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Linguagista

Léxico: «colegialidade»

Parece-me imprescindível

 

      «“Lidar com a crise dos abusos sexuais na Igreja é um desafio complexo e multifacetado, talvez sem precedentes na história da Igreja, devido à comunicação global dos nossos tempos. Isto faz com que na nossa situação atual a colegialidade seja ainda mais decisiva”, disse o cardeal [Oswald Gracias, da Índia]» («Cardeal indiano pede “humildade de aprender com os nossos erros”», Filipe d’Avillez e Aura Miguel, Rádio Renascença, 22.02.2019, 11h10).

      Não será por acaso que muitos dicionários, da nossa língua e de outras, no verbete colegialidade referem explicitamente a Igreja Católica. Sirva de exemplo o da língua catalã: «CATOL Doctrina teològica segons la qual els bisbes, successors dels apòstols per via de consagració sacramental, són ordenats (per institució divina i col·legialment presos) al servei de tota l’Església, sobre la qual, conjuntament amb el papa, tenen potestat plena i suprema.» O dicionário da Porto Editora não faz o mesmo.

 

[Texto 10 860]

Léxico: «turmérico»

Conhecido, mas por outros nomes

 

      Ora, que temos nós aqui? Um sumo com turmérico e pimenta-de-caiena da Sonatural. Hum... A indústria não pode esperar pelos lexicógrafos e dicionaristas, não é assim, Porto Editora? O turmérico é um dos nomes por que também é conhecido o açafrão-da-índia ou cúrcuma (Curcuma longa).

 

[Texto 10 859]

Léxico: «subcompacto»

Vai ser a nova moda

 

      «Toyota revelou um novo SUV subcompacto no Salão de Los Angeles, o FT-AC, ou “Future Toyota Adventure Concept”. É um veículo pensado para o estilo de vida dos californianos que gostam de aproveitar férias e feriados para praticarem atividades ao ar livre O FT-AC é ideal para quem queira deixar o asfalto para trás à procura de aventura» («O SUV mais radical da Toyota», Diário de Notícias, 2.12.2017, 12h33).

      Já anda por aí há algum tempo, como se pode ver, e ainda ontem ouvi a palavra. Está no Aulete: «Automóvel com carroceria de pequenas dimensões».

 

[Texto 10 858]

Léxico: «óscar»

Ligadas

 

      «Dito isto, quanto custa um óscar? 800 euros. Agora imagine, a título de exemplo, que Roma ganha o óscar de melhor filme. O valor da estatueta dourada equivale 0,006% do montante total gasto na produção da película» («Um óscar mede 35 centímetros e pesa quatro quilos», André Rodrigues, Rádio Renascença, 22.02.2019, itálico meu).

      Se eu acrescentaria esta informação (depois de verificada...) à definição de óscar? Talvez. Sim. Onde o dicionário da Porto Editora o define como a «estatueta dourada que representa esse prémio», eu poria «estatueta dourada de metal, com cerca de 35 cm e 4 kg de peso, que representa esse prémio». O que de certeza faria era corrigir esta definição: «CINEMA [também com maiúscula] prémio atribuído anualmente, pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, a pessoas vinculadas à indústria do cinema». Vinculadas parece-me demasiado forte. Ligadas.

 

[Texto 10 857]

Léxico: «abelha-gigante-de-wallace»

Paixão ao primeiro bater de asas

 

      «A maior abelha do mundo, desaparecida há décadas e que se admitia “perdida para a ciência”, foi redescoberta numa ilha remota da Indonésia, anunciaram os investigadores que a descobriram. [...] Bolt encontrou numa floresta tropical das ilhas Molucas, Indonésia, uma colmeia de abelhas de Wallace (Megachile pluto), afirmando agora que “foi incrível” ver o quão “grande e bonita” é a espécie e ouvir o som das suas “asas gigantes”» («Maior abelha do mundo redescoberta na Indonésia», Rádio Renascença, 22.02.2019, 00h13).

      O naturalista Clay Bolt ficou apaixonado pela abelha-gigante-de-wallace (Megachile pluto), como Lagerfeld estava apaixonado pela sua gata Choupette.

 

[Texto 10 856]

Léxico: «fidelização»

Olha o marciano

 

      «A Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) quer mudar as regras das fidelizações nos contratos com as operadores de telecomunicações. O regulador pretende, assim, que baixem os custos para os clientes» («Telecomunicações. Pôr fim a um contrato de fidelização pode ficar mais barato», Rádio Renascença, 22.02.2019, 8h00).

