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Linguagista

Léxico: «águia-imperial-ibérica»

Isso não é para nós

 

      «Só existem 500 casais no mundo e destes apenas 15 se encontravam em Portugal no ano passado, o que faz da águia-imperial-ibérica (Aquila adalberti) uma das espécies de águia mais ameaçadas do mundo. Contudo, durante este ano, e em plena época de reprodução, foi confirmada a presença de um casal em Serpa, alargando assim a área de presença da ave no país» («A águia-imperial-ibérica já faz ninho em Serpa», Cristiana Faria Moreira, Público, 9.08.2018, p. 12).

      Em Castelo Rodrigo, todos os dias via, ao fim da tarde, uma ave de rapina de grande porte pairar por cima da vila. Ouvi dizer que na serra da Marofa, ali tão perto, se vêem com frequência águias-reais e grifos. E nunca vi, em tão pouco tempo, tantas e tão variadas borboletas como ali. Se Sir David Attenborough ali estivesse, nem ia dormir, coitado, empolgado na contagem, a Big Butterfly Count. Cá não contamos nada. Nem as palavras, desmazelados, pomos nos dicionários.

 

[Texto 9744]

Léxico: «lâmina»

Talvez angolano

 

      Como iam registar forçureiro, usado por dois ou três escritores, se não registam outras? Não. Mais perto no tempo, mais longe no espaço: «Os medicamentos de origem indiana são mais acessíveis – a diferença de preços chega a 10 vezes mais. Quando os medicamentos são caros, os farmacêuticos vendem-nos à lâmina. A mesma caixa que se vende por 5.500 kuanzas vende-se à lâmina por 1750 Kuanzas – quase seis euros» («Medicamentos portugueses vendidos em Angola ao triplo do preço», André Mussamo, [jornal O País], Diário de Notícias, 9.08.2018, 12h25). Nunca antes vira, ou não me lembro, este sentido de lâmina. Talvez seja acepção angolana. Com sorte, alguém sabe e nos vai, caridosamente, dizer.

 

[Texto 9743]

Léxico: «pálio»

Em poucas palavras

 

      «A aldeia mais a norte do concelho de Pinhel, a porta sul do Parque Arqueológico do Vale do Côa, com painéis alusivos às pinturas rupestres, recebe muitos turistas, todos com a mesma pergunta: “Posso ver o pálio?” A resposta é quase sempre negativa. Porque a peça, valiosa, só saía em dias festivos, na Páscoa e no Corpo de Deus. “É uma peça que se encontra em condições de preservação muito boas. Era o manto onde ia por baixo o Senhor Padre com a Sagrada Custódia”, conta o secretário da Junta de Freguesia de Vale do Côa, Rui Marques, que relembra que Cidadelhe “já foi cidade, até com tribunal”. [...] Em veludo carmesim, vermelho, bordado a ouro, o pálio de 1707 passou de mão em mão, de casa, em casa, num ritual que lhe trouxe fama. “Eu vou tentar saber onde está o pálio, nos dias festivos. De seguida, vou entregá-lo a outra pessoa e essa pessoa entrega a outra pessoa. E assim se guardou durante anos, nunca se perdeu”, explica Rui Marques» («“Posso ver o pálio de Cidadelhe”? A pergunta vai passar a ter resposta afirmativa», Liliana Carona, Rádio Renascença, 9.08.2018, 12h00).

      Um pálio com mais de trezentos anos, e eu que ontem estava a menos de 10 quilómetros de Cidadelhe... Mas o que é exactamente um pálio? O secretário da Junta de Freguesia de Vale do Côa já respondeu, mas vejamos os dicionários. Para o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, pálio, neste sentido, é a «cobertura portátil, formada por um dossel de seda, sustentado por varas, transportado à mão nos cortejos e procissões solenes, e que serve para proteger a pessoa ou imagem que se pretende honrar». Seda, diz o lexicógrafo. Veludo, garante o secretário da junta. A Enciclopédia Católica Popular diz-nos que é o «baldaquino em forma de dossel móvel sustentado por quatro ou seis varas, usado nas procissões com o SS. Sacramento e em poucos mais casos».

