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Linguagista

Léxico: «peneplano»

Ainda bem, é menos um erro

 

      «A planície nua, completamente desgastada, deixava ver por toda a parte o granito primitivo; mas aqui, no peneplano em meio desgaste, o terreno mostra-se xistoso» (Guia de Portugal II: Estremadura, Alentejo, Algarve, Raul Proença. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 3.ª ed., 2011, p. 94).

      Viu bem Montexto: o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora não regista penepleno nem peneplano. Quanto a «penepleno», parece-me uma boa notícia: a meu ver, é erro. No que respeita a peneplano, o erro é duplo, pois não apenas aquele dicionário o não acolhe, como o encontramos num dicionário bilingue.

 

[Texto 9781]

Os Uritrottoirs

A cegueira do plural

 

      «Um novo conjunto de urinóis ecológicos colocados nas ruas de Paris está a provocar o alvoroço dos habitantes da capital francesa. [...] Os “Uritrottoir”, assim designados, começaram a ser colocados em Paris no início de 2017. O design é simples: trata-se de uma caixa, com uma abertura discreta e coberta por palha no interior, o que permite reduzir o cheiro. O topo do dispositivo é preenchido por flores» («Indignação em Paris. Teme-se que urinóis públicos “incentivem o exibicionismo”», Rádio Renascença, 13.08.2018, 15h20).

      Quem disse que só em Portugal é que há ideias destrambelhadas? Agora, é ver velhos depravados a masturbarem-se mesmo ali ao lado de bancos de jardim. Realmente... Cá temos outras pancadas, como a cegueira do plural. Leio, por exemplo, no HuffPost: «Les “Uritrottoirs” installés à Paris ne font pas l’unanimité». Que interessa que se trate de um nome comercial? Eu também não digo «dois Fiat», mas sim «dois Fiats».

 

[Texto 9780]

Léxico: «debuxador»

Foge ao normal, e já não sabem

 

      «[Eduardo Rêgo] Cresceu no seio de uma família modesta. A mãe em casa, o pai com ofício de debuchador — trabalhava os desenhos que iam aos teares da indústria textil. “Quando acabei a quarta classe, aos 10 anos, fui trabalhar para a fiação de uma fábrica.” Quatro anos naquilo, mas uma sede de mundo que o frustrava» («“Esses fanáticos dos direitos dos animais não sabem nada de natureza”», Ricardo J. Rodrigues, Diário de Notícias, 13.08.2018, 6h29).

      Foge um pouco ao normal e, pronto, os jornalistas perdem logo o pé. Ricardo J. Rodrigues, é debuxador que se escreve, de debuxo, que significa «desenho».

 

[Texto 9779]

Léxico: «geóglifo»

Não está mal, mas pode melhorar

 

      «Novos geóglifos descobertos no estado brasileiro do Acre reforçam a ideia de que havia uma numerosa população milenar e hierarquizada na Amazónia 2500 anos antes da chegada dos europeus, dados estes que podem “reescrever” a história da região. [...] Os geóglifos são figuras construídas em encostas ou planícies, utilizando a técnica de adição de terra ou pedras, com tonalidades escuras de origem vulcânica de forma a criar um mosaico» («Novas descobertas arqueológicas podem reescrever história da Amazónia», TSF, 13.08.2018, 10h19).

      Ficamos com uma ideia aproximada do que é um geóglifo? Creio que sim, mas comparemos com a definição do Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora: «figura de grandes dimensões, feita geralmente com rochas de cor diferente ou com corte de vegetação, cuja percepção só é possível a partir do ar ou de um plano elevado». Acrescenta um dado valioso (pena o «a partir do ar»). Nos English Oxford Living Dictionaries, temos: «A large-scale image or design produced in the natural landscape by techniques such as aligning rocks or gravel or removing soil or sod, the complete form of which is visible only aerially or at a distance.»

 

[Texto 9778] 

Os Fanhas e o número fatídico

José Fanha também sabe

 

      «A família do meu pai é uma família camponesa do Entroncamento, os Fanhas são todos da Meia Via. A família da minha mãe era de origem burguesa do final do século XIX, mas eram todos militares, ligados aos caminhos-de-ferro» («“Achava que o Salazar era lindo. Até que um professor nos mostrou um frasco com orelhas cortadas”», Paula Freitas Ferreira, Diário de Notícias, 13.08.2018, 6h24).

      Sim, José Fanha também sabe — ao contrário de muitos e muitos editores, assistentes editoriais, tradutores, autores, revisores — que os apelidos têm plural. (Só é pena pronunciar «treuze», mas pode ser que ainda lhe passe, com 67 anos está bem a tempo.)

 

[Texto 9777]

As agruras de um revisor

Crime e castigo

 

      Sem a intermediação de um editor, ainda é mais penoso e perigoso: «Já corrigi o que me pareceu estar errado na sua revisão. Aguardo envio do manuscrito final. Corrigi a vermelho, e em alguns frases manti como no original.» Nestes casos, que cabeça devia bater na parede, a do autor ou a do revisor? E quantas vezes?

 

[Texto 9776]

Léxico: «trombectomia»

O erro está nessa opção

 

      «O episódio teve lugar no dia 6 de agosto de manhã e a doente acabou por não poder realizar uma trombectomia (remoção de coágulo), procedimento recomendado e que, quando efetuado em tempo útil, pode reverter os danos» («Falha na assistência a doente com AVC», Sónia Trigueirão, Correio da Manhã, 11.08.2018, p. 20).

      Isto de o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora não registar boa parte de termos da medicina — mas usados no dia-a-dia na imprensa, como se vê — é um grande erro. Vamos lá ver: para quem tem somente o dicionário em papel, fica sem saber o que significam os vocábulos. No dicionário em linha, também não é prático mudar de dicionário. Regista-o o Dicionário de Termos Médicos: «Extirpação cirúrgica de um trombo vascular.» Estará correcto? Eu optaria pela palavra «remoção», pois não estamos perante um órgão nem uma formação patológica como um quisto ou um tumor.

  

[Texto 9775]

Léxico: «triplo-saltista»

A ortografia como ela não é

 

      «“O objetivo é chegar a Tóquio na melhor forma possível e lutar pelo ouro”, disse depois do sucesso em Berlim o triplosaltista português. Se há desafios, foram feitos para Nelson Évora, um especialista em superação pessoal» («Nelson Évora, primeiro o Mundo e depois a Europa», António Pedro Pereira, Diário de Notícias, 12.08.2018, 20h25).

      Acha que sim, António Pedro Pereira? Se for alguma coisa — nunca vi escrito, só tenho ouvido na rádio, e poucas vezes —, é triplo-saltista. Já temos, é certo, triplista, mas quem pode negar que triplo-saltista é muito mais claro?

 

[Texto 9774]