      O dicionário da Porto Editora (veja o leitor ocioso noutros) define assim fidelização: «(marketing) estratégia cujo objectivo é tornar os consumidores clientes habituais de determinada marca, produto ou serviço». Eu diria que não estamos a falar do mesmo. Um marciano não ia pescar nada.

 

[Texto 10 855]

Léxico: «oxodegradável»

Que se fragmenta

 

      «Portugal vai antecipar-se e proibir já no ano [sic] os utensílios de plástico de uso único, como é o caso de pratos, talheres, cotonetes e palhinhas. Bem como os sacos de plástico oxodegradáveis, que apesar do nome, se fragmentam em micropartículas após dois a cinco anos, contaminando o ambiente» («Governo antecipa fim dos plásticos descartáveis já a partir de 2020», Rádio Renascença, 22.02.2019, 7h15).

    Entretanto, nos nossos dicionários, oxodegradável ainda não encontrou acolhimento. A realidade anda sempre muito mais depressa. E, contudo, há nove anos já que eu chamei a atenção para a palavra no Assim Mesmo.

 

[Texto 10 854]

Léxico: «popelina/popeline»

Tirem conclusões

 

      A palavra do dia da Infopédia é popelina. Muito bem — mas podia dizer muito mais. Para já, salta logo à vista que o dicionário da Porto Editora não regista a forma — tão ou mais usada — popeline. Claro que não uso nem recomendo estas formas que são cópia do original, mas não acolhem, por exemplo, avalanche/avalancha, entre muitas outras? Ora aí está. Diz-se então que popelina é o «tecido de algodão, lustroso, fino e macio, geralmente usado para roupa interior, blusas e camisas». Quanto à etimologia, apenas isto: «Do francês popeline, “idem”». Comparemo-lo agora com a definição da mesma palavra no Treccani: «popelinepoplìn› s. f., fr. [dall’ingl. poplin, che a sua volta è da una prec. forma fr. papeline, che si ritiene derivata dal nome della città fiamminga di Poperinge (fr. Poperinghe ‹poprẽ′ġ›), celebre nel medioevo per le stoffe]. – Tessuto leggero, di lana, seta o cotone, caratterizzato dall’avere l’ordito molto più fitto della trama (il che gli conferisce la caratteristica rigatura); viene utilizzato per confezionare camicie e, in grana più grossa, per abiti e impermeabili.»

 

[Texto 10 853]

 

Léxico: «monoculado»

Só na literatura

 

      «Ao fim de seis horas, contra toda a legalidade e legitimidade, o chefe do governo mandou chamar o Spínola e entregou-lhe o poder, julgando ainda que a rebelião era comandada pelo famoso e monoculado eguariço» (De Salazar a Costa Gomes, Manuel Maria Múrias. Lisboa: Nova Arrancada, 1998, p. 287).

      Aqui, claro, é alusão ao monóculo (sem graduação, mero vidro, ao que se diz) que Spínola usava no olho direito, e por isso a sua alcunha era Caco. Contudo, num livro que estou a ler, pretende-se que monoculado signifique «só com um olho». No sentido daquele excerto acima, ou seja, que usa monóculo, já o encontramos nas obras de Aquilino Ribeiro — mas em nenhum dicionário.

 

[Texto 10 852]

Léxico: «circuncidado»

Não e não

 

      «Quis ser circuncisado em honra de Maomé» — mas quem o diz é francês e ignorante, duas boas razões para não saber. Muito mais grave é o Dicionário de Termos Médicos da Porto Editora acolher o verbete «incircuncisado», no qual se pode ler que diz respeito ao «(indivíduo) que não foi circuncisado». Não, não, não, não e não: é circuncidar, circuncidado, circunciso, incircuncidado, incircunciso.

 

[Texto 10 851]

Léxico: «telelé»

Seriam menos dois erros

 

      «E acrescentou, sempre em pensamento: “A esta hora, a mulher deve estar diante do televisor, a ver a novela; o filho no quarto, entretido com o computador; a filha às voltas com o telelé, a fofocar com as amigas — o quadro perfeito no tranquilo serão de sempre, à espera do honrado chefe da família, retido no seu gabinete de empresário de respeito e sucesso por culpa de algum dossiê mais complicado”» (Crónicas de Bons Costumes, Guilherme de Melo. Lisboa: Editorial Notícias, 2004, p. 50).

      Diz o dicionário da Porto Editora: «forma reduzida de telemóvel». E eu: não é. Bem, mas regista erros muito maiores, como darem como italiana a locução adverbial ad nutum. Eh pá, se não sabem o que lhe fazer, ponham-na no dicionário da língua portuguesa como expressão latina, evidentemente, e, repito, com o seu significado usual, não meramente literal, ou não servirá de nada.

 

[Texto 10 850]