 

[Texto 9742]

Léxico: «árvore-do-estoraque»

Liquidi... liquidifi...

 

      Nunca estive, não calhou, em Serralves, mas sei que há lá um liquidâmbar, nome que me ocorreu agora quando ouvi perto de mim alguém hesitar (?) ao proferir a palavra «liquidificadora». Liquidâmbar, diz o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, é a «árvore, da família das Hamamelidáceas, de que se extraem resinas balsâmicas», do mesmo nome. E o nome científico? Liquidambar styraciflua L. E outro comum? Árvore-do-estoraque. Vamos melhorar os dicionários?

 

[Texto 9741]

Léxico: «dismorfia»

Há muito melhor

 

      «Os cirurgiões plásticos estão a receber cada vez mais casos de pacientes que chegam com selfies suas editadas com filtros das redes sociais Snapchat ou Instagram e pedem para ficar como nas fotos. O transtorno já foi apelidado de “dismorfia do Snapchat” por investigadores do Boston Medical Center, num artigo publicado no início do mês na revista “JAMA Facial Plastic Surgery”» («“Dismorfia do Snapchat”. O novo transtorno de quem quer ficar igual às selfies com filtros», Rádio Renascença, 9.08.2018, 10h51).

      As definições do Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora não são as mais escorreitas: «1. má configuração; 2. forma viciosa de um aparelho ou órgão».

 

[Texto 9740]

 

Léxico: «malcozinhado»

A propósito do Hajj

 

      A Direcção-Geral da Saúde emitiu um comunicado sobre o Hajj, a peregrinação islâmica anual a Meca, na Arábia Saudita, que decorre este ano entre 19 e 24 de Agosto. Muito modernos, muito cosmopolitas, sim senhor... Entre as várias recomendações, lê-se esta: «Evite o consumo de produtos alimentares crus ou malcozinhados e beba água engarrafada». Isto está certo, «malcozinhado»? Para o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, malcozinhado é, como adjectivo, «feito à pressa; mal-arranjado»; como substantivo, é a «taberna onde se vendem refeições mal preparadas». (Falta, porém, o verbo, malcozinhar.) Aqui em Lisboa, por exemplo, era o nome que se dava ao conjunto de tendas e barracas de peixe frito, de melancias e de vinho do termo. Já Bluteau a acolhe, definindo-a como o local onde se vendia caldo e carne cozida. Alguns dicionários registam explicitamente que malcozinhado se diz da comida mal preparada, mal confeccionada. Para terminar, há algum motivo razoável para Hajj estar apenas registado no Dicionário de Alemão-Português da Porto Editora?

 

[Texto 9739]

Léxico: «broncoconstrição»

Repete-se o erro

 

      «“Existem lesões de inalação devidas ao calor que provocam obstrução e risco de infeção. Além da lesão pelo calor, há possibilidade de lesão pelas substâncias químicas do fumo que provocam inflamação e edema com tosse, broncoconstrição e aumento das secreções”, alerta a DGS num comunicado divulgado a propósito do fumo que alastra na região do Algarve devido ao incêndio na serra de Monchique» («DGS alerta para perigos de inalação de fumo e emite recomendações», TSF, 8.08.2018, 20h50).

      Broncoconstrição. Ausente do Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, presente num dicionário bilingue...

 

[Texto 9738]

Léxico: «halogéneo»

Alô, génio

 

      A 1 de Setembro de 2018, entra em vigor a proibição de produzir e comercializar lâmpadas de halogéneo não direccionais, incluindo as lâmpadas convencionais em forma de pêra ou vela. É a oportunidade para lembrar que a definição de halogéneo no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora merece ser aumentada. E parece-me que também seria louvável se eliminassem a entrada halogénio. (Não me perguntem porque é que «alô» é brasileirismo para o dicionário da Porto Editora.)

 

[Texto 9737]