Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Linguagista

Léxico: «rusticismo»

Para acabar o dia

 

      O enviado do anjo entrou por uma porta antiga da cidade, uma porta bárbara, até feria a vista com o seu rusticismo de mau gosto. Felizmente não era em Portugal, e não temos de nos envergonhar. Coramos um tudo-nada apenas por não encontrar rusticismo no dicionário da Porto Editora e o vermos — grrrrr! — no VOLP da Academia Brasileira de Letras. Eh pá, têm de turbinar o cérebro com, sei lá, OptiMind. Para começar, têm de registar turbinar.

 

[Texto 10 643]

Léxico: «dárico/darico»

É este o panorama

 

      «Tratava-se de um direito que equivalia mais ou menos à trigésima parte de um dárico.» É uma frase de uma obra de que, por enquanto, não posso falar. (Se descobrirem, parabéns.) O dárico/darico é uma moeda que, com o siglos, representava o padrão monetário bimetálico do Império Persa aqueménida. Não está no dicionário da Porto Editora; mas encontramos ambas as variantes no VOLP da Academia Brasileira de Letras. Rebelo Gonçalves só regista «darico»; José Pedro Machado apenas acolhe «dárico»; Sacconi falhou várias tomas (toma!) de Memofante Forte e também se esqueceu de dicionarizar as duas. Quanto a siglos, não conheço nem sequer um dicionário que a registe.

 

[Texto 10 642]

Léxico: «chibaria»

Na literatura já está

 

      «A chibaria nunca viu nascer ninguém», canta Conan Osíris na canção Telemóveis, que vai (vai?) levar ao Festival da Canção. A sonoridade é boa, a letra, enfim... Ora, mas eu vejo chibaria, e há muito, na literatura. Citaria aqui António Lobo Antunes — ALA! —, mas nunca sei onde começam e onde acabam as suas frases, e acabo sempre por desistir. Quem usará palavras como estas? Toda a gente e, se forem escritores, polícias e psiquiatras. Assim, cito Moita Flores: «— Se a matamos, a Polícia põe a chibaria toda atrás do caso» (Segredos de Amor e Sangue, Francisco Moita Flores. Alfragide: Casa das Letras, 2014). Não a encontrar nos dicionários é que está mal, evidentemente.

 

[Texto 10 641]

Léxico: «descomplicado»

Túnel do tempo

 

      O recenseador da obra Diante de Ti, os Meus Caminhos, de Tomáš Halík, diz-nos que o autor tem a capacidade de «passar ao leitor as suas inquietações, a propósito de temáticas por vezes complexas, mas sempre num registo directo e descomplicado, com que o leitor se consiga identificar». Qual é a dúvida de que descomplicado não é meramente particípio, mas também adjectivo? O VOLP da Academia Brasileira de Letras não tem essas dúvidas. Mais: até arranjaram — e eles bem precisam, sinceramente — um descomplicador. Agora com os Bolsonaros à perna, precisam de mais do que de um descomplicador: precisavam de um túnel do tempo que os fizesse desembocar incólumes no ano 2030.

 

[Texto 10 640]

«Superlua», de novo

Não liguem

 

      «Um fenómeno astronómico passou do Espaço para as redes sociais quando um meteorito caiu na face visível da lua, durante o eclipse da madrugada desta segunda-feira, a “Super Lua Vermelha”. Não é, certamente, a primeira vez que um meteorito colide com o planeta satélite da Terra, mas é a primeira vez que o episódio é filmado» («Do Espaço para as redes sociais. Colisão de meteorito com a Lua filmada pela primeira vez», Sara Beatriz Monteiro, TSF, 23.01.2019, 8h43).

      Daqui a quantas luas os jornalistas saberão que os elementos de formação de palavras não podem ficar assim soltos à maluca? Quando, Sara Beatriz Monteiro? Há quem defenda que se deve escrever «super-Lua», porque Lua é um nome próprio (do que esta jornalista também se esqueceu ou não sabe), e, dado que não se pode escrever «superLua», o correcto é «super-Lua». Bem, estamos de acordo num ponto: não se pode escrever «superLua». Do que se esquece quem aduz esse argumento — do que se esquece Dad Squarisi, do Correio Braziliense — é que a designação em causa é de um fenómeno, como as próprias fases da Lua, o que se escreve com minúscula, e não o nome do satélite da Terra. Q.E.D.

 

[Texto 10 639]

Léxico: «privataria»

Eles sabem lá

 

      «A privataria que engorda» (Jornal da Madeira, 23.01.2019, p. 7). Antetítulo: «Roberto Almada fez um trocadilho entre a privatização e a pirataria». Só faltou dizerem que foi o deputado regional bloquista que inventou o neologismo. Enfim, vão dizendo outras barbaridades, e, se lhes chamamos a atenção, malcriadamente nem respondem. Mentalidade insular.

 

[Texto 10 638]