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Linguagista

Todo o boxe esquecido

Murros e erros

 

      «O ex-campeão francês de boxe Christophe Dettinger golpeou um polícia repetidamente durante vários metros e obrigou mais um par de agentes a recuar, junto ao rio Sena, em Paris, durante as manifestações dos coletes amarelos de sábado. [...] O suspeito mostra certa segurança e os golpes são precisos. Num outro vídeo, o ex-campeão francês de boxe pontapeia outro polícia no chão. Apesar de haver um mandato de captura, o homem de 37 anos ainda não foi preso» («Ex-campeão de boxe fez recuar polícias de Paris só com os punhos», Rádio Renascença, 6.01.2019, 21h38).

      Empolgado com a cena de pugilato, o jornalista lá se enganou: é mandado, não mandato. (Que polícia fracalhote! Como sempre, fracos com os fortes, fortes com os fracos.) E tu, Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, tens alguma coisa contra os termos do boxe, como meio-pesado, peso-galo, peso-leve, peso-médio, peso-médio-leve, peso-meio-pesado, peso-mosca, peso-pesado, peso-pluma ou peso-morto, da halterofilia? Vá, enriquece-te, ceva-te na minha abundância. (Sobrou-me este verso de um poema que escrevi ontem, uso-o aqui.)

 

[Texto 10 552]

Léxico: «Arqueotas/Euriarqueotas»

É o que temos

 

      É o que eu digo, querem ciência sem palavras. Então se há biólogos que falam em Arqueotas em vez de Archaea, e em Euriarqueotas em vez de Euryarchaeota, porque não registam os dicionários estes termos? É claro que depois não nos podemos queixar de que venham outros, biólogos ou não, que não usem os termos portugueses. Falta de brio e de orgulho, é o que é.

 

[Texto 10 551]

Léxico: «erva-patinha»

Não são sinónimos

 

      «Dois homens desapareceram este sábado na costa Este da ilha do Faial, nos Açores, depois de terem saído de casa, pela manhã, para a apanha da erva patinha, revelou o capitão do Porto da Horta. Segundo Rafael da Silva, os dois homens, tio e sobrinho, com 34 e 18 anos de idade, deslocaram-se de manhã para a orla costeira da freguesia da Ribeirinha, para a apanha da erva (uma espécie de alga utilizada na alimentação), mas os familiares só alertaram as autoridades, dando conta do seu desaparecimento, ao final da tarde» («Açores. Foram apanhar erva patinha e desapareceram», Rádio Renascença, 5.01.2019, 21h19).

      Encontramo-la no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora. Analisemos o verbete: «BOTÂNICA alga marinha pertencente ao grupo das algas verdes, laminar, translúcida e muito nutritiva, que ocorre em todo o arquipélago açoriano, sendo utilizada em culinária pelo sabor intenso e textura suave; erva-do-calhau, erva-patinha-verde». Se referissem o nome científico, seria mais útil. A erva-patinha e a erva-patinha-verde é a mesma alga? Pelo que vejo, a primeira tem o nome científico de Porphyra spp.; a segunda é a Ulva intestinalis. Se não se trata de sinonímia, que significa aquilo? Sinónimo de erva-patinha é apenas erva-do-calhau. Os nomes científicos que indiquei ali atrás estão, por exemplo, no regulamento que estabelece o regime jurídico da apanha de espécies marinhas no mar dos Açores, diploma legal em que também se pode ler que bicheiro, puxeiro ou pexeiro é o «utensílio constituído por um gancho sem barbela, fixado a um cabo, e que é usado na apanha de polvos», ou que facão, faqueiro ou lapeira é o «utensílio constituído por uma lâmina de forma variável, fixada normalmente a um cabo curto e que é usado na apanha de lapas».

 

[Texto 10 550]

Léxico: «sidra»

Desta vez, sem erro

 

      Ao almoço, bebi uma Bandida do Pomar, a sidra da Central de Cervejas. Felizmente, não trabalham lá nem jornalistas nem tradutores, ou ainda veríamos no rótulo «cidra» em vez de «sidra». Dizem da Central de Cervejas que o tipo de maçãs utilizadas na produção de sidra não existe no território nacional. Essa é boa... Por causa do clima. A imagem da raposinha também está muito bem conseguida, com as patas na posição do cavalo da estátua de D. José I, mas sem serpentes no caminho. Neste caso, e é essa a diferença, a pata direita é mesmo a direita, e não a esquerda.

 

 [Texto 10 549]

Tradução: «chariot élévateur»

Nunca corrigem

 

      «O dia de protestos em Paris fica marcado — além das mais de 100 detenções e dezenas de incêndios em Paris — pela necessidade de evacuar o porta-voz do Governo francês, Benjamin Griveaux, depois de vários coletes amarelos terem invadido o ministério dos Assuntos Parlamentares com recurso a uma retroescavadora» («Porta arrombada e um carro destruído. Assessora portuguesa descreve invasão de ministério em Paris», Gonçalo Teles e Dora Pires, TSF, 5.01.2019, 23h12).

    Aos pares é sempre pior. Aqui no sossego da minha casa, em segundos, vi que não foi usada uma retroescavadora. A imprensa francesa fala num chariot élévateur (nada que o Dicionário de Francês-Português da Porto Editora saiba o que é), e imagens divulgadas pela BFMTV mostram — uma empilhadora. Muito cuidadosos, os nossos jornalistas... Ficamos sem saber se o erro foi de tradução ou se procedeu de não verificarem em mais de uma fonte do que se tratava. Em qualquer caso, lamentável. E nunca corrigem!

 

[Texto 10 548]

Léxico: «panelo»

É mais do que isso

 

      «O presidente da Câmara Municipal da Ribeira Brava, Ricardo Nascimento, vai ser uma das caras presentes na Festa do Panelo, organizada pela comunidade madeirense em Londres, e que se realizará a 19 de janeiro. [...] A par da comida tradicional madeirense, também a poncha assumirá um papel de destaque» («Panelo terá festa em Londres», Jornal da Madeira, 6.01.2019, p. 11).

     Reconhecido em Londres, desconhecido em Portugal. É assim. Para o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, panelo não passa de uma «pequena panela de barro». Engano: também designa um prato confeccionado de legumes e enchidos, muito semelhante ao cozido à portuguesa. Isto, a meu ver, ainda tem menos desculpa do que a miséria da definição de hidromel e a sua confusão com água-mel.

 

[Texto 10 547]