadilhista. Talvez nos faça mais falta uma boa definição de «trocadilho» nos dicionários. Era isso que me apetecia, Ambrósio.

 

[Texto 9639]

Léxico: «(arte) xávega»

Só isso e assim?

 

      «Um homem com cerca de 80 anos morreu esta segunda-feira depois de uma embarcação de arte xávega se ter voltado na zona da praia do Meco, em Sesimbra, com duas pessoas a bordo» («Pescador morre na praia do Meco», Rádio Renascença, 6.07.2018, 21h11).

      Praia do Meco, Sesimbra, Estremadura... estão a ver? Agora o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora: xávega é a «rede usada na pesca de arrasto pelos pescadores da província portuguesa do Algarve». Vamos lá corrigir, actualizar e aumentar a definição. E onde está a locução arte xávega, pode saber-se?

 

[Texto 9638]

Léxico: «finlandização»

A História repete-se

 

      «Durante o confronto entre as duas superpotências, a palavra “finlandização” entrou no vocabulário das relações internacionais para designar o risco que alguns países europeus corriam com a ascensão dos partidos comunistas, empurrando-os para um estatuo [sic] “neutral” ou de “terceira via”» («A “neutralidade” finlandesa», Teresa de Sousa, Público, 16.07.2018, p. 10).

      Sim, finlandizar e finlandização — deviam figurar em todos os dicionários porque, afinal, a História se repete.

 

[Texto 9637]

Como se escreve nos jornais

Nem inglês nem português

 

      «A EDIA anunciou em 2016 que a área ocupada por papoilas já tinha “ultrapassado a barreira dos 1000 hectares”. E com a presença de “dois player’s no mercado, é previsível que a área continue a aumentar, contudo a um ritmo mais reduzido”, dizia na altura» («Todos desistiram da plantação de papoila branca no Alqueva», Carlos Dias, Público, 16.07.2018, p. 18).

      Como é que um jornalista não se envergonha de escrever assim? Que não releia o que escreveu, na verdade, não me surpreende muito, mas ninguém o faz no jornal? Ninguém vê? Ninguém sabe?

 

[Texto 9636]